DÚVIDAS

«Fazer-se pagar» e «fazer-se cobrar»
Tenho encontrado o verbo pagar associado a fazer-se com um sintagma nominal introduzido directamente (i. e. sem preposição): 1. «Dessa vaga de anulações têm estado a beneficiar os artistas da "segunda divisão" mais temerários, que têm vindo a substituí-los no circuito maior, fazendo-se pagar, em média, o dobro dos seus honorários normais.» 2. «E aqueles deputados que foram apanhados a roubar (fazendo-se pagar viagens que não fizeram)(...)» Não deveríamos usar aqui a preposição por («fazer-se pagar por viagens…/pelo dobro…»)? Julgo que deveríamos usar por em vez de de nas frases que se seguem (não?): 3. «Seis das oficinas, além de substituírem peças a mais, fizeram-se pagar de componentes não substituídos.» 4. «(…) a autarquia pretendia fazer-se pagar de um serviço anterior à privatização da recolha de lixos.» E tenho deparado com o uso de «fazer-se cobrar» no sentido de «fazer-se pagar»: 5. «Há lojas que o fazem gratuitamente, enquanto outras se fazem cobrar pela prestação destes serviços suplementares.» Creio que «fazer-se cobrar» é inaceitável, mas queria confirmar. Grato pela atenção.
Arte marcial japonesa (2)
Na qualidade de estudante da língua japonesa, permitam-me ajudar a esclarecer o consulente da pergunta 22227, independentemente das grafias dicionarizadas/oficializadas em Portugal. Em kanji (logogramas japoneses), o nome da arte marcial em questão escreve-se '柔術' (lit. «arte da suavidade»), que se desdobra no hiragana (silabário japonês) 'じゅうじゅつ'. Aplicando as regras do rōmaji (romanização do japonês, i.e., escrita deste idioma com o alfabeto latino), sabe-se que 'じゅ' = 'ju', 'う' = 'u', e 'つ' = 'tsu'. Substituindo as letras japonesas pelas latinas obtém-se 'juujutsu', porém empregam-se antes as formas 'jūjutsu' — indicando o mácron uma vogal longa — ou simplistamente 'jujutsu' dada a invulgaridade daquele diacrítico no português. O aportuguesado 'jiu' surge do facto de 'jyu' ser também aceite como romanização de 'じゅ', uma vez que 'じ' = 'ji' e 'ゆ' = 'yu', cuja versão reduzida ('ゅ') se traduz na aglutinação fonética à letra precedente bem como numa quase supressão do 'i' e do 'y' pronunciados. 'Jiu' é assim infiel à romanização, pois na realidade representa o hiragana 'じう', alheio a 'じゅうじゅつ'. Além disto, '柔' encontra-se igualmente presente no kanji de 'jūdō' ('じゅうどう'), '柔道' (lit. «caminho da suavidade»), pelo que é tão legítimo escrever 'jiujutsu' como 'jiudo', o segundo imediatamente percepcionado como um disparate. O mesmo se passa relativamente ao hífen em 'ju-jutsu' ou ao espaço em 'ju jutsu': ninguém escreve 'ju-do' nem 'ju do'. Por último, e neste contexto, 'jitsu' revela-se apenas um erro, infelizmente massificado à escala global, que seguindo a lógica do incorrecto 'jiu' até deveria ser 'jiutsu'. 'Jitsu' é uma das leituras de vários outros kanji, com significados que nada têm que ver com o de 'jutsu' (lit. «arte»), ou seja, uma palavra diferente e consequentemente deslocada. Resumindo, presumo que a leitura do japonês 'ju', a nós estranha, esteja na principal origem histórica das imprecisões/incorrecções mencionadas, e considero correcto em português apenas 'jujutsu'. Aproveito para acrescentar que, tal como ao praticante de judo se chama 'judoca', aportuguesamento de 'jūdōka', também o praticante de jujutsu se denomina 'jūjutsuka' ('jujutsuca'?).
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