Carlos Rocha - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Carlos Rocha
Carlos Rocha
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Licenciado em Estudos Portugueses pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, mestre em Linguística pela mesma faculdade e doutor em Linguística, na especialidade de Linguística Histórica, pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Professor do ensino secundário, coordenador executivo do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa, destacado para o efeito pelo Ministério da Educação português.

 
Textos publicados pelo autor

Pergunta:

A palavra jackpot deve-se pronunciar "jequepote", ou "jequepô"? E no plural?

Obrigado.

Resposta:

A palavra ainda não tem aportuguesamento gráfico, mas, em português europeu, tem duas adaptações fónicas atestadas: no dicionário da Academia das Ciências de Lisboa, transcreve-se [Ʒɐkˈpɔt] (aproximadamente, "jaquepote"); o Grande Dicionário da Língua Portuguesa, da Porto Editora (2010), apresenta a transcrição [Ʒɛkˈpɔt] ("jequepote"). Em ambas as transcrições, pronuncia-se um [t].

Quanto ao plural, jackpots, também se pode aportuguesar a pronúncia: "jaquepotes" ou "jequepotes". Atenção, que a palavra ainda não conhece a generalização de uma forma adaptada à ortografia do português, pelo que se aconselha o seu uso escrito entre aspas ou em itálico, ocorra ela no singular ou no plural: jackpot, jackpots.

Pergunta:

Aqui, na China, os chineses costumam dizer «beber a sopa». Os que aprendem português transferem muitas características da língua materna para a língua 2.ª e, assim sendo, quando se exprimem em português e se referem ao acto de consumir a sopa, utilizam o verbo beber. Quando os corrijo e digo que devem utilizar o verbo comer, perguntam-me por que razão, se a sopa é líquida? Respondi que, apesar de líquida, consome-se com uma colher, um utensílio, não se levando directamente a sopa à boca. Mas os chineses também a utilizam quando consomem sopa.

Em Portugal, a forma correcta é utilizando o verbo comer, ou também se pode utilizar o verbo beber?

Resposta:

Em português, diz-se mesmo «comer a sopa», não se usando o verbo beber nesse contexto. Talvez a perspectiva subjacente a este uso seja a de encarar a sopa como alimento de consistência quase sólida. Note-se, a propósito, que sopa pode ser também «qualquer pedaço de pão embebido em caldo ou outro líquido» (Dicionário Houaiss).

Refira-se ainda que, do ponto de vista da variação regional, em certos contextos, um verbo alternativo é tomar. Por exemplo, no português do Brasil, diz-se «tomar (a) sopa» (comunicação pessoal de Luciano Eduardo de Oliveira).

Pergunta:

Qual é o gentílico da antiga Galécia, região que corresponde à atual Galiza, ao Norte de Portugal, às Astúrias e partes de Leão?

Muito obrigado.

Resposta:

Em princípio, galaico, tendo em conta que a forma latina dessa província romana era Gallaecia, cuja forma portuguesa é Galécia. Também se usa calaico, de Callaecia, variante de Gallaecia. Galécio não é impossível, mas encontra-se dicionarizado como elemento de compostos, p. ex., galécio-português (cf. Dicionário Houaiss).

Pergunta:

Qual é o gentílico da Lusácia, região europeia situada entre Alemanha, Polônia e Chéquia?

Tenho encontrado lusácio em diversos sítios da Web, mas estes nem sempre são confiáveis; o Portal da Língua Portuguesa acolhe o vocábulo, mas não o define; além do que os dicionários por mim consultados não consignam a palavra em apreço, daí a minha dúvida persistir.

Muito obrigado.

Resposta:

Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa (VOLP) da Academia Brasileira de Letras regista lusácio, como adjectivo e substantivo, e lusaciano, apenas como adjectivo. O VOLP da Porto Editora tem apenas lusácio, adjectivo e substantivo. O Vocabulário da Língua Portuguesa do ILTEC consigna só lusácio, mas também como adjectivo e substantivo. Embora nenhum destes vocabulários ortográficos defina estas palavras como gentílicos da Lusácia, obviamente que o são.

Pergunta:

O que significa o provérbio «Uma figa há em Roma, para quem lhe dá e não toma» e de onde vem?

Resposta:

Encontro uma variante do provérbio em causa no Dicionário de Provérbios de Madeira Grilo (edição do autor e do município de Pinhel, 2009):

«Uma figa há em Roma, para quem lhe dão e não torna.»

Significa que «há sempre um gesto de repúdio para os que recebem benesses e não voltam para demonstrarem gratidão.»

Sobre a origem, nada de concreto me foi possível apurar. Lembro apenas que uma figa é um gesto e um amuleto de repúdio, feitos «com o intuito de esconjurar alguém ou afastar o azar» (Dicionário Houaiss).