A pronúncia-padrão europeia, que figura no Dicionário da Academia das Ciências de Lisboa e no Grande Dicionário da Língua Portuguesa (Porto Editora), é com [u] na primeira sílaba; diz-se, portanto, [du'ridu], com acento tónico na penúltima sílaba. A pronúncia que nos descreve será uma variante regional que pode ter várias explicações. Uma delas é interpretá-la como conservação de uma pronúncia antiga de dorido, palavra que se escrevia “doorido”, pelo menos, até ao século XV (ver José Pedro Machado, Dicionário Etimológico da Língua Portuguesa). Esta grafia indica que o adjectivo tinha duas vogais em hiato (isto é, vogais que não se contraíam, nem formavam ditongo) em posição átona, à semelhança de outras como “caaveira”, que evoluiu para o actual caveira, com a aberto na primeira sílaba. A particularidade destas palavras é a de a maior parte ainda hoje apresentar uma vogal aberta em posição não acentuada, contrariando a tendência para a “redução” do vocalismo átono em português europeu; com efeito, caveira tem um a aberto na primeira sílaba ao contrário de caseira, que na mesma posição tem um a “fechado”. Se dorido é evolução de “doorido”, seria de esperar que a palavra mantivesse, na primeira sílaba, uma vogal menos fechada, provavelmente um o aberto, tal como acontece com corar e corado, formas modernas de “coorar” e “coorado”, e, normalmente, pronunciadas em Portugal com o aberto na primeira sílaba (átona). Note-se que, se corar é um derivado de cor, palavra que tem um o fechado, é lícito supor que dorido tivesse não um o fechado como dor, mas um o aberto, em paralelo, portanto, com o caso de cor/corado. Contudo, no português europeu-padrão há já algumas palavras deste grupo que estão a seguir a regra de fechar vogais em posição átona (elevação). Penso que é o caso de ganhar, que muitas vezes tenho ouvido com a “fechado” na primeira sílaba. Este exemplo permite, portanto, compreender que dorido tenha u em posição átona, apesar da evolução histórica específica do conjunto lexical a que pertence. Outra hipótese que pode ser sugerida é a de que na norma europeia se interpretou dorido como uma palavra derivada de dor, através de um processo de sufixação que levaria primeiro a um hipotético verbo *”dorir”, já com o [u] na primeira sílaba, e depois à sua forma de particípio passado que acabou por adquirir valor adjectival (exs.: «pés doridos», «corpo dorido»). Se assim é, não há razão para manter o timbre mais aberto da primeira sílaba átona do adjectivo em causa. Em suma, se no seu círculo de familiares ou amigos se diz “dòrido”, aceito que também o use informalmente nesse âmbito. Mas, fora dele, é com certeza preferível a pronúncia-padrão.