DÚVIDAS

O pronome inerente se

Agradecia que me ajudassem a classificar o pronome se no excerto de um texto de Possidónio Cachapa sobre repartições públicas que passo a transcrever:
«Fui recebido num cubículo de 2 × 3 m, onde se amontoavam quatro pessoas. Um deles era, claramente, o líder. Devia ter uns vinte e muitos e, de forma explícita, o seu sonho de se tornar comediante começava a desmoronar-se.»
Poder-se-á considerar o pronome se, nos três casos, um pronome reflexo? Será que, quando acompanha o verbo desmoronar, ele pode ser considerado inerente, uma vez que o verbo pode ser utilizado sem o pronome?
Ainda uma outra questão:
No texto que introduz a dúvida que acabo de expor, deveria ter sido colocada uma vírgula antes do pronome relativo que? Não o fiz por considerar que a oração relativa era restritiva. Estará incorrecto o raciocínio?

Resposta

De acordo com a nova Terminologia Linguística para o Ensino Básico e Secundário (TLEBS), um dos testes que permitem a identificação do se reflexo (lavou-se), do recíproco (amaram-se) ou do inerente (atreveu-se) consiste em fazer seguir essa forma pronominal de «a si próprio» e «um ao outro». O pronome é inerente, se não puder ser seguido por estas expressões. Vejamos como se comportam os verbos da frase:

1) «... onde se amontoavam quatro pessoas [OK a si próprias]/[*umas às outras]»
2) «... o seu sonho de se tornar comediante [*a si próprio]/[*umas às outras] começava a desmoronar-se [*a si próprio]/[*umas às outras].»

Os asteriscos indicam agramaticalidade. Em (1), temos amontoar-se, que é um verbo reflexo, visto que é compatível com «a si próprio», embora não seja recíproco. Já em (2), o se é inerente, porque não admite nenhuma das referidas expressões.

Quanto à vírgula, ela não deve ser usada, porque a construção que utilizou é de facto restritiva: «... no excerto [...] que passo a transcrever [...]».

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