DÚVIDAS

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O nosso idioma // O português no mundo

Dez palavras que Portugal deu aos ingleses

Alguns lusismos da língua inglesa

 

 

Sabemos todos quantas palavras andamos a roubar aos ingleses – mas hoje deu-me para virar o jogo ao contrário: então e que palavras demos nós à língua deles?

Ainda são umas quantas – embora, na verdade, não tenhamos exportado assim tantas nos últimos tempos. Seja como for, na época em que portugueses e ingleses andavam aos encontrões pelo mundo, o inglês lá nos veio buscar muitas palavras.

Não é nada de admirar: o inglês é língua sem grande pudor em engolir palavras de todas as línguas que encontra pelo caminho – e de lhes deixar em troca muitas mais, como sabemos.

Escolhi dez, só como exemplo…

1. Auto-da-fé

Sabemos que, nisto da (pouco) Santa Inquisição, os espanhóis ficaram com a primazia – não é em vão que se tem um Torquemada. Aliás, a definição no dicionário onde fui verificar esta palavra é clara: o auto-da-fé é a «queima de heréticos pela Inquisição espanhola».

No entanto, a palavra inglesa para designar esses lúgubres espectáculos de queima pública de condenados veio mesmo do português

Enfim, esta é uma palavra inglesa de origem portuguesa que nos pode embaraçar, o que nos leva a outra das palavras inglesas de origem ibérica…

2. Embarrass

Já sabemos que esta palavra nos embaraça muito em espanhol – onde uma mulher embaraçada até pode ficar muito feliz…

Os ingleses, por seu turno, vieram cá roubar a palavra e não lhe mudaram o significado.

O que talvez embarace algumas pessoas é admitir o seu…

3. Fetish

Quem diria?… O fetish inglês veio do fétiche francês – que por sua vez veio do feitiço português!

Curiosamente, o fétiche francês foi devolvido à proveniência portuguesa, com outro significado

Digamos que esta é uma palavra bem portuguesa que emigrou para a França e voltou com sotaque – e, entretanto, teve um filho que foi viver para Inglaterra… São bem vividas, as palavras!

4. Lingo

Esta é a palavra que os ingleses usam para designar uma língua ou dialecto estrangeiro: «I don’t speak the lingo.»

A frase acima terá um sabor parecido com a nossa frase «Não sei falar estrangeiro.»

Ora, lingo vem – com toda a probabilidade – da palavra lingoa, a forma como escrevíamos língua há uns séculos…

5. Marmalade

Pois oferecemos a palavra marmelada aos ingleses…

A nossa palavra é baseada no marmelo — e, como nestas coisas ninguém parece inventar nada, fomos buscar esse nome ao grego: melímelon (diz a Infopédia).

6. Mosquito

No fundo, é uma pequena mosca, um mosquito, e assim ficou em português, em inglês – e em espanhol…

Diga-se que há muitas palavras cuja origem ibérica se torna difusa: tanto podem ser de origem portuguesa como espanhola.

Aqui, aquele ito no fim faz-me desconfiar dum certo sabor castelhano. Mas os dicionários ingleses dizem que veio do espanhol e do português – quem sou eu para duvidar?

7. Palaver

A palavra inglesa para «palavreado» vem da nossa palavra para «palavra» (e assim criei uma espécie de trava-línguas).

Será que os ingleses nos achavam muito palavrosos? Talvez. Não faz mal: é curioso ver a nossa palavra assim transfigurada…

8. Sargasso

A palavra para «sargaço», em inglês, é sargasso – isto das cedilhas não é com os ingleses.

Uma confissão: a palavra faz-me sempre sonhar com o título Wide Sargasso Sea, de Jean Rhys

9. Verandah

Neste caso, a língua inglesa copiou a nossa palavra, mas deu-lhe um twist: a verandah inglesa é o nosso alpendre.

Não faz mal: as palavras viajam e, pelo caminho, mudam de personalidade. Acontece a todos!

10. Zebra

A nossa amiga zebra é portuguesa, dizem. Quer dizer, não será portuguesa, que por cá não há assim tantos exemplares da espécie, mas o nome que os ingleses lhe dão veio da nossa língua, que andou por aí a explorar o mundo e a descobrir animais…

 

Cf.  Dez palavras inglesas de origem portuguesa +. Dicionário de Estrangeirismos +  Estrangeirismos: guerras em torno da língua

 

Fonte

Texto que o professor universitário e tradutor Marco Neves publicou no portal Sapo 24 e no blogue Certas Palavras (3/02/2018).

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