DÚVIDAS

O apóstrofo e a preposição de

Tenho duas questões sobre a utilização do apóstrofo em palavras compostas.

Segundo a alínea d) do ponto 1 da Base XVIII do AO90, «Emprega-se o apóstrofo para assinalar, no interior de certos compostos, a elisão do e da preposição de, em combinação com substantivos: borda-d'água, cobra­-d'água, copo-d'água, estrela-d'alva, galinha-d'água, mãe-d'água, pau-d'água, pau-d'alho, pau-d'arco, pau-d'óleo

Ora, as minhas questões são as seguintes. Primeira, o uso nestas palavras é obrigatório, ou facultativo? Isto é, ambas as formas "mãe-d'água" e "mãe-de-água" são válidas? Segunda, só se usa nas palavras que os dicionários preveem como tal, ou em qualquer composto nas mesmas condições? Por exemplo, apenas encontro, nos dicionários que consultei, a forma botão-de-ouro para designar a espécie botânica. Poderei escrever também "botão-d'ouro"?

Desde já, muito obrigado pela vossa atenção.

Resposta

Tudo depende do registo nos acordos ortográficos e da tradição do registo dicionarístico. 

Assim, as palavras em questão têm sempre apóstrofo nos dicionários consultados e são assim grafadas, pelo menos, desde os anos 40 do século passado, e, portanto, não se deve escrever "mãe de água". Estas formas apostrofadas são as corretas e, portanto, obrigatórias. 

Note-se que, ao abrigo do Acordo de 90, a forma "mãe-de-água", sem apóstrofo, está incorreta, pois não se hifenizam os compostos que incluam elementos de ligação, a não que se trate de nomes botânicos e zoológicos (morugem-de-água, rato-de-água). 

Quanto a botão-de-ouro não se escreve com apóstrofo, porque a ortografia da palavra não se fixou assim.  

Convém também explicar que o que determina a alínea d) do n.º 1 da Base XVIII do Acordo Ortográfico de 1990 (AO 90) não se afasta muito do que estipulava a Base XXXVII do Acordo Ortográfico de 1945 (AO 45) logo no seu começo:  

AO 90 – «d) Emprega-se o apóstrofo para assinalar, no interior de certos compostos, a elisão do e da preposição de, em combinação com substantivos: borda-d'água, cobra­-d'água, copo-d'água, estrela-d'alva, galinha-d'água, mãe-d'água, pau-d'água, pau-d'alho, pau-d'arco, pau-d'óleo. »

AO 45 – «Sempre que, no interior de uma palavra composta, se dá invariavelmente, tanto em Portugal como no Brasil, a elisão do e da preposição de, emprega-se o apóstrofo: cobra-d'água, copo-d'água (planta, etc. ), galinha-d'água, mãe-d'água, pau-d'água, pau-d'alho, pau-d'arco. Dando-se, porém, o caso de essa elisão ser estranha à pronúncia brasileira e só se verificar na portuguesa, o apóstrofo é dispensado, escrevendo-se a preposição em forma íntegra: alfinete-de-ama, maçã-de-adão, mão-de-obra, pé-de-alferes. Observe-se que no primeiro caso (elisão invariável) o emprego do apóstrofo dispensa o hífen entre a preposição e o elemento imediato.» 

Na norma brasileira que vigorou até 2009, o Formulário Ortográfico de 1943, lia-se o seguinte (Base XIII, 44, 3.º):  

«Limita-se o emprego do apóstrofo aos seguintes casos: 1º - Indicar a supressão de uma letra ou letras no verso, por exigência da metrificação: c'roa, esp'rança, of'recer, 'star, etc. 2º - Reproduzir certas pronúncias populares: 'tá, 'teve, etc. 3º - Indicar a supressão da vogal, já consagrada pelo uso, em certas palavras compostas ligadas pela preposição de: copo-d'água (planta; lanche), galinha-d'água, mãe-d'água, olbo-d'água, pau-d'água (árvore; ébrio), pau-d'albo, pau-d'arco, etc. » 

Ou seja, na norma de 1945, só se escrevia o apóstrofo se tanto em Portugal como no Brasil se verificava a elisão do e de de, a qual é sistemática na pronúncia normal de Portugal, mas não na do Brasil. O cotejo de dicionários elaborados em Portugal com dicionários do Brasil permite concluir que as palavras com apóstrofo foram fixadas há cerca de 80 anos, nos anos 40. Atualmente, parece não usar-se o apóstrofo em neologismos e, portanto, o repertório de palavras apostrofadas continua limitado.

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