Aberturas - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
 
Início Aberturas
Por Ciberdúvidas da Língua Portuguesa

1. Em declarações ao jornal L'Osservatore Romano, sobre a guerra na Ucrânia, o treinador português José Mourinho foi certeiro ao classificar o conflito como um «fracasso humano». Com efeito, é esta uma expressão adequada e correta, não só por refletir uma profunda desilusão com a desumanidade dos acontecimentos trágicos noticiados, mas também por não cair na armadilha de confundir humano com humanitário, conforme assinala José Mário Costa, cofundador do Ciberdúvidas, num apontamento disponível em O Nosso Idioma.

2. «Nunca, como com a covid-19, o mundo moderno enfrentou uma crise de saúde pública tão vertiginosa.» A afirmação é do médico norte-americano Michael Williams, que, perante as rápidas mutações do novo coronavírus, as correspondentes orientações sanitárias só poderiam acompanhar o mesmo ritmo. Fala-se, portanto, de um processo muito semelhante ao de «um furacão», metáfora que assim se junta ao repertório lexical e fraseológico da rubrica A covid-19 na língua.

3. O que significa ao certo a expressão «assinar de cruz»? A resposta encontra-se no Consultório, com outras cinco, a respeito dos seguintes tópicos: a diferença entre tanto e tão; a sintaxe do verbo abdicar, do quantificador todos e do nome contradição; e a boa formação do nome ocasionamento.

4. Na rubrica Ensino, inclui-se um artigo de opinião da professora Lúcia Vaz Pedro, saído no Público em 4 de abril de 2022, contestando um outro artigo do mesmo jornal, em 31 de março de 2022, da autoria de Ana Stilwell e Isabel Stilwell, no qual se sustenta que os professores não deviam mandar calar os alunos, sendo a boa educação atribuição das escolas – mais precisamente "à [sua] cultura de empresa". Sobre o verbo calar e outras palavras, leiam-se também as respostas  "Calar e calar-se", "Podem calar-se e podem-se calar" e "Interjeições para impor silêncio".

5. Voltando a O Nosso Idioma, transcrevem-se aqui dois textos, com a devida vénia: a crónica que Miguel Esteves Cardoso (Público, 05/04/2022) dedicou a expressões que, acerca de um certo tema (por exemplo, a restauração), só ocorrem na oralidade; e o artigo de opinião da linguista Margarita Correia a propósito da disponibilização do relatório O português e o espanhol na ciência: notas para um conhecimento diverso e acessível, visando estratégias para enfrentar a anglofonização da comunicação científica.

Relativamente à investigação e à vida académica dos paises de língua portuguesa, refira-se igualmente  a entrevista que Maria de Lurdes Rodrigues, reitora do Iscte-Instituio Universitário de Lisboa, concedeu ao Diário de Notícias (6 de abril de 2022), a respeito da renovação do seu mandato e dos projetos que assinalam o 50.º aniversário da referida instituição de ensino superior.

5. Renhida está a campanha para as eleições presidenciais em França, com a 1.ª volta aprazada para 10 de abril de 2022, com as sondagens a preverem pouca margem entre os candidatos presumivelmente mais bem posicionados, o atual presidente Emmanuel Macron e a líder da Frente Nacional, Marine Le Pen. Sobre a França e o francês, donde o português retirou tantos empréstimos, consultem-se os seguintes artigos e respostas: "Sobre os empréstimos", "Dez bolos e doces com nome francês", "À volta da cassete e dos empréstimos" e "A língua francesa e a língua portuguesa". À volta do comportamento francês em matéria de política de língua, leiam-se: "França defende a sua língua", "Introdução de pronome não-binário em dicionário francês agita linguistas em França" e "Quando os nomes próprios se transformam em armas políticas".

6. Entre notícias provenientes de áreas do ensino e da promoção da língua portuguesa, registe-se, em Portugal,  depois da sua suspensão em 2019/2020 e 2020/2021, o regresso dos exames do 9.º ano de escolaridade, os quais, no entanto, passam a não conter perguntas de opção e, apesar de ter uma nota atribuída, não contam para a nota final. Cabe ainda mencionar a construção de uma rede de centros "Ler+ Qualifica" no âmbito do Plano Nacional de Leitura para atingir públicos que já não frequentam escolas básicas ou secundárias.

7. A data de 8 de abril de 2022 é a da tomada de posse do cantor e compositor Gilberto Gil como membro da Academia Brasileira de Letras. O artista brasileiro «veste o fardão» em cerimónia que pode ser seguida no canal Youtube da referida instituição. Sobre o significado cultural do acontecimento, sugere-se a leitura do texto assinado neste dia pelo escritor Alfredo Attié no jornal Público.

8. Uma chamada de atenção para três dos programas dedicados a temas da língua na rádio pública de Portugal:

– O programa Língua de Todos, transmitido pela RDP África, na sexta-feira, 8 de abril, às 13h20 (repetido no dia seguinte, pouco depois do noticiário das 09h00*), dá destaque ao curso de iniciação ao Português Académico que se realizou de 17 de janeiro a 14 de março de 2022, no Iscte-Instituto Universitário de Lisboa.

– Em Páginas de Português, na Antena 2 (domingo, 10 de abril, às 12h30; repetido no sábado seguinte,16 de abril, às 15h30*),três temas: a atual autonomização e assunção dos crioulos de base portuguesa como línguas de pleno direito, com estatura cultural e político; o português popular; e o falecimento da escritora brasileira Lygia Fagundes Telles (1919-2022).

– O programa Palavras Cruzadas,  realizado por Dalila Carvalho e transmitido pela Antena 2 de segunda a sexta, às 09h50 e às 18h50*.

* Hora oficial de Portugal continental

9. Durante a semana da Páscoa – a Semana Santa do calendário litúrgico cristão –, a atividade do Ciberdúvidas tem uma curta pausa. A próxima atualização fica marcada para o dia 19 de abril de 2022, deixando-se esta última sugestão: a (re)leitura do texto  "A etimologia e o significado de Páscoa".

Por Ciberdúvidas da Língua Portuguesa

1. O conflito entre a Rússia e a Ucrânia choca de forma cada vez mais intensa o mundo, que olha incrédulo para as imagens das atrocidades cometidas. Esta guerra tem, desde o seu início, desencadeado ações concertadas um pouco por todo o mundo, que visam forçar o fim da invasão levada a cabo pelo exército russo. Muitas delas têm passado por sanções à Rússia e a alguns dos seus poderosos oligarcas. Em reação às medidas restritivas promovidas pela União Europeia e pelos Estados Unidos, a Rússia passou a exigir aos países aos quais fornece gás  o pagamento do serviço em rublos, a partir de contas bancárias abertas no país, uma medida que visa conter o descalabro das finanças russas já muito ameaçadas pelas sanções financeiras que impedem o acesso do país ao mercado de capitais da UE e a proibição de realização de transações com o Banco Central da Rússia. Esta decisão gerou um neologismo, a palavra rublegas, que resulta da  junção de ruble(s), rublo em inglês, com a palavra gas, gás também em inglês. Este termo vem juntar-se a outros que nasceram também em contexto económico como petroyuan, para designar o dinheiro (associação de yuan, em chinês, com uma forma truncada de petrol) ganho com o petróleo ou ainda a palavra rupia-rublo para referir as transações entre a Rússia e a Índia.  

2. É ainda a guerra entre a Rússia e a Ucrânia que motiva a crónica da professora Carla Marques, desta feita dedicada à palavra negociações, um apontamento onde se explora a origem da palavra e os seus significados no plano económico, para se avançar para sentidos mais atuais relacionados com a comunicação (crónica divulgada no programa Páginas de Português, da Antena 2). Ainda no contexto do conflito armado em curso, partilhamos o apontamento do professor universitário e tradutor Marco Neves, dedicado a alguns aspetos da língua ucraniana (aqui transcrito com a devida vénia). 

3. Em A covid-19 na língua, registamos a entrada da expressão «testosterona vs. covid-19», criada na sequência de investigações médicas que vêm associar o tamanho dos dedos à gravidade da doença por covid-19.  

4. Ao Consultório chegaram esta semana várias dúvidas relacionadas com o significado de expressões como «por quem sois», «não fazer (a coisa) por menos», «à fé de quem sou» e «na/pela certa». Completam a atualização uma resposta sobre a correção de golo/gole e uma outra sobre a modalidade apreciativa

5. A questão da criação de uma linguagem neutra tem desencadeado muitas reações e tem feito correr muita tinta. Desta feita, é a vez de a linguista e gramática brasileira Maria Helena Moura Neves vir esclarecer a sua posição relativamente a este tema controverso.  De acordo com a sua visão, a expressão «linguagem neutra» não é adequada para a situação que se refere. A professora propõe, em alternativa, o uso de «linguagem/língua inclusiva» (artigo publicado na Folha de S. Paulo, aqui transcrito com a devida vénia). 

6. A professora brasileira Edleise Mendes reflete, na sua crónica, sobre o futuro da língua portuguesa, questionando em particular a subjugação do ensino do português nos PALOP à norma europeia (apresentada no programa Páginas de Português, da Antena 2, e aqui transcrita).

7. Entre os eventos de interesse, destacamos:

— A oficina «Onde para a vírgula», promovida pelo Laboratório de Competências Transversais (LCT – Iscte-Instituto Universitário de Lisboa), no âmbito dos 25 anos do Ciberdúvidas, e ministrada pela professora Lúcia Vaz Pedro (mais informações aqui).

— O EMDA 8 (Encontros Mensais sobre Discurso Académico), com a investigadora Nathalia Peixoto, que apresentará o tema «Análise discursiva sobre a reforma do ensino médio em notícias digitais: informação para desinformação?» (dia 6 de abril, entre as 18h e as 19h30, encontro via zoom e com emissão em direto no canal YouTube). 

8. Faleceu a escritora brasileira Lygia Fagundes Telles, aos 98 anos. Vencedora do Prémio Camões, em 2005, foi considerada uma das maiores romancistas e contistas da literatura brasileira. Foi um dos expoentes do movimento pós-modernista, deixando obras como Ciranda de Pedra (1954), Conspiração de nuvens (2007) e Um coração ardente (2012), entre muitas outras. 

 

 

Por Ciberdúvidas da Língua Portuguesa

1. A atualidade da covid-19 passa a segundo plano, com as notícias a centrarem-se na Ucrânia. Se as perspetivas são sombrias, não menos angustiantes serão a tensão política entre a China e Taiwan ou a guerra na Síria, no Iémen e na Somália. Completando o triste panorama, chegam ecos do colapso do Afeganistão, cuja situação «é um pesadelo», no dizer de Martin Griffiths, subsecretário geral para os Assuntos Humanitários e Coordenador da Ajuda de Emergência, e o ex-primeiro-ministro inglês, Gordon Brown, num artigo de opinião saído na ONU News de 31/03/2022. No glossário O Afeganistão de A a Z, dá-se conta deste alerta, segundo o qual «as escolas, as clínicas e os hospitais em todo o país deixaram de funcionar e a residual ajuda humanitária não consegue inverter a miséria e a fome da larga maioria dos afegãos.»

* Pesadelo é palavra derivada do radical de pesado pela adjunção do sufixo -elo, que, um tanto paradoxalmente, tem valor diminutivo. O vocábulo atesta-se já em Gil Vicente, no começo do século XVI, para designar um sonho mau, aflitivo, ou, figurativamente, uma pessoa ou alguma coisa que causam incómodo,  angústia ou até terror (ver Dicionário Houaiss e Infopédia).

2. Sobre a guerra na Ucrânia, assinale-se o número impressionante de refugiados em território da União Europeia, designadamente, na Polónia, na Eslováquia, na Roménia e também na Hungria, onde se realizam eleições no domingo, 3 de abril. As sondagens dão vantagem ao partido Fidesz e, portanto, ao atual primeiro-ministro Viktor Orbán, cuja atuação política é conhecida pela ideia controversa de «democracia iliberal». Mais recentemente, quanto à solidariedade com a Ucrânia, Orbán distanciou-se dos seus parceiros do Grupo de Visegrád, constituído pela Polónia, Chéquia, Eslováquia e a própria Hungria. Lembre-se, a propósito, que, em alternativa a húngaro, os dicionários também registam magiar, menos corrente, como forma portuguesa de magyar (soa "módior"), a palavra húngara deste nome pátrio. Húngaro, tem, portanto, origem numa palavra estrangeira ao húngaro (exónimo), enquanto magiar se relaciona com a palavra surgida no interior das comunidades de expressão húngara (endónimo). Acresce que Hungria se diz Magyarország («país dos magiares») na língua húngara, que tem uma estrutura bastante diferente das de outros idiomas mais próximos do português (ver aquiaqui , aqui e aqui), pois é uma língua urálica, isto é, pertence a uma família linguística não indo-europeia, como acontece com o turco, o finlandês, o estónio e o basco. Observe-se, mesmo assim, que as relações culturais da Hungria com o mundo de língua portuguesa estão bem firmadas e têm longa tradição (cf. Camões – Instituto da Cooperação e da Língua).

No arquivo do Ciberdúvidas, faz-se referência à língua húngara em "Viagem ao extraordinário mundo das línguas" e "Húngaro-Valáquia". Na imagem, pormenor de "A Chegada dos Húngaros" (Panorama Feszty), no qual se retrata o chefe guerreiro magiar Árpád (pintura de Árpád Feszty, 1894, Museu de Ópusztászer, Hungria).

3. A questão ucraniana motiva, no Pelourinho, um apontamento da professora Carla Marques, a propósito de «ajuda letal», um modismo com circulação mediática.

4. Ainda à volta da Ucrânia, quem estude as principais línguas aí faladas, o ucraniano e o russo, verá que o funcionamento dos verbos diverge bastante do que se observa em português ou noutra língua românica. Na rubrica Diversidades, um apontamento de Inês Gama dá conta de como a categoria de aspeto está na base desse contraste.

5. Os conectores «por um lado» e «por outro (lado)» constituem um dos tópicos abordados na presente atualização do Consultório. São ao todo seis novas respostas, igualmente acerca de um predicativo do sujeito introduzido por preposição, dos usos da palavra fogo, do termo maternagem, de um possível derivado de gíria e da palavra latina qua.

6. No Reino Unido, é importante a presença das comunidades de língua portuguesa. Para incentivar o estudo autónomo do idioma, a Coordenação do Ensino Português no Reino Unido e nas Ilhas do Canal (Instituto Camões) disponibiliza Materiais Didáticos Português – Língua de Herança e Português Língua Estrangeira, publicação digital apresentada na Montra de Livros.

7. Em O Nosso idioma, transcrevem-se com a devida vénia dois conteúdos: um texto do divulgador de temas linguísticos Marco Neves, que se refere à história dos plurais correspondentes a avô e avó; e uma entrevista a Ana Raquel Matias, investigadora do CIES-Iscte, incluída no n.º 3 da revista digital Entrecampus do Iscte-Instituto Universitário de Lisboa, a respeito do projeto Trovoada de ideias, que visa combater o preconceito linguístico dirigido a falantes africanos da língua portuguesa.

8. Relativamente a três dos programas dedicados ao português na rádio pública de Portugal:

♦ No Língua de Todos (RDP África, sexta-feira, 01/04/2022, às 13h20), apresenta-se o Caderno de Práticas Teatrais para a Aprendizagem da Língua, uma publicação com o patrocínio da Fundação Calouste Gulbenkian.

♦ No Páginas de Português (Antena 2, domingo, 03/04/2022, 12h30*), comenta-se o impacto do PISA (Programa Internacional de Avaliação de Alunos) na educação em Portugal.

♦ Quanto a Palavras Cruzadas, programa realizado por Dalila Carvalho e transmitido na Antena 2 (segunda a sexta, às 09h50* e às 18h50*),  a «gramática do paladar» é tema de conversa com o gastrónomo e cronista Virgílio Nogueiro Gomes nas emissões de 4 a 8 de abril.

* Hora oficial de Portugal continental.

Por Ciberdúvidas da Língua Portuguesa

1. A atualidade mediática convoca a cada momento determinadas palavras que, não sendo do domínio do uso comum, exigem uma explicação cabal. Uma dessas palavras veio associada ao infeliz acontecimento que marcou a 94.ª cerimónia da Academia de cinema de Hollywood de atribuição dos óscares (e não "oscars", como se continua a encontrar nalgumas páginas da comunicação social), o qual se terá ficado a dever à referência do apresentador Chris Rock à alopecia de Jada Pinkett, a mulher do ator Will Smith, vencedor. O nome alopecia deriva do grego alōpekía, que passou para o latim como alopecĭa. Refere a doença que se caracteriza pela queda, total ou parcial, de cabelo ou dos pelos. Outro termo que se encontra na ordem do dia, mas ainda sem registo dicionarístico em português,  é o  nome colapsologia, um neologismo usado para referir o estudo dos riscos de colapso civilizacional devido às alterações climáticas, às extinções e aos desastres naturais. Este termo resulta da junção do radical colaps-, que significa «decadência, degradação», ao radical -logia, que significa «estudo, teoria» e nalguns contextos designa tanto um conjunto de estudos desenvolvidos transdisciplinarmente como um movimento, que nasceu em França e que vai reunindo seguidores um pouco por todo o mundo.  

2. «Poder e lucro traíram a recuperação da pandemia», refere a Amnistia Internacional  no seu relatório respeitante ao ano de 2021. Em que medida e em que áreas é o que condensa a nova entrada Desigualdade global, em A covid-19 na língua.

3. Ao Consultório chega um caso de dequeísmo, fenómeno que se caracteriza pela utilização excessiva da preposição de em contextos em que ela não é necessária. A este esclarecimento juntam-se outros cinco relacionados com a toponímia ucraniana, o significado do verbo tisicar, os usos do verbo derivar, a classificação do vocativo como deítico pessoal e, ainda uma resposta sobre a noção de rima.

4. Na rubrica Diversidades fica o texto O que é ucraniano? — uma tradução de um texto publicado em inglês na plataforma do projeto Ukraïner em 24 de novembro de 2021.

5. A modalidade escrita da língua revela realidades, saberes, proveniências, um conjunto de aspetos que dão matéria para um apontamento sobre a língua e suas "delícias" da autoria do escritor e cronista Miguel Esteves Cardoso (aqui transcrito com a devida vénia). 

6. Entre os eventos de interesse para a língua, divulgamos o ciclo de seminários políticas e práticas linguísticas e de literacia, dedicado ao tema "Língua Portuguesa: entre língua internacional e língua migrante na América do Norte", um evento híbrido com lugar no dia 8 de abril, entre as 14h00 e as 17h00, no ISCTE-IUL (sessão zoom e ISCTE, Sala B2.01).

 

 

Por Ciberdúvidas da Língua Portuguesa

1. A guerra na Ucrânia não para, mas a covid-19 também não e continua a ser notícia. Sobre a evolução da pandemia, a rubrica A covid-19 na língua recebe três novas entradas: «montanha russa», imagem usada pelo epidemiologista Manuel Carmo Gomes para a explicação do recrudescimento de infeções em Portugal no fim de março de 2020, associada à prevalência da sublinhagem BA2 da variante ómicron do SARS-CoV-2; «covid estabilizada», outra expressão empregada pelo referido especialista para sugerir um novo e mais ágil modelo da revelação dos casos de covid-19; e Afeganistão, onde o combate à covid-19 foi praticamente paralisado, após o regresso ao poder dos talibãs, em 15 de agosto de 2021, e a suspensão da vacinação.

2. Ainda à volta da vida afegã, a rubrica "O Afeganistão de A a Z" inclui como nova entrada o próprio nome do país, que Adiq Rahimi, escritor e cineasta afegão, descreve como uma «nação impossível». A presente atualização inclui ainda Escolas, em referência à medida tomada pelo governo afegão, vedando o ensino formal às jovens entre os 12 e os 19, para evitar «quaisquer contactos com rapazes e sejam educadas conforma a interpretação talibã da lei islâmica».

3. Uma dúvida sobre um verso do conhecido soneto camoniano "Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades" evidencia a ambiguidade da linguagem poética, mesmo na sintaxe. A questão faz parte da atualização do Consultório, que abrange ainda seis outros tópicos: o encontro do ponto de exclamação com reticências; o uso do pretérito perfeito composto do indicativo em orações condicionais; o significado da expressão «meio de locomoção»; a noção de «consoante dupla»; a transliteração do árabe; e o contraste entre espanhol e português quanto aos pronomes recíprocos.

4. Na Montra de Livros, apresenta-se Português Ativo – Para o Mundo Profissional (Lidel), um manual destinado a estudantes de português como língua não materna (PLNM) para fins profissionais e práticos.

5. Em Portugal, realizou-se mais uma vez o Festival da Canção, e a vencedora, representante de Portugal no Festival Eurovisão da Canção (de 10 a 14 de maio de 2022), canta uma letra bilingue, anglo-portuguesa. No Pelourinho, o caso merece uma reflexão crítica de Jéssica Mendes, que dá conta do que tem sido a concorrência entre o inglês e as línguas nacionais ao longo dos mais de 60 anos desse certame musical.

6. Fala-se da Ucrânia, mas que se sabe sobre a língua ucraniana e o seu conflito com o russo? Na rubrica Diversidades, divulgam-se em tradução (parte I e parte II) os apontamentos que a plataforma Ukraïner publicou em 24 de novembro de 2021 a respeito das origens do ucraniano e da sua elaboração como idioma literário, científico e da administração.

7. Em 27 de março, comemora-se o Dia Mundial do Teatro, como sempre, assinalado com espetáculos e cerimónias, numa multiplicidade que se justifica face aos danos causados pela pandemia à afluência de público. Sobre o mundo do teatro, releiam-se artigos e respostas que, sobre o tema, se guardam no arquivo do Ciberdúvidas: "Teatro", "Teatro português", "Aderecista, caracterizador e maquilhador, profissionais da máscara (teatro)",  "Fosso (de orquestra)", "A origem da palavra coxia", "O significado de estásimo e de párodo (teatro)", "Levar à cena", "O conceito de dramaturgia" e "Performatividade + representar/representação + dramaturgia".

8. Dos programas que a rádio pública de Portugal dedica a temas da língua, salientam-se:

♦  Língua de Todos, (RDP África), que, na sexta-feira, 25/03/2022, às 13h20, conta com a participação do linguista angolano Márcio Undolo, autor de um estudo intitulado A Norma do Português em Angola – Subsídios para o seu Estudo.

♦  Páginas de Português, na Antena 2 (domingo, 27 de março, às 12h30*), onde se convida o professor João Pedro Aido, vice-presidente da Associação de Professores de Português, para falar sobre a leitura da épica camoniana nas escolas, ainda a propósito da comemoração dos 450 anos da publicação de Os Lusíadas. Na emissão intervém igualmente a linguista Edleise Mendes, com uma crónica acerca dos jovens investigadores linguistas dos países africanos de língua portuguesa.

Palavras Cruzadas, um programa diário da Antena 2, segunda a sexta, às 09h50* e às 18h50*, com realização de Dalila Carvalho.

* Hora oficial de Portugal continental.

Por Ciberdúvidas da Língua Portuguesa

1.  A guerra entre a Rússia e a Ucrânia está perto de perfazer um mês. Entre ofensivas, negociações, destruição e vítimas, ensaiam-se formas mais agressivas de ataque, como o recurso a mísseis hipersónicos, que a Rússia afirma ter usado para destruir, em terreno ucraniano, um armazém subterrâneo com armas e munições. Este míssil, designado Kinzhal pelos russos, é considerado hipersónico devido à velocidade que pode atingir (cinco vezes superior à velocidade do som). Acresce que estes mísseis são também mais difíceis de rastrear, pois, para além da velocidade que atingem, têm também a possibilidade de voar a baixas altitudes. Registe-se aqui que a palavra hipersónico é um composto que resulta da junção do prefixo hiper- à forma sónico. Esta palavra deverá grafar-se sem hífen, pois com hiper-, recorde-se, só haverá lugar a hífen se o segundo termo do composto começar por h- ou por r-. 

O Ciberdúvidas tem, no seu acervo, diversos textos relacionados com usos de hiper-, que aqui recordamos: «A grafia com o prefixo hiper-», «O superlativo hipersensível», «O (in)congruente plural de híper», «Hipersexuado», «Sobre hiperligação, hipertexto e "sitegrafia"». 

2. A guerra em curso recorda-nos também, a cada momento, os seus refugiados, sobretudo mulheres e crianças que fogem do seu país numa tentativa de salvar a vida, deixando para trás bens e toda uma existência. No plano linguístico, este facto convoca a diferença entre os conceitos de migrante e de refugiado, assunto que dá matéria ao apontamento da professora Carla Marques em O Nosso Idioma.

3. Apesar de a comunicação social centrar toda a sua atenção no conflito da Ucrânia, o que é certo é que neste mesmo país ainda se vive o problema da covid-19. A Ucrânia é dos países europeus com menos pessoas vacinadas e continua a registar números muito altos de infeções e de mortes. Este facto motiva a entrada do termo Ucrânia para a rubrica A covid-19 na língua, termo ao qual se juntam ainda as novas  entradas Covifenz, glicoproteínas e Nuvaxovid

4.  No Consultório, sugere-se e justifica-se uma diferença de grafia entre afro-americano e afroamericano, explicitando os sentidos que se poderão associar a cada palavra. Noutra resposta, aborda-se, mais uma vez, a questão da identificação da natureza do pronome clítico se. Para além destas respostas, a nova atualização aborda ainda topónimos da Ucrânia, a grafia do termo «forma sonata»verbos derivados de prazer, a presença do pleonasmo em «pequeno pormenor» e a classificação da palavra que em «o silêncio assume a mesma importância que pode ter a música».

5.  Acompanhando os múltiplos eventos que têm lugar para celebrar o centenário do nascimento de José Saramago, o Museu da Língua Portuguesa, situado em São Paulo, dedica o mês de março à Jornada Saramago, propondo leituras e reflexões em torno das obras do autor. No dia 24 de março, a escritora brasileira Andréa del Fuego dinamizará uma sessão de leitura acompanhada da obra O Evangelho segundo Jesus Cristo, um evento que poderá ser acompanhado no Facebook e no canal do YouTube do Museu, a partir das 19h.

6. Assinalou-se a 21 de março o Dia Mundial da Poesia. Um pouco por todo o lado, celebrou-se poder da palavra e a sua importância como veículo de cultura e meio de comunicação e reflexão sobre os mundos interior e exterior. Também neste espaço deixamos a nossa homenagem à língua e ao labor da língua, capaz de trazer à tona as suas formas mais belas. Fazemo-lo partilhando, com a devida vénia, um poema inédito do poeta e teólogo José Tolentino de Mendonça (divulgado no jornal Público):

As palavras são legíveis numa face, ilegíveis noutra 
nenhuma das nossas frases sozinha quer dizer alguma coisa
o aparecer do mundo não se dá na transmissão de um significado
que se altera mas no movimento desapropriador, na passagem
outras espécies ouvem outros sons, veem outras cores
semeiam com a semente uma chama
um nome ilimitado exposto ao risco da perda
e aos seus arranjos recíprocos
onde a mais alta força se combina com a fragilidade extrema
e essa é a língua matinal do pensamento
nós porém iludidos cremos ainda na redução
como se fosse a redução toda a ciência possível
Não se trata de saber o que é
cheio de passado para colorir o presente
o destino revela-se surpreendente ainda
devemos antes interrogar a inocência
a sua mão de dedos mutilados sobre a parede:
será uma folha intacta menos folha do que uma folha devorada?
não haverá outras hipóteses para o fotograma das formas
e mil modos inéditos de amotinar a vida?
se fizéssemos um registo integral, camada a camada,
se parássemos a escutar uma única e solitária voz humana
no seu esplendor secreto, na sua incandescência, no seu dilúvio mais recuado
recomeçaríamos a história do mundo
Só o ato de se desnudar cumpre a mutação
pois crê no prodígio
e procura-o

Ocasião também para recordar o poeta Gastão Cruz, recentemente falecido (1941-2022). Autor de inúmeras obras poéticas e tradutor de autores como Blake ou Shakespeare, dedicou a vida à literatura e à cultura, tendo sido agraciado com diversos prémios, como o Grande Prémio de Poesia Maria Amália Vaz de Carvalho

Por Ciberdúvidas da Língua Portuguesa

1. A respeito da guerra na Ucrânia, fala-se nas sanções financeiras e económicas de vários países – dos Estados Unidos ao Japão, passando pelos Estados da União Europeia – contra a Federação Russa. Palavra recorrente nestes dias é, por exemplo, o anglicismo default (no contexto financeiro, o mesmo que «incumprimento de pagamento»[*]), como ilustram dois títulos da comunicação social em Portugal: "Rússia pode entrar em default nas próximas semanas" (ECO, 15/03/2022); "Rússia tenta evitar default e dá ordem para pagar juros da dívida em dólares" (Observador, 16/03/2022). É curioso ver como no corpo das notícias assim intituladas ocorre depois o termo português equivalente: incumprimento (cf. Linguee). Do ponto editorial e gráfico, as sete letras da palavra inglesa terão vantagem sobre as treze do vocábulo português; mas convém lembrar que incumprimento é palavra bem conhecida em Portugal, quando se tornou frequente como forma de designar a situação de dívida pública que em abril de 2011 levou a um pedido de ajuda ao Fundo Monetário Internacional. Sobre a grafia e pronúncia de incumprimento, releia-se o que se escreveu há uma década no Pelourinho.

[* N.E. (22/03/2022) – No Brasil, é corrente o termo inadimplência.]

2. À guerra, junta-se a pandemia, afinal ainda presente na atualidade, com a China a enfrentar recordes nos casos de infeção e a aplicar novas restrições, como o confinamento de 37 milhões de pessoas, três anos depois de o SARS-CoV-2 ter sido detetado no país no final de 2019, em Wuhan. Em Portugal, prolonga-se até 30 de março de 2022 a situação de alerta, o nível mais baixo dos três estados previstos na Lei de Bases da Proteção Civil. A rubrica A Covid-19 na língua dá conta destas situações com duas novas entradas: alerta e «confinados na China».

 3. Diz-se «intimo alguma coisa a alguém» ou «intimo alguém a alguma coisa»? No Consultório, esclarece-se esta dúvida e outras cinco: o que é uma preposição acidental? A enumeração, como recurso estilístico, também pode envolver orações? É possível empregar bicamarário como sinónimo de bicameral? Qual é o valor aspetual de uma frase como «venho acompanhando esta obra desde os seus primórdios»? Finalmente, volta-se a comentar um caso mais complicado do uso das preposições quando introduzem orações de infinitivo.

4. Em O Nosso Idioma, transcreve-se com a devida vénia a crónica que o jornalista Nuno Pacheco, no Público de 17 março de 2022, dedicou ao mais recente livro do linguista e escritor Fernando VenâncioO Português à Descoberta do Brasileiro (Guerra e Paz, 2022). Na mesma rubrica, um apontamento de Sara Mourato comenta a aplicação referencial da palavra grupo.

5. Registos da atualidade:

–  Em Timor-Leste, realizam-se em 20 de março 2022 as eleições presidenciais, que contam, segundo as notícias, com os maiores números de sempre, tanto de eleitores como de candidatos (ler aqui).

Relativamente à situação linguística de Timor-Leste, consultem-se os seguintes artigos: "A língua portuguesa em Timor-Leste", "Língua portuguesa e Timor Leste", "O português de Timor-Leste: uma verdadeira língua nacional?", "Timor-Leste, tétum, português, língua indonésia ou inglês?" e "Timor e a língua portuguesa".

– A visita oficial de Marcelo Rebelo de Sousa, presidente da República Portuguesa, a Moçambique, de 17 a 20 de março de 2022 (ler aqui).

Moçambique é um país multilingue, realidade que tem sido objeto de notícia e reflexão em textos em arquivo no Ciberdúvidas: "Dialetos de Moçambique", "Sobre o português de Moçambique", "A vitalidade do português de Moçambique" e "Dicionário do Português de Moçambique (DiPoMo)".

6. Entre os programas da rádio pública de Portugal sobre temas da língua portuguesa, relevo para:

Língua de Todos (RDP África, na sexta-feira, 18 de março, às 13h20*), com a participação da professora e divulgadora de temas gramaticais Sandra Duarte Tavares, que aborda a expressão «comunicação assertiva», a diferença entre as palavras positividade e positivismo e o neologismo agnotologia.

Páginas de Português (Antena 2, domingo, 20 de março, às 12h30*), onde se conversa sobre a comemoração dos 450 anos da publicação de Os Lusíadas com José Carlos Seabra Pereira, professor associado da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra. A propósito do âmbito do conflito na Ucrânia, esta emissão inclui ainda a crónica da professora Carla Marques a respeito das palavras refugiado e migrante.

– O uso da língua nos tribunais é o tema que preenche as emissões de 21 a 25 de março do programa Palavras Cruzadas, realizado por Dalila Carvalho e transmitido na Antena 2 (segunda a sexta, às 09h50* e 18h50*).

* Hora oficial de Portugal continental.

Por Ciberdúvidas da Língua Portuguesa

1. O atual conflito na Ucrânia continua a fazer vítimas, a provocar saídas em massa do país e a deixar um rasto de destruição atrás de si. A situação vai exigindo que países não envolvidos tomem posição relativamente aos acontecimentos que se vão sucedendo, alguns dos quais poderão implicar crimes de guerra. A própria ameaça de uma intervenção nuclear não deixa ninguém indiferente face a consequências que poderão atingir toda a humanidade. Algumas organizações internacionais e certos países vão oscilando entre posições de neutralidade e de imparcialidade. Convém aqui recordar que estas palavras designam realidades distintas: a neutralidade é a qualidade daquele que não se declara nem a favor nem contra, não se associando a nenhuma posição; já a imparcialidade descreve a atitude daquele que age e/ou julga de forma justa, não favorecendo uma posição em detrimento de outra. A diferença entre os termos mostra que a realidade que se vive não pede neutralidade, mas antes imparcialidade na forma como se julgam os responsáveis pelo cenário de guerra patente na Ucrânia. Terá sido este o contexto que levou países como a Suíça ou a Suécia a reverem as suas históricas posições de neutralidade. É também a neutralidade, neste caso da Ucrânia, que a Rússia apresenta como uma das exigências para o cessar-fogo.

Primeira imagem: Êxodo II, de Lasar Segall, 1949 

2. Entretanto, outras guerras seguem o seu curso, um pouco esquecidas pela comunicação social, que assumiu a guerra entre a Ucrânia e a Rússia como tema principal (e muitas vezes, único). No Afeganistão, o conflito vai deixando rasto nos próprios habitantes, que enfrentam atualmente uma situação generalizada de desnutrição, como sintetiza a expressão «Afegãos famintos», a nova entrada de O Afeganistão de A a Z.

3. No Consultório, procura-se um verbo derivado do nome monólatra, numa relação de derivação semelhante a de idólatraidolatrar. Não se encontra, todavia, um registo que ateste o uso de uma forma como "monolatrar", apesar de poder constituir um verbo corretamente formado do ponto de vista morfológico. Para além desta resposta, a atualização trata ainda o uso da palavra géneros, os significados de educativo vs. educacional e de raiva, rancor e ressentimento. Propõe-se também uma tradução para o termo subjectivation (do francês) e uma reflexão sobre o uso correlativo de tempos do passado.

4. O uso pouco rigoroso dos termos informante e informador motiva um apontamento para a rubrica Pelourinho, da autoria de José Mário Costa, cofundador do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa, onde se chama a atenção para traduções pouco rigorosas. 

5.  A professora universitária Margarita Correia reflete, no seu artigo, sobre a importância de se conceder à educação o valor que ela merece, sobretudo no que respeita à formação de professores de português, que começam a escassear em consequência da desvalorização política e social da carreira (aqui transcrito com a devida vénia). 

6. As falsas teorias da conspiração chegam também ao estudo da língua quando se afirma que o português tem origem no grego antigo. Esta e outras ideias do campo do fantástico são desmistificadas pelo professor e tradutor Marco Neves no artigo que aqui se transcreve com a devida vénia.  

7. O almofariz é um objeto com um uso que se estende a diferentes civilizações ao longo de muitos séculos. É o que nos conta José Augusto Barroso, oficial de Justiça (aposentado), num texto de apresentação da exposição dedicada ao tema. 

8. O Brasil completa, a 7 de setembro de 2022, 200 anos da sua independência, uma data que se comemora e recorda ao longo do presente ano. Este é o mote de uma entrevista ao ministro dos Assuntos Exteriores do Brasil, Carlos França, no diário português Publico do dia 13//03/202, conduzida pela jornalista Isabel Lucas

Por Ciberdúvidas da Língua Portuguesa

1. A situação na Ucrânia abala a Europa e repercute-se noutras regiões do mundo, sempre numa escalada inquietante, não só militar mas também mediática. A atualidade noticiosa vista, ouvida ou lida oscila entre a informação e a propaganda, e mesmo as palavras, seja qual for a língua, se tornam pretexto para intensificar o conflito. Vocábulos como guerra e invasão, por exemplo, podem ser rejeitados – na perspetiva russa, trata-se de uma «operação militar especial» – ou rasurados, entre acusações de notícias falsas. Podem igualmente gerar equívocos, como foi o caso de notícias segundo as quais a ONU teria ordenado aos seus funcionários que os evitassem, instrução que, afinal, não se terá verificado e que foi posteriormente desmentida pela própria organização. Mas as imagens são de guerra, e, portanto, são recorrentes o léxico e a fraseologia de referência bélica nos noticiários e na opinião publicada. É este o mote para, em O Nosso Idioma, a professora Carla Marques dedicar um apontamento às marcas – palavras e provérbios – que este (triste) tema deixa também na língua portuguesa.

2. Diz-se «tomar da palavra» ou «tomar a palavra»? A segunda forma é a correta, de acordo com a explicação dada numa das novas respostas em linha no Consultório. São ao todo sete dúvidas, que abrangem as possibilidades combinatórias dos pronome átonos, a construção de uma réplica discordante, as orações condicionais com o verbo no indicativo, o significado da expressão «literatura de cordel», a origem da palavra blusa e o uso dos termos explicitude e implicitude.

3. Na rubrica Diversidades, transcrevem-se, com a devida vénia, dois textos de duas publicações digitais: do jornal Setenta e Quatro (10/03/2022), um ensaio do antropólogo Miguel Vale de Almeida, que critica a sobrevivência em Portugal das teses do chamado lusotropicalismo, propostas por Gilberto Freyre (1900-1987) e que foram especialmente úteis para a legitimaçáo do colonialismo português; do blogue Certas Palavras (14/10/2018), um apontamento do tradutor e divulgador de temas linguísticos Marco Neves, que dá a conhecer a relação do papiamento da ilha de Curaçau com outras línguas crioulas de base lexical portuguesa.

Na imagem, pormenor de biombo namban (Museu Nacional de Arte Antiga, Lisboa).

4. Registos de iniciativas diplomáticas ou académicas com interesse para quem é estudante e se move no âmbito da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP):

– A ratificação, em 7 de março p. p., do acordo de mobilidade da CPLP pelo Brasil, cujo ministro das Relações Exteriores brasileiro, Carlos Alberto França, em declarações à imprensa, colocou Portugal entre as parcerias prioritárias. 

– As formações em competências transversais (no mundo empresarial conhecidas pelo anglicismo soft skills) promovidas pela Academia Soft Skills do Instituto Superior e Contabilidade da Administração de Lisboa (ISCAL).

– O lançamento da segunda edição de um concurso de fotografia para arquitetos e estudantes, pelo Conselho Internacional dos Arquitectos de Língua Portuguesa (CIALP). "Ser Sustentável no Espaço Lusófono" é o tema deste concurso, cujo júri inclui arquitetos de Angola, Brasil, Macau, Moçambique e Portugal. Inscrições até 17 de março de 2022.

– O seminário "Políticas e práticas linguísticas e de literacia", que se realiza no Iscte-Instituto Universitário de Lisboa (auditório B1.03, Ferreira Almeida, Edifício II), em 15 de março de 2022, 15h00-17h30 (hora de Lisboa). Trata-se de um evento híbrido (presencial e em linha), em que se propõe um debate à volta das «formas de representação de diferentes autores de língua portuguesa e as suas variedades, e a ausência de autores negros na sociedade portuguesa, a começar pela escola» (ver também aqui).

5. Nos programas de rádio produzidos pela Associação Ciberdúvidas para a rádio pública portuguesa, são temas em destaque:

♦ Para falar de um projeto desenvolvido pela Universidade Autónoma de Lisboa (UAL) – a aplicação móvel Gogenius, para aprendizagem assistida do Português como Língua Segunda e como Língua Estrangeira – Sandra Figueiredo, professora da UAL, é a convidada de Língua de Todos, programa transmitido pela RDP África, na sexta-feira, 11 de março, às 13h20*.

♦ A respeito do Caderno de Práticas Teatrais para a Aprendizagem da Língua, um lançamento de 2022 com o patrocínio da Fundação Calouste Gulbenkian, participam as autoras deste livro, Sofia Cabrita, atriz e encenadora, e Isabel Galvão, professora de Português Língua Estrangeira do Centro Português para os Refugiados (CPR), em Páginas de Português, um programa da Antena 2 emitido no domingo, 13 de março, às 12h30*. Intervém ainda a professora Sandra Duarte Tavares, dando mais uma achega acerca da etimologia da palavra guerra.

* Hora oficial de Portugal continental.

Por Ciberdúvidas da Língua Portuguesa

1.conflito entre a Rússia e a Ucrânia continua a ocupar o primeiro plano do interesse mediático, trazendo ao mundo imagens chocantes que evocam outras, de má memória, e que ainda não perfizeram sequer um século. A União Europeia, em reação à agressão russa, vai impondo medidas restritivas contra a Rússia. Algumas delas visam especificamente figuras poderosas que mantêm ligações estreitas com o governo de Vlamidir Putin ou que até o financiam. São sanções, de diferentes naturezas e âmbitos, dirigidas a diferentes setores, entre os quais se destacam os oligarcas russos. Este termo, a par de oligarquia e oligárquico, é pouco frequente no léxico quotidiano português, pelo que merece uma análise etimológica e semântica, percurso que o coordenador executivo do Ciberdúvidas Carlos Rocha desenvolve neste seu apontamento. A esta nota vem juntar-se ainda o esclarecimento relativo à prolação do nome da capital ucraniana, que poderá ter três grafias: Quieve (forma portuguesa), Kiev (forma russa) e Kyiv (forma ucraniana) (ver aqui). 

O decurso da guerra traz também palavras do léxico comum para primeiro plano, dando-lhes um sentido particular pelas referências à realidade que evoca. É o caso do verbo resistir, que descreve a atitude de muitos ucranianos que optam por ficar nas suas localidades, defendendo o solo pátrio, se necessário em troca da própria vida. Pela importância que a palavra assume, a professora Carla Marques dedicou-lhe a crónica apresentada no programa Páginas de Português, da Antena 2 (aqui transcrita).  

2.  A atenção mediática dedicada à covid-19 encontra-se em queda, e, no atual momento, vive-se a esperança de que seja possível avançar para um cenário de fim de pandemia. Dessa vontade encontramos registo na frase proferida pelo primeiro-ministro português António Costa: «À beira de nos podermos libertar, mas...», expressão à qual se junta a palavra covídeos, ambas novas entradas em A covid-19 na língua

3. No Consultório, divulgam-se as novas perguntas, que constituem a atualização: a diferença entre impressionante e impressivo; a ordem dos elementos que constituem os adjetivos pátrios compostos, os significados e a etimologia de roxina e de milgrada, a antítese na frase do conto "George", de Maria Judite de Carvalho, um caso de coesão por contiguidade e a classificação do verbo vir

4. O professor universitário e tradutor Marco Neves enceta uma viagem às línguas que se falariam em Portugal em tempos remotos, destacando o facto de o panorama linguístico dessas épocas ser dominantemente plurilingue (artigo transcrito com a devida vénia).

5. O Dia Internacional da Mulher é celebrado anualmente a 8 de março. Este é um dia que evoca a manifestação de 20 de fevereiro de 1909, em Nova Iorque, pelos direitos das mulheres e, em particular, pelo acesso ao voto, uma luta pelo direito à igualdade que, em muitos países, continua a ser necessária. O Ciberdúvidas tem divulgado muitos textos dedicados à questão das mulheres no plano linguístico. Recordamos, aqui, por exemplo, os que se relacionam com as profissões/atividades que ainda não apresentam forma feminina: «As mulheres e o nome das atividades que exercem», «A propósito do feminino de procurador-geral da República», «Sobre o uso da forma presidenta no Brasil e em Portugal», «O sexo das profissões», «O sexo e a língua», «Palavras à procura do feminino» e «As muitas faces (linguísticas) da mulher».

6. Os Encontros Mensais sobre o Discurso Académico (EMDA) contarão esta quarta-feira, dia 9 de março, entre as 18h e as 19h30, com a presença da investigadora da Universidade do Porto Mônica Inês de Castro Netto, que apresenta uma comunicação subordinada ao tema «Contributo dos marcadores discursivos para a textualização do gênero memorial» (evento de acesso livre, via plataforma Zoom ou Youtube).