DÚVIDAS

Plural de mil, outra vez

1. A propósito do plural de "mil" (D'Silvas Filho, 7/11/2003) aponto o lapso de escrita óbvio no primeiro parágrafo: onde se lê «numerais ordinais» deve ler-se «numerais cardinais».
2. Imprecisão no segundo parágrafo e alhures: cumpriria dizer, de rigor, que a regra de pluralização do -il em -is se aplica apenas ao -il final tónico, e a do -il em -eis apenas ao -il final átono. A hipótese de "meis" como plural de mil (-il tónico) nunca poderia, por conseguinte, subsumir-se nesta última regra.
3. Os monossílabos terminados em -l constituem um conjunto fechado e reduzidíssimo: cal, gral, mal, sal, tal, qual, fel, gel, mel, mil, til, mol, rol, sol, sul; ao todo, 15 vocábulos, afora algum mais que me haja escapado.
4. No estado actual da língua dita culta, dos quinze vocábulos assinalados, alguns têm o plural fixado de há muito: males, grais, sais, tais, quais, suis; os restantes vacilam na forma utilizada: mols/moles (variante apenas gráfica), cales/cais, feles/féis, geles/géis, meles/méis, miles/mis, tiles/tis.
5. Em face das alternativas de pluralização de mil, haverá razões que levem a preferir uma delas? A favor de "miles" (assim como de "tiles") poderia aduzir-se talvez a maior "relação imediata" com o singular. D'SF prefere «mis» mas não apresenta qualquer justificação, antes parece contradizer-se, pois não se vê, seguindo o seu raciocínio a propósito da escolha de males e cales, qual a confusão suscitável pelo emprego de miles. Na lógica da sua orientação e considerando-se que «mis» pode igualmente ser o plural de mi (nota musical), seria preferível a forma miles. Na prática, a contextualização do enunciado raramente dará azo a este tipo de confusão.
6. Relativamente a males, não há nenhuma alternativa viável. A pseudo-alternativa "mais" é forma perfeitamente obsoleta em qualquer uso culto actual.

Resposta

Começo por agradecer as observações e precisões feitas. Não respondo para alimentar uma controvérsia, pois considero que o assunto não tem importância que o justifique. E ficarei por aqui.
1. O lapso na escrita (agradeço o termo usado) já foi emendado em linha. `O fluxo de raciocínio envolvido no fundo de problemas em solução´ tende a que sejamos muitas vezes imprecisos na forma; e pode acontecer que um erro de escrita passe sistematicamente despercebido pelo autor, por mais que analise de novo o texto. Parte-se do princípio de que essa forma se fixou como correcta, não sendo necessário prestar-lhe atenção. Só muitas vezes outra pessoa dá pelo erro. O facto releva mais uma vez a enorme importância dos revisores de texto.
O que vale é que o cérebro humano é mais perfeito do que os computadores; e, num ambiente de tolerância e discernimento, o receptor corrige automaticamente a estrutura de superfície, quando a incoerência é óbvia na estrutura profunda. Fico triste por ter cometido o lapso, mas a tristeza é atenuada com o pensamento de que só os eleitos é que nunca erram. Com o tempo, concluí, também, que uma coisa é a imprudência, outra o pavor de errar; e que este pavor faz com que se fuja do risco, que se fique inibido na criatividade e na inovação.
2. Quanto à diferença entre plurais nas sílabas tónicas ou átonas, tem toda a razão, mas lembro que o objectivo era mostrar que a “donna” exige prudência, pois a confusão pode instalar-se (nem toda a gente conhece essa regra...)
3. É verdade que existem ainda as alternativas cales/cais, feles/féis, geles/géis, mas o Dicionário Houaiss já não regista 'miles' nem 'tiles'. Ora como o companheiro admite a alternativa, concluo que me é legítimo preferir mis, tanto mais que sigo o mestre Sá Nogueira («é a única aconselhável») e 'miles' parece ter já sido abandonada (além de que existe Miles, nome próprio e termo mitológico).
4. Estão justificadas acima as razões por que prefiro mis a 'miles'; mas, no texto criticado, elas já estavam implícitas naquilo que escrevi a propósito de 'méis' não estar imediatamente relacionado com mil (ao passo que mis está). Pensei que não seria necessário repetir a ideia; pelos vistos era, vejo com pena. Quanto a 'mis' poder ser também o plural de mi, nota musical, não há o mesmo inconveniente que existiria na confusão que poderia eventualmente surgir em 'cais', de cal, e 'mais', de mal.
5. Está obsoleto 'mais', de mal? Tanto melhor. Parece que 'miles', de mil, leva o mesmo caminho...

Agradeço novamente o favor dos seus comentários.
E aproveito para pedir, a quem me ler, que nunca hesite em me corrigir se discordar do que escrevo. Críticas construtivas e corteses, como foram a deste nosso antigo e conhecedor companheiro de estudo da língua, são sempre preciosas para o aperfeiçoamento de Ciberdúvidas. 

ISCTE-Instituto Universitário de Lisboa ISCTE-Instituto Universitário de LisboaISCTE-Instituto Universitário de Lisboa ISCTE-Instituto Universitário de Lisboa