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Pelourinho

A (ir)responsabilidade de se falar e escrever em público

      Escrever ou falar no espaço público impõe responsabilidades suplementares nada exemplares nestas seis recentes ilustrações:

 

1. “A” moral e “o” moral do Sporting

     No Desporto da TSF1 ainda há quem, imagine-se, confunda a moral com o moral de uma equipa de futebol, no caso o Sporting Clube de Portugal. Que os seus responsáveis técnicos estavam «a tratar da moral da equipa», depois dos dois desaires contra o Benfica e o Spartak de Moscovo.
     Não fora a asneira, era caso de notícia… mundial!...

      1 no dia 7 de Dezembro de 2006, 12h20

2. « … pudemos aperceber-nos»

     «Em Janeiro deste ano, pudemos apercebermo-nos disso mesmo, quando a Gazprom (o consórcio russo para a extracção e distribuição de gás natural) decidiu interromper o fornecimento à Ucrânia.»2
     A locução verbal obriga a empregar-se no infinitivo o verbo principal (aperceber-nos): «Em Janeiro deste ano, pudemos aperceber-nos disso mesmo…».

     2 Luciano Amaral, “Diário de Notícias”, de 7 de Dezembro de 2006

3. Meditar em

     «E há outra coisa que é preciso meditar: é que Portugal gasta com as Forças Armadas 2,4% do PIB nacional, que é mais do que gastam países como a Alemanha ou como a Suécia, que é o dobro do que gasta um país como a Espanha, aqui ao lado (…)».3
     O verbo meditar, quando usado transitivamente, pede um complemento iniciado pela preposição em: «Meditei em tudo o que me disseste»; «medita no que leste e ouviste».
     A frase acima deveria pois ter começado deste modo: «E há outra coisa em que é preciso meditar (…)».

     3 Miguel Sousa Tavares, TVI, “Jornal Nacional” de 5 de Dezembro de 2006

4. Sob ≠ sobre

     «Detesto aquela sensação de que a coisa não está sobre controlo».4
     Erro (básico): a troca da preposição sobre (por cima) pela preposição sob (debaixo de).
     Portanto: «Detesto aquela sensação de que a coisa não está sob controlo (= debaixo de controlo, controlada)».

     4 Suzete Henriques, “24 Horas” de 5 de Dezembro de 2006

5. Implicar + conjuntivo

     Para cada vez mais jornalistas o conjuntivo é assim uma espécie em vias de extinção, como se pode ver nesta frase do jornalista Rui Alves Veloso, proferida no “Telejornal” da RTP-1 de 6 de Dezembro p.p. A propósito da OPA da Sonae sobre a PT, referiu que, em certas circunstâncias, esta empresa «terá de vender todo o negócio de conteúdos da PT Multimédia», acrescentando: «Esta exigência implica que a Sonaecom terá de desfazer-se, por exemplo, dos cinemas Lusomundo e de todas as participações em canais de televisão.»
     Como o verbo implicar pede uma oração completiva (ou integrante) com o verbo no modo conjuntivo, a frase deveria ter sido dita assim: «Esta exigência implica que a Sonaecom tenha de desfazer-se, por exemplo, dos cinemas Lusomundo».

6. Nem o verbo haver?!

     Pior só mesmo esta frase, da autoria de Luís Fontes, no jornal "24 Horas" de 7 de Dezembro p.p.: "Tivemos de arranjar provas que sustentassem que haviam pessoas a lucrar com a exploração (…)".
     Como é possível ser-se jornalista e não saber que o verbo haver no sentido de existir não tem plural?!

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