Carlos Rocha - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Carlos Rocha
Carlos Rocha
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Licenciado em Estudos Portugueses pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, mestre em Linguística pela mesma faculdade e doutor em Linguística, na especialidade de Linguística Histórica, pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Professor do ensino secundário, coordenador executivo do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa, destacado para o efeito pelo Ministério da Educação português.

 
Textos publicados pelo autor

Pergunta:

No título de uma marcha, a palavra deve ser escrita com inicial maiúscula ou minúscula? Qual a "versão" correcta? "Já Lá Vai no Ribeirinho", ou "Já lá Vai no Ribeirinho"?

Obrigada.

Resposta:

Gostaria de dar uma resposta sem rodeios, mas acontece que se estamos perante um caso em que a aplicação das regras ortográficas é hesitante, pelo menos, em português europeu. Em princípio, atendendo à Base XLIV do Acordo Ortográfico de 1945, títulos, artigos e palavras que não se flexionam (preposições e advérbios) devem ser escritas com minúscula inicial:

«Escrevem-se com maiúsculas iniciais, nas citações, os títulos e subtítulos de livros, de publicações periódicas e de produções artísticas: O Primo Basílio – Episódio Doméstico, Os Sertões, Serões Gramaticais; A Noite (nome de jornal), Diário Oficial, Revista Lusitana; O Desterrado (estátua de Soares dos Reis), O Guarani (ópera de Carlos Gomes), Transfiguração (quadro de Rafael). No entanto, escrevem-se com minúsculas iniciais (ou minúscula exclusiva, se unilíteros), sem prejuízo de haver sempre maiúscula na primeira palavra, os seguintes componentes de títulos e subtítulos deste género: 1.°) formas do artigo definido ou do pronome demonstrativo afim; 2.°) palavras inflexivas (preposições, advérbios, etc.), simples ou combinadas com as mesmas formas; 3.°) locuções relativas a qualquer categoria de palavras inflexivas e combinadas ou não de modo idêntico. Exemplos dos três casos: Contra o Militarismo, Sóror Mariana, a Freira Portuguesa; A Morgadinha dos Canaviais – Crónica da Aldeia, Mil e Seiscentas Léguas pelo Atlântico, Oração aos Moços, Reflexões sobre a Língua Portuguesa, Voltareis, ó Cristo?; Algumas Palavras a respeito de Púcaros em Portugal, A propósito de Pasteur, Viagem à roda da Parvónia

Sendo um advérbio, é de esperar que, à luz de regras ortográficas prestes a caducarem em Portugal, se escreva a pala...

Pergunta:

De acordo com o Dicionário Terminológico, como classifico as palavras nunca e jamais (classe e subclasse)?

Resposta:

À luz do Dicionário Terminológico (DT), nunca e jamais devem ser classificados como advérbios de predicado com valor temporal, à semelhança de recentemente, que ocorre num exemplo apresentado no verbete respeitante a essa classe de advérbios: «[...] Os rapazes chegaram recentemente. — Valor temporal»

Conforme se pode ler nesse verbete, o advérbio de predicado é um «[a]dvérbio com diferentes valores semânticos [...], que ocorre internamente ao grupo verbal, quer com função de complemento oblíquo, quer como modificador do grupo verbal (e, mais raramente, como predicativo do sujeito), podendo ser afectado pela negação [...] ou por estruturas interrogativas [...].»

Dado que a estes advérbios se podem associar diferentes valores semânticos, é possível identificar um subgrupo caracterizado por possuir valor temporal — é o caso do já mencionado recentemente, ao qual cabe aqui juntar sempre, nunca e jamais.

Assinale-se igualmente que a classificação de nunca e jamais como advérbios com valor temporal encontra paralelo em manuais e gramáticas de português anteriores ao aparecimento do DT, salvaguardadas certas diferenças terminológicas. Por exemplo, Paul Teyssier, no Manual de Língua Portuguesa (Portugal- Brasil) (Coimbra, Coimbra Editora, 1989, pág. 328) assinala a oposição entr...

Pergunta:

De onde vêm as expressões «vai tirar a mãe da forca» e «da cor de burro quando foge»?

Desde já obrigado pelas respostas.

Resposta:

São de Sérgio Luís de Carvalho (Nas Bocas do Mundo, Lisboa, Planeta, 2010, pág. 104) os seguintes apontamentos:

«Ir tirar a mãe da forca»

A forma da expressão costuma ser «ir tirar o pai da forca», a qual «[...] se aplica a uma tarefa urgente e que se deve desempenhar com celeridade. De acordo com a hagiografia, Santo António tirou, de facto o pai da forca. Assim, Santo António estaria a pregar em Pádua, em 1227, quando sentiu que alguém o chamava, desesperado, em Lisboa; de imediato, o santo cobriu a cabeça em profunda meditação e deu por si em Lisboa, onde o seu pai tinha sido injustamente condenado por homicídio. Ressuscitado e questionado pelo santo, o homem assassinado afirmou a inocência do pai de Santo António. Desse modo foi o inocente libertado, enquanto em Pádua todos garantiram que o santo se mantivera no mesmo sítio, em silêncio e reflexão profundas durante várias horas. Fora tirar o pai da forca...

«Da cor de burro quando foge»

«[...] designa uma cor incaracterística, vagamente desagradável e insípida. Há uma tese para explicar esta expressão (que, em rigor, como tantas outras, não se sabe bem quando surgiu). Assim, a frase seria uma corrupção de um provérbio antigo que recomendava "Corra do burro quando foge", numa clara recomendação para evitar burros quando estes se enraiveciam. A corruptela do provérbio deu origem a um tipo de cor... que não existe.»

Sobre «da cor de burro quando foge» , deve observar-se que a ocorrência da palavra burro na expressão pode remeter efectivamente para uma cor. É que o sugere Vasco Botelho do Amaral, no Grande Dicionário de Dificuldades e Subtilezas do Idioma Português (pág. 686):

«...

Pergunta:

Antes de qualquer coisa, parabéns pelo maravilhoso site, que me é tão útil quando tenho alguma dúvida sobre nossa língua.

Agora vamos à pergunta: Há algum topônimo para os nomes dos estados estado-unidenses de Oregon, Kansas, Arkansas, Oklahoma e Ohio?

Resposta:

Existem efectivamente aportuguesamentos dos nomes em apreço, pelo menos em obras de referência publicadas em Portugal, muito embora a comunicação social dê clara preferência às formas em inglês:

Oregon: Oregão (Rebelo Gonçalves, Vocabulário da Língua Portuguesa, 1966)

Kansas: Cansas (Gonçalves, op. cit.)

Arkansas: Arcansas (Rebelo Gonçalves, op.cit; Dicionário Prático Ilustrado, Porto, Lello e Irmão Editores, 1970)

Oklahoma: Oclaoma (Gonçalves, op. cit.)

Ohio: Oaio (Gonçalves, op. cit.)

N.E.–  Os nossos agradecimentos pela suas palavras amáveis para com o Ciberdúvidas.

Pergunta:

Qual o gentílico de Trôade, Anatólia? Seria o mesmo para Troia?

Muito obrigado.

Resposta:

Nas fontes consultadas, encontro só as formas Tróade e Tróada (Rebelo Gonçalves, Vocabulário da Língua Portuguesa, 1966), como designação da «região onde se localizava Tróia» (ver José Pedro Machado, Dicionário Onomástico Etimológico da Língua Portuguesa), à qual não se atribui gentílico específico. Quanto a troiano (ou Troiano), acho-o só como gentílico correspondente à cidade de Tróia, sem comentários que o definam também como designação do natural ou habitante da Tróade.