Controvérsias // Escrita jornalística
Dar nega a Elon Musk
Um uso questionável em textos noticiosos
Acerca da manifestação de interesse de muitas pessoas em receber um dos implantes cerebrais da Neuralink, empresa neurotecnológica do multimilionário Elon Musk, lê-se numa notícia da edição em português do site noticioso Executive Digest:
«No início deste ano, a Food and Drug Administration dos EUA concedeu à Neuralink aprovação para realizar testes em humanos do seu dispositivo, depois de uma nega inicial por questões de segurança.»
Consultando o dicionário, apura-se que nega é substantivo feminino, empregado como sinónimo de «negativa, recusa, rejeição» e atestado como vocábulo de uso informal (Dicionário da Língua Portuguesa, Academia das Ciências de Lisboa). Impõe-se, por isso, a questão: a opção pelo substantivo nega, em lugar de um seu sinónimo, não é excesso de informalidade num texto noticioso?
De facto, quando se pretende transmitir objetividade e confiança aos leitores, a informalidade em textos noticiosos deve ser exercida com cuidado e, salvo contextos específicos, deve ser mesmo evitada. Em causa está o facto de o tom e estilo poderem ter impacto negativo na credibilidade da informação. Assim, numa notícia que toca num assunto sensível, mais apropriado seria escrever-se:
«No início deste ano, a Food and Drug Administration dos EUA concedeu à Neuralink aprovação para realizar testes em humanos do seu dispositivo, depois de recusa inicial por questões de segurança.»
Não é esta uma recomendação decorrente de uma posição radical, ao ponto de declarar a escrita formal como obrigatória em textos noticiosos. Há contextos particulares, como foi dito, que permitem algum grau de informalidade ou uma abordagem mais descontraída, considerando, nestes casos, o público-alvo e o propósito da notícia. Uma crónica, uma coluna sobre vida mundana ou uma página juvenil são compatíveis com certos modismos e expressões populares, mas estes, numa notícia, são opção de acerto duvidoso.
Cf. Língua, jornalismo e informalidade +A informalidade na escrita jornalística".