DÚVIDAS

Novo acordo. Duplas grafias, facto, factor, etc.

Acompanhando a polémica sobre o novo acordo ortográfico com bastante interesse (e com opiniões divididas sobre alguns aspectos do mesmo) gostaria de esclarecer uma dúvida sobre a questão da dupla grafia de várias palavras. Segundo o que tenho lido (e consultado, p. ex., no dicionário da Texto Editora), a grafia de palavras como facto passará a depender única e exclusivamente da sua pronúncia. Se se pronunciar o 'c', escrever-se-á 'facto' (caso de Portugal); se não se pronunciar, escrever-se-á 'fato' (caso do Brasil).

Todavia, existem palavras da mesma família de facto, como factor, factorização, etc., cujo 'c' não se pronuncia em Portugal. A minha dúvida é esta: por uma questão de coerência, considero que deveria escrever todas esssas palavras da mesma família com o 'c', mesmo quando este não fosse pronunciado. Poderei fazer isso, ou o critério fonético será o obrigatório? É de se notar que todas as palavras supracitadas admitem dupla grafia, embora não tenha ficado muito claro até agora se a dupla grafia se pode utilizar no mesmo país, ou se servirá apenas para distinguir como se escreverão as palavras pronunciadas de forma diferente em Portugal e no Brasil.

Resposta

Facto/fato é uma dupla grafia estabelecida no próprio texto do acordo de 1990. Factor aparece referido como tendo supressão do c no mesmo texto (Nota Explicativa). Penso que as grafias em Portugal serão fator, fatorização, pois a consoante c não é articulada em Portugal nestas palavras (veja a pronúncia de factor no Grande Dicionário da Porto Editora e no dito da Academia de 2001). Fator é também a pronúncia e grafia no Brasil. Penso que não há justificação para a consoante muda nestas palavras, de acordo com o que está estabelecido nas normas (regra b da Base IV). Repare também que estas normas dispensam a congruência gráfica: Egito e egípcio.

As opiniões sobre novas palavras para o acordo de 1990, sejam elas quais forem e venham de onde vierem, por muito respeito que inspirem, não fazem por enquanto lei, naquilo em que o texto do acordo não for taxativo.

No entanto, há um critério que me orienta no raciocínio.

Comecemos por lembrar que o objectivo do novo acordo não foi unificar a língua, pois a sua variabilidade sintáctica, semântica e até fonética é uma riqueza, e, aliás, não faz sentido violentar os hábitos linguísticos das diversas comunidades que a usam.

Mas não esqueçamos que o objectivo «que tem havido nos esforços dos cientistas portugueses e brasileiros nos acordos sobre a ortografia» foi sempre conseguir que tenhamos efectivamente uma só língua e não aparentemente duas, com grafias diferentes. São as medidas que se tomam para  se ter uma ortografia comum que permitem conseguir a unidade na língua.

Ora, quando há mais do que uma forma para a mesma palavra, é contrariado este espírito-base dos unificadores, e que presidiu ao novo acordo: as duplas grafias só são aceites quando há variabilidade reconhecida, depreende-se do que está escrito.

Assim, penso que no futuro só as duplas grafias «absolutamente indispensáveis» serão consideradas legais. Por exemplo, uma palavra deixará de ser legítima com a consoante, se esta for muda na sequência em toda a lusofonia.

Mas há mais. Dentro do espírito de unidade, penso que haverá um acordo para evitar diferenças entre outras palavras, como comummente/comumente, hífenes/hifens, em que as soluções brasileiras são mais lógicas; ou como connosco/conosco, em que são as portuguesas mais aceitáveis.

Veremos o que irá indicar o Vocabulário Comum (exigido no Preâmbulo do Acordo de 1990…). Não se entende que possamos pôr em vigor a nova ortografia sem, antes, se estabelecer o que falta, e muito, para que a nossa língua portuguesa tenha a almejada unidade planetária.

Termos do novo acordo para Portugal: objetivo, sintática, efetivamente

 

CfFacto e fato depois do Acordo Ortográfico

 

Ao seu dispor,

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