Quanto ao Português, chamo desde já a sua atenção para isto: – que os legítimos textos arcaicos não são uma floresta oscura, selvaggia ed aspra e forte, uma série de vocábulos raros e complicados, entrelaçados em construções bárbaras, como aquelas Relíquias apócrifas e artificiosíssimas que durante séculos passaram por obras dignas de fé, de um Egas Moniz Coelho e Gonçalo Hermiguez.
Numa balada de Sancho I, composta antes de 1200, uma das mais antigas poesias trovadorescas de Portugal, de deliciosa cadência rítmica, há apenas umas vinte e tantas palavras diversas, todas elas singelas quanto à forma e quanto à essência e – todas – já eram então o que são hoje. É um fenómeno notabilíssimo, talvez único, não só quanto ao português, mas também em todos os idiomas neo-latinos.
Reparem bem! – Ela diz:
en gran cuidado por meu amigo
que ei alongado. Muito me tarda
o meu amigo na Guarda!
Ay eu coitada! Como vivo
En gran desejo por meu amigo
que tarda, e non vejo! – Muito me tarda
o meu amigo na Guarda!
in "Introdução a Lições de Filologia Portuguesa", Revista Lusitana, vol. 21º, Lisboa, 1918