José Mário Costa - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
José Mário Costa
José Mário Costa
62K

Jornalista português, cofundador (com João Carreira Bom) e responsável editorial do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa. Autor do programa televisivo Cuidado com a Língua!, cuja primeira série se encontra recolhida em livro, em colaboração com a professora Maria Regina Rocha. Ver mais aquiaqui e aqui.

 
Textos publicados pelo autor

Pergunta:

Sendo a expressão n.º uma palavra abreviada, significando que alguma coisa foi retirada, no caso, o ponto a seguir ao n significa que foram retiradas as letras úmero, e servindo o º superior de indicação do género (masculino), significando que foram retiradas as letras intermédias úmer, parece que não faz sentido, nem é correcto, que a seguir à expressão completa, n.º, se possa escrever, sem espaço, qualquer número cardinal, ou seja, "n.º1", sendo o 1 outra palavra, apesar de ser um símbolo matemático. Se se escrever "n.º1", parece que, querendo-se escrever outros cardinais, por exemplo, 2, 3, 4, etc., estes não são escritos sem espaço: "n.º1,2,3,4". O mesmo reparo deve ser feito quando se abrevia a palavra artigo, para art.º, à qual não se deve seguir o n.º do mesmo: "art.º1.º", pois também aqui o 1.º é uma palavra abreviada, que deve ser escrita com separação da anterior, mesmo que abreviada. Já agora, saliento ainda ser vulgar ver escritos em parêntesis com um espaço a seguir ao primeiro símbolo, ou, até, com espaços entre os símbolos, por exemplo, ( masculino) ou ( masculino ).

Resposta:

Tem toda a razão no que aponta, no seguimento do que várias vezes foi aqui esclarecido, sobre o tema das abreviaturas e a sua diferença com a grafia dos símbolos em geral. Em síntese:

1) Em toda e qualquer abreviatura (de palavras ou numerais) é obrigatória a inserção do ponto, com sinal de que se trata de uma redução de letras. Por isso, escreve-se n.º (o traço é uma opção de natureza gráfica), e não , como se generalizou em vários meios.

2) Se abreviação for seguida de outra(s), deve haver espaço: art.º 1.º (ou art.º 1).

3) Sem espaço, porém, o que ficar entre parêntesis, como se pôs em cima.

4) A terminação o ou a, em sentido expoente, usa-se consoante a palavra abreviada for masculina ou feminina. Por exemplo: «1.º classificado», mas «1.ª classificada».

 

[Cf., ainda, Textos Relacionados, ao lado.]

A culpa, depois, ainda é do Acordo Ortográfico...

«(...) Não se tratam de imagens "cliché ou icónicas, mas uma mulher que sofreu o choque de saber o seu destino e as dores do parto" (...)»

É uma incorreção antiga e continuada na imprensa portuguesa este (mau) uso no plural do verbo tratar, conjugado pronominalmente. Dos tais erros que, pela sua repetição, teimosa e desleixada, são bem ilustrativos de como (des)anda hoje o domínio do idioma nacional no jornalismo português*. Muito, mas mesmo muito, para além do Acordo Ortográfico, e da sua incompetente aplicação, como se continua a apregoar por aí.

Pergunta:

O nome da atual ministra da Justiça de Portugal tem sido grafado, na maioria das publicações noticiosas, como Francisca Van Dunem (com v maiúsculo). Segundo consta, o apelido é de origem holandesa e existe uma grande descendência dos van Dunem em Angola, de onde é natural a ministra. Na Internet encontra-se referência também às variantes "Van-Dúnem" e "Van Dúnem". Ao longo do tempo é natural que os nomes próprios vão alterando a sua grafia, e penso que a grafia correta do nome de cada pessoa é a que consta nos seus documentos oficiais ou a que a própria utiliza. Se assim for, e, se a pessoa a quem nos referirmos como "Van Dunem"/"Van-Dúnem"/"Van Dúmen" se chamar, de facto, assim, não há qualquer objeção à grafia usada. Estou certo? Pergunto-me, no entanto, se o uso de um v maiúsculo no nome da ministra é o correto ou se é apenas uma gralha, do mesmo género de quando se escreve «Leonardo Da Vinci» ou «Vincent Van Gogh»?

Obrigado desde já e parabéns pelo trabalho!

Resposta:

É tal qual o que escreve o consulente. Ou seja:

1.    O apelido da nova ministra portuguesa da Justiça escreve-se com v minúsculo, sem hífen e sem acento no u: van Dunem. É assim que ela e a sua família assinam – e, como tal, é assim que devemos grafar: Francisca van Dunem.

O apelido é de origem holandesa, como a própria magistrada luso-angolana contava ao semanário Expresso de 2009, assim recordado na peça que sobre ela veio à estampa no jornal Público de 29 de novembro p.p.: «É um nome tradicionalmente angolano, com quatro séculos. Vem de um holandês que trabalhou para a coroa portuguesa e se estabeleceu em Angola. Relacionou-se com uma angolana com quem teve uma larga prole. Os respectivos descendentes decidiram seguir o exemplo e há imensos Van Dunem”. Contudo, “nem todos os apelidos Van Dunem correspondem à linhagem original, pois não raras vezes os escravos tomavam o nome dos senhores”, refere um amigo de família, que solicita o anonimato.»

2.    A adoção de corruptelas do nome vernáculo holandês pode, portanto, explicar as outras grafias que se disseminaram em Angola: com hífen, com o v maiúsculo e acento no u, como é caso do atual ministro da Saúde, José Van-Dúnem.*

3.    Corruptela do vernáculo holandês ou menor rigor na sua grafia*, o que prevalece no uso – seja com os nomes próprios como com os apelidos – é o que ficou registad...

Pergunta:

Existe alguma regra consagrada para separar a menção do género masculino da menção do género feminino, como por exemplo: «trabalhador/a» ou «trabalhador(a)»?

Resposta:

Como já aqui se respondia em anterior esclarecimento, nenhuma regra está formalmente estabelecida para esse tipo de referência gráfica – sendo, por isso, opcional, conforme o gosto e o estilo do utilizador e/ou da publicação que a ele recorra.

Omissos nessa especificação concreta, as gramáticas e prontuários ortográficos usam por regra os parêntesis curvos  para assinalarem o singular e o plural das palavras, assim como o respetivo género feminino e masculino. Vide, por exemplo a Nova Gramática do Português Contemporâneo, de Celso Cunha e Lindley Cintra (págs. 290, 322 e 515), Gramática da Lingua Portuguesa, Uma Nova Abordagem, de Álvaro Garcia Fernandes (págs. 117 e 146) e Novíssima Gramática da Língua Portuguesa, de Domingos Pascoal Cegalla (pág. 481). Mas também há os que usam indiferenciadamente o parêntesis curvo e a barra oblíqua ou diagonal. É o caso da Gramática Resumida, de Celso Pedro Luft (págs. 99, 119 e 173, p.ex.). Já o uso da barra é  o que se recomenda, por exemplo, no Guia para uma Linguagem Promotora da Igualdade entre Mulheres e e Homens na Admnistração Pública, da Comissão para a Cidadania e Igualdade do Género *.

Défice de conhecimento da sua própria língua

«(...)  se de facto o consórcio vencedor falhar ou incumprir com um que seja dos objetivos estratégicos, ou com um que seja dos elementos dos objetivos financeiros, reverte imediatamente o negócio com toda a capitalização que já está lá feita [na TAP]. Ou seja, [basta] se amanhã for incumprido um dos /áitems/  [do contrato] (...)»
[Miguel Pinto Luz, secretário de Estado das Infraestruturas, Transportes e Comunicações, no programa "Prós e Contras", RTP1, 16/11/2015]