« (...) Para me precaver de possíveis mal-entendidos em situação semelhante, consultei minhas amigas internacionais mais versadas em línguas, a própria e a dos outros. (...)»
Um amigo meu, carioca de passagem por Lisboa - vamos chamá-lo de Guilherme, embora este seja o seu verdadeiro nome, arranjou uma namorada portuguesa. Ele a levou a jantar numa romântica tasca sobre o Tejo. Na sequência, a rapariga o convidou à sua casa e, depois de discutirem Kierkegaard e tomarem alguns copos, foram para o berço. No melhor da festa, quando as apaixonadas piruetas se encaminharam para o inexorável e delirante clímax, a menina começou a exclamar: «Ai, que me vem! Ai, que me vem!»
Guilherme levou um susto. Nunca tinha ouvido aquilo. Achou que ela estava tendo uma coisa. Na verdade, estava. Estava tendo um lindo orgasmo à maneira local.
Quando Guilherme voltou ao Rio e me contou a história, fiquei pensando sobre como, mesmo quando se trata de sexo, que é uma das poucas atividades humanas em que todos falam mais ou menos a mesma língua, às vezes pode ser necessário um intérprete. «Ai que me vem! Ai que me vem!», por exemplo, significa o mesmo que o brasileiro «Estou gozando! Estou gozando!» - só que muito mais delicado e poético. As brasileiras bem que poderiam adotá-lo.
Outro conhecido meu, que andou pela Indonésia a negócios, certamente escusos, foi surpreendido quando a moça, em situação idêntica, começou a gritar: «Aku keluar! Aku keluar!» O sujeito temeu ter infringido algum tabu regional ou coisa assim e até ser preso por isso. Mas, não, ela estava apenas verbalizando o prazer que aquele singelo papai-mamãe lhe proporcionara.
Bem, para me precaver de possíveis mal-entendidos em situação semelhante, consultei minhas amigas internacionais mais versadas em línguas, a própria e a dos outros. Eu queria saber as variações nacionais na linguagem do prazer. Uivos, bufados e ruídos imorais, como «Uuuuuu!», «Grmmmphkk!» ou «Brjjwwkk!», comuns a todas as culturas, foram descartados, assim como interjeições medíocres como «Yeah! Yeah!», «Oui! Oui!» e «Ja wohl! Ja wohl!», que americanas, francesas e alemãs sem imaginação disparam quando a coisa lhes está a vir. Concentrei-me nas declarações de mulheres que levam seu orgasmo a sério, e descobri que a maneira pela qual este ou aquele povo declara «Estou gozando! Estou gozando!» ajuda a entender o respetivo temperamento nacional.
A americana diz «I'm coming! I'm coming!». A francesa, «Je viens! Je viens!». A alemã, «Ich kamme! Ich kamme!». Tudo isto significa, literalmente, «Estou vindo! Estou vindo!» ou «Estou chegando! Estou chegando.» Como se vê, a ideia de que o orgasmo é um fluido em movimento, que está a caminho e não demora, é universal. Mas há povos que conseguem exprimi-la de modo mais enfático. A espanhola grita «Estoy corriendo! Estoy corriendo!» – o que pode levar um brasileiro a pensar que a moça vai pular da cama e correr em direção à porta, porque não o achou grande coisa na cama.
Já a japonesa é tão reservada que só deixa para falar depois e, mesmo assim, delicadamente: «Itchatta yo» – significando «acabei de ir». E só diz isto uma vez e sem ponto de exclamação, donde fique atento. Se ela declara que já foi, é porque está tudo bem – e você que trate de ir também, antes que ela resolva voltar. Em hebraico é a mesma coisa, com a diferença de que a mulher diz «Ani gomeret» – que significa um simples e sóbrio «terminei», só faltando assinar e reconhecer a firma. Está certo – afinal, o que há de tão excecional em gozar? Já uma italiana, ao sentir que a coisa está chegando, anuncia isso da maneira mais heroica e triunfante: «Arriva! Arriva! Arriva!» – assim mesmo, em triplicata. O homem se sente o próprio Garibaldi, todo embandeirado.
Diante disso, passei a encarar carinhosamente o nosso «Estou gozando! Estou gozando!» É alegre, amoroso e ligeiramente moleque. Além disso, gozar, no Brasil, significa também zombar de alguém, criticá-lo ridicularizando-o. Portanto, trabalhe direito, meu amigo, para não correr o risco de levar uma gozada da mulher – se não a fizer gozar.
Crónica do autor no Diário de Notícias de 27 de abril de 2019.