DÚVIDAS

A regência de concomitante

Qual a preposição, ou preposições, que rege(m) o adjetivo concomitante? Por exemplo, na frase:

«A política de preços é concomitante [da/com (a)/a (a)… ?] capacidade dos importadores em colocarem no mercado grandes quantidades do produto.»

Uma busca simples no Google (páginas de Portugal) devolve 4361 resultados para a preposição a (contraída com cada um dos artigos definidos — ao/à/aos/às), 16 800 para de (mais 10 750 quando contraída — do/da/dos/das) e um total de 41 623 para «com o/a/os/as».

Resposta

A regência de concomitante é construída preferencialmente com as preposições com ou a, muito embora a ocorrência de de não seja impossível.

Com efeito, em relação a contextos em que concomitante tem a função de predicativo do sujeito, como acontece no caso apresentado, o dicionário Aurélio XXI apresenta exemplos da associação deste adjetivo a com e a para introduzir um complemento:

(3) «Sua partida foi concomitante com a chegada do irmão.»

(4) «A queda do avião foi concomitante à explosão.»

Também o Dicionário UNESP do Português Contemporâneo apresenta exemplos do uso predicativo de concomitante em que apenas figuram as preposições a e com:

(5) A vinda do ator ao Brasil será concomitante ao lançamento de seu filme.

(6) A redução das taxas inflacionárias será concomitante com a retomada do crescimento.

Noutras fontes, por exemplo, no Dicionário Houaiss ou no dicionário da Academia das Ciências de Lisboa (DACL),1 os exemplos aí apresentados incluem a preposição de aparentemente relacionada com o adjetivo em apreço, mas tal não se deve à regência:

(7) «Sintomas concomitantes de uma doença.» (DACL)

(8) «A análise concomitante dos discursos dos processos e da experiência cotidiana dos populares nos seus bairros possibilitou reconhecer o discurso e a representação dos atores.»

Em (7), a expressão «de uma doença» não é complemento de concomitante mas, sim, de sintomas («o sintoma de qualquer coisa»). Em (8), também a estrutura coordenada «os discursos dos processos e da experiência
cotidiana dos populares nos seus bairros» é complemento de análise, e não de concomitante.

Será, então, impossível o uso da preposição de na regência de concomitante em contexto predicativo? Não, exatamente, pelo menos, tendo em atenção o uso deste adjetivo num texto produzido em Portugal (autor não identificado):

(8) «[...] esse trabalho era concomitante de uma adaptação portuguesa da prosa da Novela do Tristão [...]

Há, portanto, ter algum cuidado no uso dos resultados de uma pesquisa Google, porque é provável que muitas ocorrências do que parece ser a possibilidade de regência de concomitante com de esteja final relacionada com o nome que o adjetivo modifica.

1 Outros dicionários consultados, mas que não registam concomitante ou não atestam o seu uso: Dicionário de Regimes de Substantivos e Adjetivos, de Francisco Fernandes; Dicionário da Língua Portuguesa, de Cândido de Figueiredo; Grande Dicionário da Língua Portuguesa, de António de Morais e Silva; Grande Dicionário da Língua Portuguesa, da Porto Editora.

2 Se nos debruçarmos sobre a etimologia de concomitante, verificamos que esse termo deriva «do latim concomĭtans, -antis, particípio presente do verbo concomitāri, "acompanhar", de concomitāri, "acompanhar", de comes, ĭtis, "companheiro"» (Dicionário Etimológico da Língua Portuguesa, de José Pedro Machado). Tendo em conta que o termo companheiro exige, também, a preposição de como regência, teríamos aqui o modelo que legitimaria a possiblidade do uso de de com concomitante.

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