DÚVIDAS

Concordância verbal com infinitivos com a função de sujeito

Consultando as regras de concordância, eu me deparei com a possibilidade de, em algumas construções frasais, duas regras diferentes concorrerem.

Por exemplo, existe (1) a regra de concordância quando os núcleos do sujeito são formados por verbos no infinitivo e (2) a regra de concordância quando os núcleos do sujeito composto são ligados por ou. Exemplo: «Escovar os dentes com a torneira aberta ou tomar banho demorado GASTA(M) muita água.»

Afinal, nessa frase, (1) segue-se a regra de concordância do sujeito com verbos no infinitivo, a saber: o verbo deve ficar obrigatoriamente na 3.ª pessoa do singular (gasta), ou (2) segue-se a regra de concordância dos núcleos do sujeito composto ligados pela conjunção ou com valor aditivo, o que levaria o verbo gastar ao plural (gastam)? Em outras palavras, qual das duas regras devemos seguir e qual frase está certa: 1) «Escovar os dentes com a torneira aberta ou tomar banho demorado GASTA muita água», ou 2) «Escovar os dentes com a torneira aberta ou tomar banho demorado GASTAM muita água»?

Resposta

A resposta que procura – exposta em termos não muito categóricos –, encontra-a na Nova Gramática do Português Contemporâneo (Lisboa, Edições João Sá da Costa, 1984, pp. 506/507), de Celso Cunha e L. F. Lindley Cintra:

«Quando os sujeitos são dois ou mais infinitivos, o verbo fica no singular:

Olhar e ver era para mim um recurso de defesa. [José Lins do Rego (...)]

Fazer e escrever é a mesma coisa. [João de Araújo Correia (...)]

Vê-lo e amá-lo foi obra de um minuto. [Raquel de Queirós (...)]

Mas o verbo pode ir para o plural quando os infinitivos exprimem ideias nitidamente contrárias:

Em sua vida, à porfia,

Se alternam rir e chorar. [Alberto de Oliveira (...)].»

Observe-se, porém, que no caso em discussão a coordenação dos infinitivos é feita por meio da conjunção disjuntiva ou, e não com a conjunção copulativa e. Com efeito, a coordenação de sujeitos por meio de ou torna ainda menos forçosa a concordância no plural, embora não a exclua (ver Cunha e Cintra, op.cit, pág. 508/509 e Evanildo Bechara, Moderna Gramática Portuguesa, Editora Lucerna, 2002, pág. 557).

Sendo assim, maior margem existe para aceitar e até recomendar a concordância no singular com um sujeito constituído por dois infinitivos coordenados por ou:

(1) «Escovar os dentes com a torneira aberta ou tomar banho demorado gasta muita água.»

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