Carlos Rocha - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Carlos Rocha
Carlos Rocha
437K

Licenciado em Estudos Portugueses pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, mestre em Linguística pela mesma faculdade e doutor em Linguística, na especialidade de Linguística Histórica, pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Professor do ensino secundário, coordenador executivo do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa, destacado para o efeito pelo Ministério da Educação português.

 
Textos publicados pelo autor

Pergunta:

Fico em dúvida em algumas situações se usar cada ou «a cada» ou se ambos são corretos:

«Receitou xarope, uma colher (a) cada duas horas.»

«Tomar 2 g/dia (a) cada 6 horas, durante 7 a 14 dias.»

Muito obrigada!

Resposta:

A preposição a é facultativa na construção em apreço.

Observe-se que cada pode ser usado com um substantivo no plural, numa construção que a norma aceita, conforme refere Vasco Botelho de Amaral (Grande Dicionário de Dificuldades e Subtilezas do Idioma Português, 1958, s. v. cada):

«[...] Epifânio, na Sintaxe Histórica, pág. 85, escreve que se junta cada a substantivos no plural, quando o substantivo precedido de cardinal representa conjunto: "uma escada para cada doze homens" [...].»

Mais recentemente, o Dicionário Houaiss (2001) também regista esta construção:

«[Cada] usado para indicar repetição ou intervalos regulares dentro de uma série ou conjunto total (geralmente é seguido de numeral cardinal e/ou substantivo que designa ocorrência, processo ou fase de processo, período de tempo, espaço ou algo que se percorre (em sentido literal ou figurado). Ex.: "visita a tia (a) cada três semanas"; "estava tão bêbado, que caía a cada dois passos".»

Pergunta:

O que é que quer dizer azáfama?

Resposta:

O substantivo azáfama pode significar (Dicionário Houaiss):

– «grande pressa e ardor na execução de um serviço»;

– «grande atividade e confusão; atropelo, atrapalhação» (por extensão de sentido);

– «rumor alto de vozes; grita, bulha».

Refira-se que a palavra tem origem árabe, conforme José Pedro Machado regista no seu Vocabulário Português de Origem Árabe (Lisboa, Editorial Notícias, 1991): «Do árabe az-zah(a), "pressa; multidão, barafunda, balbúrdia" [...].»

Pergunta:

Podiam dizer-me se em português correto se deve escrever «em regra geral» ou em «regra geral», ou se a utilização de um ou outro depende do contexto?

Muito agradecido.

Resposta:

Pode escrever «regra geral» ou «em regra geral».

O Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea, da Academia das Ciências de Lisboa, regista como entrada de regra a expressão «(em) regra geral», na qual a parentetização de em indica que a preposição é facultativa. A mesma fonte classifica esta expressão como locução adverbial, atribuindo-lhe os significados de «segundo a prática habitual; habitualmente, geralmente». No dicionário em referência, a locução está atestada quer com preposição quer sem ela: «Em regra geral, ela faz aquele percurso em 10 minutos.» «Regra geral, a mãe não autoriza a filha a sair de casa à noite.»

Pergunta:

Conheci há pouco tempo um madeirense de nome Dinarte, nome próprio que eu desconhecia completamente, e, contando-me que na Madeira este nome é muito comum, tentámos procurar a origem ou algumas informações sobre este nome próprio, mas sem sucesso.

Poderão ajudar-nos a saber qual a origem do nome Dinarte?

Obrigada.

Resposta:

A informação de que dispomos é a facultada pelo Dicionário Onomástico Etimológico da Língua Portuguesa, de José Pedro Machado: «Do francês Dinard, apelido com origem em topónimo homónimo, cuja antiga forma era Dinart, do britónico din, "colina" (= gaulês dunum) e talvez o bretão arzh, "urso" (= galês arth, gaulês *arto).»

Pergunta:

É frequente ouvirmos a expressão «certos e determinados» em diversos contextos.

Recentemente, relativamente ao Código da Estrada, deparei-me com o seguinte texto:

«É proibido o estacionamento nos locais reservados, mediante sinalização, ao estacionamento de determinados veículos.»

Qual a diferença entre «determinados veículos», «certos veículos» e «certos e determinados veículos»?

Resposta:

Pouca ou nenhuma diferença semântica existe entre certo e determinado, quando estas palavras são usadas como determinantes indefinidos (pronomes indefinidos adjetivos no Brasil)1. O contraste existente reside antes em algumas associações que são características de uma palavra e não de outra; por exemplo, em contexto narrativo, diz-se «certo dia, apareceu um gigante», e não «determinado dia, apareceu um gigante». Refira-se que a sequência «certo e determinado», associada a um substantivo, é fórmula ou expressão fixa que se atesta pelo menos desde o século XVIII (cf. Corpus do Português).

1 Sobre a semântica de certo, entendeu o consulente Fernando Bueno (Belo Horizonte, Brasil) enviar o seguinte comentário, que aqui registo com o meus agradecimentos:

«[...] [A] título de curiosidade, veja-se o que consta no dicionário Aurélio eletrônico:

"determinado (pronome indefinido) – veja-se certo (9)"

"certo (9) – não determinado; um, algum, qualquer"

O que é "certo", às vezes, é "indeterminado"... Que língua, a nossa!...»