Não se trata, da minha parte, de renegar a “tese” que, há muito tempo, em muitos lugares e de muitos modos, tenho proposto e procurado demonstrar, a saber, de que, «Mais que projeto ou questão cultural e até linguístico-literária, a lusofonia é um primordial projeto ou questão de comum espaço geostratégico e económico-político próprio no globalizado mundo contemporâneo, em que a CPLP ou Comunidade Lusófona até poderia tornar-se num paradigmático exemplo de uma grande e bem-sucedida “Globalização Ecuménica e pós-colonial”».
Mas, embora a lusofonia não seja somente uma «questão de linguística e de literatura», a língua portuguesa poderá e deverá tornar-se uma das grandes riquezas e sem dúvida o grande “ex-libris” de todos os países e povos da CPLP, e todo o investimento na sua cultura e difusão constitui um dos investimentos mais inteligentes e mais rentáveis.
No recomeço das suas atividades, a partir das instalações cedidas pela Universidade Lusófona (embora no seu programa radiofónico semanal tal não apareça1), o Ciberdúvidas publicou um emblemático texto de José Saramago, emblematicamente intitulado: Uma língua que não se defende, morre.
E também, por exemplo, não é sem significado intencional que a primeira das disciplinas do primeiro Mestrado em Espaço Lusófono: Lusofonia e Relações Internacionais foi e é a unidade curricular Estratégias Linguísticas e Geopolíticas da Lusofonia!
Quando entenderão, efetivamente, todos os países e povos da CPLP «que o seu futuro de identidade, de desenvolvimento, de democracia, de influência no concerto ou desconcerto das nações, etc., passa pela lusofonia, a qual, no sentido exposto, é também essencialmente uma “questão de língua portuguesa”»? E isto é válido para Portugal (que só poderá ser plena e interessantemente europeu enquanto lusófono, embora também só possa ser plena e interessantemente lusófono enquanto europeu), para o Brasil (que só poderá ser plena e interessantemente "mercosulista” e nação liderante do novo grupo de nações emergentes como o grupo dos BRICS, etc. enquanto lusófono, embora também só possa ser plena e interessantemente lusófono enquanto “mercosulista”, etc.), para Angola (que só poderá ser plena e interessantemente africana enquanto lusófona, embora também só possa ser plena e interessantemente lusófona enquanto africana), o mesmo devendo dizer-se, mutatis mutandis, relativamente a todos os demais países e povos de língua portuguesa (Galiza incluída, que só poderá tornar-se plena e interessantemente ibérica e europeia enquanto lusófona, embora também só possa tornar-se plena e interessantemente lusófona enquanto ibérica e europeia).
Quando é que os países e povos de língua portuguesa se darão conta, tomarão a sério e explorarão económica e geostrategicamente as virtualidades únicas de uma das pouquíssimas línguas potencialmente universais do século XXI que é a língua portuguesa (já nas palavras de Fernando Pessoa, «língua universal», porque falada em todos os continentes e falada por um grande país, que é o Brasil!)?
E espero que seja para todos os lusófonos cada vez mais evidente que a entrada do Brasil para membro permanente do Conselho de Segurança da ONU, além de «digno e justo» no âmbito da reconfiguração da Nova Ordem Internacional, seria também mais que «racional e salutar», do ponto de vista da afirmação da CPLP e da lusofonia.
A proclamação do Dia de Camões como o Dia da Língua Portuguesa e da Lusofonia poderia tornar-se num contributo decisivo para a construção de uma «lusofonia ecuménica e pós-colonial», até porque, e não se trata de mera tautologia, todos os países e povos de língua portuguesa ou serão lusófonos ou nunca serão totalmente de nenhum modo!
Quem tem ouvidos para ouvir que ouça, quem tem olhos para ver que veja, quem tem inteligência para entender que entenda, quem tem poder para decidir que decida e quem tem força para agir que aja!
Caso para recordar os versos de Camões, que assim se transubstanciariam de «passadistamente lusitano-lusíadas» em «futuristamente ecuménico-lusófonos»:
«Fazei, senhor, que nunca os admirados/Alemães, Galos, Italos, Ingleses/ Possam dizer que são para mandados/Mais que para mandar os Portugueses!»
1 N. E. – Os programas Páginas de Português e Língua de Todos – emitidos na Antena 2 e RDP África, respetivamente — são realizados pela Universidade Autónoma de Lisboa. Daí a referência na ficha dos programas, como mandam as regras. Já o apoio da Universidade Lusófona ao Ciberdúvidas encontra-se devida e permanentemente assinalado na sua primeira página, juntamente com o da Fundação Vodafone.
Cf. Conceito de Lusofonia, de Maria Sousa Galito.