Carlos Rocha - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Carlos Rocha
Carlos Rocha
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Licenciado em Estudos Portugueses pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, mestre em Linguística pela mesma faculdade e doutor em Linguística, na especialidade de Linguística Histórica, pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Professor do ensino secundário, coordenador executivo do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa, destacado para o efeito pelo Ministério da Educação português.

 
Textos publicados pelo autor

Pergunta:

Gostaria de saber qual o modo correto de pronunciar a palavra Ramsés.

Muito obrigado.

Resposta:

No nome próprio Ramsés, a sequência ams é pronunciada do seguinte modo: o a é fechado, o m é articulado como [m], ou seja, como em mesa, e o s é uma sibilante surda, como o s de serra, os ss de nesse ou o c de cena. Em suma, o nome em apreço soa como se fosse escrito "ramessés".

Pergunta:

Como fica o plural de pró-social?

Resposta:

 O plural de pró-social é pró-sociais, tal como o plural de pró-americano é pró-americanos, ou seja, o elemento que se segue ao hífen pode ter plural.

<i>Cluster</i>, um anglicismo intraduzível?

Como termo de certas áreas especializadas, o anglicismo cluster não é nenhuma novidade: aparece há alguns anos em português, tal como sucede noutras línguas românicas (por exemplo, espanhol ou francês). Disto mesmo dão prova os dicionários monolingues em linha, que já registam a palavra, definindo-a genericamente como «aglomerado de coisas semelhantes» (ver cluster no Dicionário Priberam da Língua Portuguesa ). Estas fontes incluem ainda os usos de cluster nos âmbitos cientifico e técnico: em linguística, «grupo de duas ou mais consoantes seguidas»; em informática, «unidade de armazenamento num disco» (ibidem; ver também o Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora, disponível na Infopédia). Igualmente na informática, cluster pode também intrometer-se no discurso em português, com outra  aceção possível em inglês: «conglomerado de computadores» (Dicionário Inglês-Português da Porto Editora, na Infopédia).

Pergunta:

Diz-se «página trinta e um», ou «página trinta e uma»?

Resposta:

Com o numeral cardinal, não se faz concordância e deve dizer-se «página trinta e um», considerando-se que a expressão é elipse de «página (número) trinta e um». É isto que diz Celso Cunha na sua Gramática do Português Contemporâneo (Belo Horizonte, Editora Bernardo Alves, 1970, p. 197; mantém-se a grafia original):

«4.º Na enumeração de páginas e de fôlhas de um livro, assim como na de casas, apartamentos, quartos de hotel, cabines de navio, poltronas de casas de diversões e equivalentes empregam-se os CARDINAIS. Nestes casos sente-se a omissão da palavra número:

Página 3 (três)
[...]
Cabine 2 (dois)
[...]
Casa 31 (trinta e um) [...]

Se o numeral vier anteposto, usa-se o ordinal:

Terceira página
Oitava fôlha
Segunda cabine
Trigésima primeira casa [...].»

Evanildo Bechara, na Moderna Gramática Portuguesa (37.ª edição, de 2009), entende que também é assim, embora apresente argumentação ligeiramente diferente:

«Na referência a páginas ou capítulos de livro, usam-se as preposições em ou a. Com em emprega-se a palavra página, folha ou capítulo no singular seguida do cardinal, se for superior a dez, podendo até aí usar-se o ordinal, anteposto ou posposto:

Na página 32 há um erro de revisão / na folha 32 / no capítulo 32
Na página dois faltou uma vírgula / na folha 2 / no capítulo dois
Na página segunda ou na segunda página / na folha segunda / no capítulo segundo

Com a preposição a, usa-se o substantivo no plural:

A páginas 12/A folhas 12

Note-se que se pode dizer "à página dois", "a páginas duas", "a páginas vinte e uma", "a páginas tantas", "na página dois", "na página vinte e um", "na página vigésima primeira". Em resumo: com página, no singular, o cardinal fica invariá...

Pergunta:

O termo "triliões" existe? E quanto vale, de facto, 1 trilião?

Como vejo escrito com sentidos diferentes  em Angola,  no Brasil e em Portugal...

Agradeço a ajuda.

Resposta:

A palavra trilião está registada nos dicionários e nos vocabulários ortográficos (por exemplo, no de Rebelo Gonçalves, de 1966 ou, mais recentemente, Vocabulário Ortográfico do Português). Contudo, o seu significado nem sempre é o mesmo nos diferentes países de língua portuguesa. No Brasil, tendo em conta que bilião ou a variante bilhão são empregadas no sentido de «mil milhões», um trilião (ou trilhão, na variante aí mais corrente)  é o mesmo que «mil biliões» – de forma mais clara, corresponde a 1012, isto é, um 1 seguido de 12 zeros. Em Portugal, em Angola e noutros países, um bilião é «um milhão de milhões», e, portanto, «um trilião» deve ser interpretado como «um milhão de biliões» – ou seja, 1018 (1 seguido de 18 zeros; ver Norma Portuguesa 18: 2006, sobre nomenclatura dos grandes números).

Historicamente, o contraste existente entre o uso brasileiro e o dos outros países de língua portuguesa — escala curta e escala longa, respetivamente — tem que ver com o facto de a chamada "regra dos 6N" não ter sido seguida pelo Brasil, como regista o Dicionário Houaiss, 2001:

«regra 6 regra, unanimemente adotada pelos Estados-membros para o Sistema Internacional de Pesos e Medidas na IX Conferência Internacional de Pesos e Medidas em Paris (1949), de que o Brasil faz parte, se...