DÚVIDAS

O plural dos nomes dos meses

Chamo-me Lígia Carvalho, sou coordenadora do departamento de Línguas da EBI de S. Martinho do Campo, em Santo Tirso, e gostaria de esclarecer uma dúvida recente colocada pelas minhas colegas. Com a introdução do acordo ortográfico há várias palavras que sempre considerámos nomes próprios que passaram a escrever-se com minúscula. Estou a referir-me aos meses e às estações do ano.

Consultando o Dicionário Terminológico em linha, encontrei a seguinte definição para um nome próprio: «nome que designa um referente fixo e único num dado contexto discursivo, pelo que é completamente determinado, não admitindo complementos ou modificadores restritivos ou variação em número». Refletindo sobre esta definição, cheguei a estas frases: «Os últimos invernos têm sido rigorosos»; «As primaveras têm chegado cedo» – estas frases fazem sentido, os nomes inverno e primavera admitem plural, logo são nomes comuns.

Contudo, as frases: *«Os janeiros são sempre chuvosos» ou *«Os maios têm estado quentes» são agramaticais, pelo que os nomes janeiro e maio têm de ser considerados nomes próprios. Será assim? Passamos a ter nomes próprios que se escrevem com minúscula? Nesta fase em que integramos o acordo ortográfico e a nova nomenclatura da gramática surgem muitas dúvidas às quais nem sempre estamos aptos a responder.

Resposta

Sobre a classificação dos nomes dos meses e das estações do ano, já aqui tive ocasião de me pronunciar.

Quanto ao teste aplicado pela consulente para determinar a subclasse dos nomes dos meses, confesso que, intuitivamente, não consigo rejeitar o plural desses substantivos. Claro que os nomes próprios se prestam, como se observa no Dicionário Terminológico, a «entrar em construções próprias do nomes comuns», como, por exemplo, «o Porto que eu conheci já não existe» (exemplo do DT). Pode ser este o caso de janeiro, por exemplo, no seguinte exemplo recolhido no do Corpus do Português de Mark Davies e Michael Ferreira (mantenho a ortografia original):

«E Otávio mostra-lhe uma senhora, que deveria contar seus bons setenta janeiros» (Joaquim Manuel de Macedo, O Moço Loiro).

Trata-se de um contexto em que a palavra se refere à idade de alguém, o que permite supor que a palavra janeiro está ser usada em lugar de anos, como uma metonímia.

Mas, se os nomes das estações e os dos dias da semana aceitam  a pluralização, porque não há-de acontecer o mesmo com os nomes dos meses? Na verdade, encontro nomes de meses no plural, como se ilustra em alguns exemplos colhidos no Corpus do Português de Mark Davies e Michael Ferreira (mantenho a ortografia original):

«Ia meado um Abril chuvoso e frio como os Abris soem ser em vale de montes nevosos» (Tomás Figueiredo, Noite das Oliveiras).

«Já sobre o afastamento da paisagens algarvias que todos os Agostos vêm recebendo o diz-se-que-diz-se das políticas, limita-se a afirmar que tais ambientes "não ligam muito" com o seu temperamento.»

Acho, portanto, que o teste da pluralização até acaba por ir ao encontro da classificação dos nomes dos meses como substantivos comuns.

 

N. E. (03/06/2020) – Foi alterado o título.

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