Paulo J. S. Barata - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Paulo J. S. Barata
Paulo J. S. Barata
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Paulo J. S. Barata é consultor do Ciberdúvidas. Licenciado em História, mestre em Estudos Portugueses Interdisciplinares; curso de especialização em Ciências Documentais (opção Biblioteca e Documentação) e curso de especialização em Ciências Documentais (opção Arquivo).

 
Textos publicados pelo autor

Deparei-me no Expresso (n.º 2040, 3 de dezembro de 2011, Primeiro Caderno, p. 3) com um novo conceito e palavra: o «hactivismo», uma nova forma de luta política e de desobediência cívica utilizando a informática e que consiste em efetuar ataques a sítios empresariais e governamentais. O próprio jornalista traça-lhe a etimologia: palavra...

Depois do metrossexual, já dicionarizado, parece surgir agora o termo retrossexual, neologismo proveniente do inglês e aparentemente formado pela aglutinação das palavras retrograde (retr...

Pergunta:

Numa instituição, ouvi há dias um termo de que desconheço o sentido: estacionário.

Qual a sua origem? Qual a razão da ideia de algo que está parado, imóvel? Em que situações é utilizado?

Através de pesquisa nas respostas publicadas, verifiquei que há uma resposta sobre essa palavra, mas continuo com dúvidas.

Resposta:

A palavra estacionário é comum no vocabulário das artes gráficas e refere-se a todos os produtos que incorporem a identidade gráfica de uma organização, sobretudo em suporte papel ou em formato digital. O estacionário inclui o papel de carta, os envelopes, os cartões de visita, as pastas, os documentos contabilísticos (faturas e recibos, por exemplo) personalizados e/ou timbrados, isto é, com o logótipo e a designação da organização. Pode ainda englobar guias de transporte e remessa, folhetos publicitários, cartazes, e tudo o que permita identificar graficamente a organização.

A palavra não consta nos dicionários gerais, mas integra o vocabulário especializado das artes gráficas.

Etimologicamente, a palavra pode derivar do latim stationarius (estacionário). O estacionário* era o comerciante, o vendedor, uma espécie de livreiro que na Idade Média detinha os exemplaria (exemplares), cópias oficiais dos manuais universitários, licenciadas pelas universidades e consideradas autênticas, corretas. Esses exemplares eram compostos por cadernos independentes, cada um deles constituindo uma pecia (peça). Mestres, estudantes e copistas alugavam ao estacionário estas peciae (peças). As peças eram então copiadas, e em cada uma delas era colocada pelo copista uma marca personalizada, um sinal próprio que permitia identificar e controlar as unidades copiadas, servindo ainda como unidade de trabalho (trabalho à peça). O estacionário ou vendedor estacionário localizava-se em torno das universidades e tinha uma loja ou ponto fixo de venda, nisso se distinguindo dos demais vendedores medievais que eram essencialmente ambulantes. Dessas peças (pertença) do estacionário medieval que ostentavam a marc...

Pergunta:

Na redacção de um curriculum vitae:

– que pessoa usar – 1.ª pessoa do singular, impessoal, ou 1.ª pessoal do plural?

– que tempo verbal utilizar?

O CV é um documento de carácter pessoal, ou é um documento técnico científico?

Resposta:

Não existe um modelo ou uma norma única para a redação de um curriculum vitae. Relativamente à pessoa e ao tempo verbal, parece-me recomendável o uso da terceira pessoa do singular do pretérito perfeito e/ou o uso do particípio passado, conjugado(s) com o presente do indicativo, consoante se refiram a factos passados ou presentes. Ou, em alternativa, a utilização da primeira pessoa do singular do pretérito perfeito, conjugada com a mesma pessoa do presente do indicativo. É também possível, em algumas situações, a utilização do infinitivo impessoal, como acontece com o Modelo Europeu (CV Europass). Tenderia a rejeitar por inadequado, apesar da formalidade do documento, a primeira pessoa do plural, que daria ao mesmo um ar demasiado pomposo, acabando, de algum modo, por subverter o uso normal do plural majestático, utilizado como forma de modéstia. Note, porém, que, mais do que a escolha da pessoa ou do tempo do verbo, e eles podem alternar e conviver harmoniosamente, o curriculum vitae terá sobretudo de possuir coerência interna e de se adaptar à função ou lugar em causa.

Por último, o curriculum vitae, sendo um documento de carácter pessoal, não deixa de ser também um documento técnico, ou até mesmo técnico-científico, uma vez que segue modelos e normas de elaboração e estruturação. Ultimamente, e em virtude da maior circulação de pessoas no espaço europeu em programas de ensino e formação, em estágios profissionais, ou até mesmo na procura de emprego, tem-se generalizado o chamado CV Europass.

Pergunta:

Em resposta a algumas perguntas verifiquei que indicam acervo como diferente de espólio e não como sinónimos. Consultando um qualquer dicionário de língua portuguesa, verifico no entanto significado igual para ambas as palavras, ou seja, ambas a designarem conjunto de bens de uma herança.

Resposta:

Há pelo menos um dicionário geral que legitima a aceção que refere da palavra acervo, ou seja, conjunto de bens de uma herança, o que a torna sinónima de espólio. Porém, a interpretação mais comum é a de que os bens de uma pessoa viva constituem o seu património, o seu acervo. Ao passo que os bens de uma pessoa morta, não deixando de constituir o seu acervo, o seu património, são também o seu espólio, o seu legado, a sua herança. Tratando-se de pessoa viva e para se referir aos seus bens, usa-se a expressão acervo, com o sentido de conjunto, e nunca a palavra espólio. Tratando-se de pessoa morta, podem usar-se indistintamente as palavras acervo ou espólio. Há, porém, algumas cambiantes de uso da palavra espólio que convém assinalar. A palavra espólio também significa «despojo», ou seja, «restos», aquilo que sobra, aquilo que já não tem utilidade prática. Assim, se uma organização possui bens que já não são de uso corrente e a que atribui um determinado valor histórico e com eles constitui um museu, por exemplo, estes podem assumir-se como uma espécie de herança ou legado em vida, de espólio. Por extensão, a palavra espólio tem vindo a ser utilizada para representar o acervo de peças de um museu (espólio museológico), sobretudo quando se trata de museus constituídos essencialmente por espólios pessoais ou de organizaç...