As observações que faz são pertinentes, porque me parecem indicar que entre os termos em causa há um certo grau de sobreposição conceptual. Concordo que o vocábulo caracol pode ser encarado como polissémico, mas há que reparar que os dicionários não são unânimes quanto à clara distinção de casos de polissemia em relação a casos de homonímia. Verificamos que o Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea, da Academia das Ciências, separa em artigos diferentes rato (animal), rato (dispositivo informático) e rato (cor, em «cinza-rato»), enquanto o Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa os junta no mesmo artigo. Desta situação é lícito concluir que o dicionário da Academia vê homonímia onde o dicionário Houaiss considera haver polissemia. Por outro lado, há sempre uma possibilidade de distinguir polissemia de homonímia, que é a de seguir um critério etimológico (também discutível): canto (voz) e canto (da sala) são homónimos, porque têm origens diferentes; rato (animal) e rato (dispositivo) são casos de polissemia, porque o segundo resulta da transposição metafórica da palavra rato (animal). Eu diria que «polissemia», «extensão semântica» e «empréstimo interno» são termos da TLEBS que se usam em função de diferentes perspectivas: 1. Polissemia é um termo genérico que se aplica no plano sincrónico (isto é, numa fase do funcionamento do sistema linguístico) a uma propriedade das unidades lexicais e morfológicas – a de um significante ter mais de um significado. Sendo assim, operação (cirúrgica, financeira), janela (em casa, no monitor do computador) e rato são casos de polissemia. 2. No plano da inovação e mudança linguísticas (plano diacrónico, porque encaramos as palavras no tempo), temos: 2.1. Extensão semântica 2.2. Empréstimo interno Como sugere o documento TLEBS: alterações, destaques, propostas (pág. 47), estes dois termos são muito próximos. Na verdade, acho que são praticamente idênticos, uma vez que ambos podem descrever a utilização metafórica de um termo: uso rato em duas acepções, porque há um dispositivo que eu comparo ou identifico com um animal; uso janela também em duas acepções, porque há um efeito no monitor que se pode comparar à janela de uma casa ou de um veículo. Se, nestes casos, há um mesmo processo de transposição metafórica, então poderia não compreender por que razão há-de haver dois termos. Contudo, apesar destes aspectos, temos a possibilidade de fazer uma destrinça entre «extensão semântica» e «empréstimo interno», só que, penso mais uma vez, na base de diferentes perspectivas de análise: «extensão semântica» aplica-se à evolução da estrutura semântica interna de uma dada unidade; «empréstimo interno», à evolução das relações entre unidades lexicais. Por outras palavras, quando digo que rato é, além de um animal, um dispositivo, porque houve um fenómeno de transposição metafórica, recorro ao termo «extensão semântica»; quando descrevo a passagem de uma palavra de um registo linguístico para outro, com a correspondente «extensão semântica», até fazer parte de outro campo semântico (o do campo da informática constituído por rato, monitor, teclado, etc), então falo de «empréstimo interno». Nenhum destes contrastes está explícito na TLEBS, talvez porque não se tenha sentido a sua necessidade. O que expus é, pois, uma visão pessoal, mas é natural que surjam novos esclarecimentos no decurso da aplicação da TLEBS no terreno didáctico-pedagógico.