DÚVIDAS

A preposição de + oração de infinitivo: «de comer»

Eu li na gramática de Bechara (2018) que orações reduzidas de infinito como:

«Eu estive com fome, e deste de comer.»

«Eu estive com sede, e me deste de beber.»

são orações adverbiais de finalidade, pois é como se dissesse:

«Eu estive com fome e me deste algo para que eu comesse.»

«Eu estive com sede, e me deste algo para que eu bebesse.»

Mas o que eu gostaria de saber o porquê de estas orações reduzidas de infinitivo virem antecedidas da preposição de e assumirem um valor de oração adverbial de finalidade.

O motivo seria por causa do verbo dar + de + (verbo no infinito)?

Seria por causa da antonímia entre as palavras que norteiam o período: fome × comer, sede × beber? Eu realmente não sei.

Desde já, fico agradecido pela resposta.

Resposta

A expressão «dar de comer» é uma expressão fixa, que inclui uma oração reduzida de infinitivo introduzida pela preposição de. Esta estrutura pode ser interpretada como tendo um valor equivalente ao de uma oração adverbial final:

(1) «Dar de comer = Dar (alguma coisa) para comer»

Evanildo Bechara, na Moderna Gramática Portuguesa, propõe para esta construção a interpretação de que a estrutura «de + infinitivo» tem uma origem de valor adjetival:

«[...] [O] complemento formado por de e um infinitivo é, na sua origem, de caráter adjetivo. Dê-me algo, alguma coisa, qualquer coisa de comer, é como se disséramos algo comível ou comestível. Omitido o substantivo, significa só por si as coisas sobre que se exerce a ação do infinitivo: dê-me de comer = dê-me coisa que comer.» (p. 427)

Relativamente à seleção da preposição de, poderemos constatar que diferentes verbos podem selecionar diferentes preposições, tais como a, de, em, para, por:

(2) «Ele resistiu a ficar em casa.»

(3) «Ele recordava-se de ter sido castigado.»

(4) «Ele concordou em vir almoçar connosco.»

(5) «Ele pediu para vir connosco.»

(6) «Ele esforçou-se por ler todos os livros.»

Diferentes verbos regem diferentes preposições, pelo que bastará identificar os casos em que a regência tem lugar. Por esta razão, não se justificam as interpretações propostas para justificar a utilização da preposição de na construção em análise.

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