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Pelourinho // Mau uso da língua no espaço público

Um “caço” num mar de siglas

Um “caço” afogado em siglas1. Ou como se o verbo caçar admitisse duplo particípio passado. In jornal i de 23/03/2012.

 

Li sobre o PIEF no "Público". PIEF é o Programa Integrado de Educação e Formação. Nasceu afogado em siglas1, no âmbito do PPEETI (Programa para a Prevenção e Eliminação da Exploração do Trabalho Infantil), que em 2009 deu lugar ao PIEC (Programa para a Inclusão e Cidadania). Era gerido pelo ME (Ministério da Educação), pelo ISS (Instituto de Segurança Social) e pelo IEFP (Instituto de Emprego e Formação Profissional), estes dois tutelados pelo MTSS (Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social).

No "Público" afirma-se que há jovens contemplados pelo PIEF que se sentem defraudados: prometeram-lhes que se frequentassem as aulas receberiam passe e uma refeição; não lhes servem nem uma nem outra. Um dos jovens (16 anos) não teve vergonha de ser entrevistado e afirmou: «Vergonha é roubar e ser caço. Eu já roubei e nunca fui caço

Caçar não é um verbo que admita duplo particípio. Mas o jovem, com a sua competência de falante nativo, sabe que a forma regular é geralmente utilizada com o verbo ter e a forma irregular com o verbo ser (ter matado, ser morto; ter salvado, ser salvo). Daí o “caçado” e o “caço”. Mal-educado e mal formado, com toda a certeza. Porém, linguisticamente competente.

1É de referir que há distinção entre siglas e acrónimos.

Fonte

Texto publicado no diário i, do dia 23 de março de 2012, na coluna do autor sobre erros detetados, com o título Duplos Particípios.

ISCTE-Instituto Universitário de Lisboa ISCTE-Instituto Universitário de LisboaISCTE-Instituto Universitário de Lisboa ISCTE-Instituto Universitário de Lisboa