Na miríade de línguas nativas, a que se soma a herança do indonésio, o português podia ser um meio de acesso à cultura universal — mas não é. Numa excelente reportagem sobre a falência do sonho timorense ("Timor-Leste, a ilha insustentável", Público, 25/11/08) Pedro Rosa Mendes refere-se a vários aspectos da estagnação social e económica deste recente país, entre eles, a questão linguística.
Timor é uma ficção lusófona onde a língua portuguesa navega contra uma geração culturalmente integrada na Indonésia, contra a geografia,contra manipulações políticas internas e contra a sabotagem de várias agências internacionais. A reintrodução do português só poderá ter êxito com a cumulação de duas coisas: firmeza política, em Díli, sobre as suas línguas oficiais; massificação de meios ao serviço de ambas.
O Instituto Nacional de Linguística tem 500 dólares de orçamento mensal (exacto, 6000 USD por ano).
Na "Babel lorosa'e", como lhe chamou Luiz Filipe Thomaz, não se fala bem nenhuma das línguas da praça (tétum, português, inglês, indonésio). Uma língua é a articulação de um mundo e do nosso lugar nele. Perdidos da gramática e do vocabulário, uma geração de timorenses chegou à idade adulta e ao mercado de trabalho sem muitas vezes conhecer conceitos como a lei da gravidade, o fuso horário ou as formas geométricas, apenas para dar exemplos fáceis.
Aos poucos bancos com balcão em Díli (três) chegam projectos de investimento estrangeiro cujos planos de amortização não prevêem mão-de-obra timorense ou que contam os timorenses como peso-morto na massa salarial, ao lado de operários ou técnicos importados que responderão pela produção.
in Público, 25 de Novembro de 2008