DÚVIDAS

Satisfação, satisfeito, satisfazer e a palavra primitiva

Há dias surgiu-me uma dúvida: Considerando que as palavras derivadas têm origem numa palavra primitiva, como classificar as palavras satisfação, satisfeito, satisfazer, uma vez que não consigo encontrar qual a palavra primitiva, pois todas têm o seu vocábulo latino, que é diferente nos três casos? No entanto, ambas têm um radical comum: satisf-

Sinto-me um pouco confusa, pois, após algumas procuras, concluí que em algumas gramáticas se diz que as palavras derivadas têm origem numa palavra primitiva, ao passo que noutras se diz que têm um radical comum. Qual é a diferença?

Obrigada mais uma vez pela vossa ajuda.

Resposta

O termo palavra primitiva pertence à terminologia da gramática tradicional, fixada pela Nomenclatura Gramatical Portuguesa de 1967 (integrado no domínio da lexicografia, mais especificamente, no tema da formação das palavras).1 É essa a razão pela qual encontramos tal termo nas gramáticas tradicionais, onde aparece no binómio «palavras primitivas e derivadas», portanto, por oposição às palavras derivadas, como se pode verificar pela leitura dos excertos retirados da Nova Gramática do Português Contemporâneo (1997), de Celso Cunha e Lindley Cintra: «Chamam-se primitivas as palavras que não se formam de nenhuma outra e que, pelo contrário, permitem que delas se originem novas palavras no idioma. Assim: fumo, mar, novopedra» (p. 82) , enquanto «[se] denominam [...] derivadas as que se formam de outras palavras da língua, mediante o acréscimo ao seu radical de um prefixo ou um sufixo. Assim: fumoso, defumar, marinha, marear, novinho, renovar, pedreiro, empedrar» (idem).

A partir destas definições, apercebemo-nos de que os termos palavra primitiva e radical não correspondem à mesma realidade gramatical e linguística. É de referir que a gramática citada tem como referência o radical para distinguir as palavras simples das compostas,  integrando nas primeiras «as palavras que possuem apenas um radical, sejam primitivas, sejam derivadas: mar, marinha, pedra, pedreiro» (idem), e, nas compostas, «as que contêm mais de um radical:  aguardente, quebra-mar, pontapé, pedra-sabão».

A diferença que se verifica é que, actualmente, o Dicionário Terminológico (DT), adoptado pelo Ministério da Educação de Portugal, assim como as gramáticas mais recentes, não registam o termo palavra primitiva na sua terminologia, usando os termos forma de base — «constituinte morfológico que inclui obrigatoriamente um radical, a partir do qual se formam novas palavras. Exemplos: doc- é a base para adoçar; adoça- é a base para adoçante» (DT)  — e radical — «constituinte morfológico que contém o significado lexical e exclui os afixos flexionais. O radical pode conter afixos derivacionais. Os radicais pertencem a categorias sintácticas, sendo identificados por etiquetas como: radical adjectival, radical adverbial, radical nominal, radical verbal. Por exemplo, o radical da palavra [casa] é o constituinte [cas]».

Assim, segundo o DT, o processo de formação das três palavras é o de derivação por afixação, isto é, «processo morfológico que consiste na associação de um afixo a uma forma de base. Como existem vários tipos de afixos, também existem vários tipos de afixação, destacando-se a prefixação e a sufixação. A flexão e a derivação são processos morfológicos realizados por afixação» (DT).

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