DÚVIDAS

Sobre o correcto e o uso

Em relação à dúvida "hiperqueratose ou hiperceratose", agradeço ao dr. J.N.H. que aprofunde a razão da resposta. Isto é: como e porquê chegou a ela. Até porque não me parece simples a justificação.
a)Se dizemos queratina, queratinizado etc. e a origem grega é keratos, como se transforma o "q" em "c" só por querermos acrescentar o prefixo hiper? A mesma questão se aplica a disquinesia ou discinesia (do grego movimento - kinesis).
b)Para complicar, não compreendo como se justifica que na linguagem corrente se a palavra surge no início (p. ex. cinesiterapia, cinestésico ou cinema) é pacífica a pronúncia, geralmente lida assim, mas se surge no meio (p. ex. disquinesia) a pronúncia (se bem que já com menos unanimidade) é geralmente lida e escrita no meio médico como Q?
c) E se no meio médico é (penso eu, baseado na minha experiência pessoal) geralmente lida assim, o que impera? - A regra do uso, que dirá que se deve pronunciar Q em hiperqueratose, ou o conselho que nos deu de que se deve pronunciar C?
2 - Parece-me que a questão major é: - Como evolui a fonia? Por exemplo os brasileiros escrevem mídia porque redescobriram o termo media (meio) através do inglês, em que se pronuncia de facto "mídia". Mas em português, muito antes da invenção dos computadores sempre se pronunciou m"é"dia, e a utilização excessiva e injustificada de anglicismos informáticos leva a liquidar termos portugueses antes utilizados correctamente por termos incorrectos (password em vez de senha etc. etc.) Já agora uma nota: os brasileiros conservam muitos termos portugueses arcaicos e correctos que entretanto caíram em desuso em Portugal e que são interessantíssimos: A introdução de novelas e artistas brasileiros em Portugal traz-nos algumas delícias: Por cá, diz-se vou a uma entrevista ou vou fazer (ou ter)uma entrevista e ouvi há pouco tempo a expressão brasileira "vou entrever fulano".
Parabéns por um serviço tão útil para a defesa de uma língua portuguesa dinâmica mas correcta cujo uso possa ser um prazer. Obrigado desde já pelos seus esclarecimentos.

Resposta

É esta a mesma doutrina segundo a qual devemos dizer "discinesia" e não "disquinesia".

O que deve imperar é o correcto e não o uso. Se formos apenas pelo uso, qualquer dia não nos entendemos. É certo que é o uso que faz a língua, mas este, o uso, tem de ser devidamente preparado e corrigido. Por isso, durante muitas dezenas de anos, se dizia "chòfer" e agora quase todos proferem "condutor" ou "motorista". Também há dezenas de anos se dizia "sob o ponto de vista", e agora, correctamente, "do ponto de vista". Também há anos se dizia "fisioterápia", inclusivamente os médicos, e agora está-se a tender para o correcto "fisioterapia".

Ainda bem que os Brasileiros mantêm muitos arcaísmos. Mas eles também não deixam de nos dar maus exemplos. É o caso dessa, do "mídia", à inglesa.

E se me permite, deixo aqui registo da satisfação de termos um médico que tanto se interessa pela Língua Portuguesa – o dr. V.M. Borges.

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