Carlos Rocha - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Carlos Rocha
Carlos Rocha
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Licenciado em Estudos Portugueses pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, mestre em Linguística pela mesma faculdade e doutor em Linguística, na especialidade de Linguística Histórica, pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Professor do ensino secundário, coordenador executivo do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa, destacado para o efeito pelo Ministério da Educação português.

 
Textos publicados pelo autor

Pergunta:

Preciso de saber qual é a expressão mais difundida e comum para me referir a uma loja onde se vendem frutas e legumes.

Sei que existe a palavra frutaria, e também quitanda ou mesmo «loja de frutas».

Muito obrigado.

Resposta:

Em Portugal, usa-se frutaria e «loja de fruta» (ou «de frutas»). Também se emprega lugar, no sentido de «loja onde se vendem hortaliças, frutas, galinhas, ovos»: «Tenho de ir ali ao lugar de fruta/ao lugar de frutas e legumes» (cf. Infopédia ).

No uso de outros países de língua portuguesa, regista-se também a palavra quitanda.

Pergunta:

Relativamente à formação do nome derivado do verbo reusar, o mesmo deve ser acentuado ou não?

Qual a forma correta, "reúso" ou "reuso"?

Grata pela atenção

Resposta:

O verbo reusar encontra paralelo em reunir, cujas formas conjugadas se escrevem com acento agudo sempre que o acento tónico (fonético) recai no u: reúno, reúnes, reúne, reúnem (mas reunimos e reunis, sem acento gráfico, porque o acento tónico fonético recai sobre o i).

Sendo assim, deve escrever-se reúso, reúsas, reúsa e reúsam, mas reusamos e reusais, sem acento gráfico.

Pode confirmar-se este parecer no Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa.

Pergunta:

Gostaria de saber se, em Portugal, a expressão «cinema de bolso» é sinónimo de folioscópio.

Muito obrigado.

Resposta:

Folioscópio é palavra que denota um livro constituído por uma sequência de desenhos, que, folheado, dá a impressão de movimento, como se fosse um filme de animação (cf. Dicionário Priberam). Em Portugal, é termo com registos dicionarísticos – além da Priberam, a Infopédia também o consigna  – e pode ter como sinónimo «cinema de bolso», mas esta é uma expressão ambígua.

Embora na Wikipédia o artigo dedicado a folioscópio (consultado em 18/04/2022)  apresente «cinema de bolso» como termo sinónimo, acontece que esta última expressão igualmente ocorre no sentido de «cinema realizado com telemóvel» (cf. Cláudia Lambach, Cinema de Bolso, uma Realidade Emergente na Cultura Visual Contemporânea, dissertação de mestrado, IADE, 2009).

Sendo verdade que alguns formadores e especialistas empregam «cinema de bolso» como o mesmo que foliosocópio, de qualquer modo, o termo indiscutivelmente correto e não ambíguo é folioscópio.

Pergunta:

Ao referir-me a Deus, como devo escrever o pronome dele: "dEle", D"ele", ou doutra forma?

Obrigado.

Resposta:

A forma dele – que não é globalmente um pronome, mas, sim, a contração de com o pronome ele – escreve-se geralmente com apóstrofo e inicial maiúscula quando se refere a Deus: «d'Ele».

Este procedimento não é obrigatório e ocorre como realce desde há mais de sete décadas, conforme se pode confirmar pela disposto na norma ortográfica de 1945:

«Pode cindir-se por meio do apóstrofo uma contracção ou aglutinação vocabular, quando um elemento ou fracção respectiva é forma pronominal e se lhe quer dar realce com o uso da maiúscula [...]: d'Ele, n'Ele, d'Aquele, n'Aquele, d'O, n'O, pel'O, m'O, t'O, lh'O, casos em que a segunda parte, forma masculina, é aplicável a Deus, a Jesus, etc.; d'Ela, n'Ela, d'Aquela, n'Aquela, d'A, n'A, pel'A, m'A, t'A, lh'A, casos em que a segunda parte, forma feminina, é aplicável à mãe de Jesus, à Providência, etc. Exemplos frásicos: confiamos n'O que nos salvou; esse milagre revelou-m'O; está n'Ela a nossa esperança; pugnemos pel'A que é nossa padroeira.
À semelhança das cisões indicadas, pode dissolver-se graficamente, posto que sem uso do apóstrofo, uma combinação da preposição a com uma forma pronominal realçada pela maiúscula: a O, a Aquele, a A, a Aquela (entendendo-se que a dissolução gráfica nunca impede na leitura a combinação fonética: a O=ao, a Aquele=àquele, etc.). Exemplos frásicos: a O que tudo pode; a Aquela que nos protege

Este preceito mantém-se no Acordo Ortográfico de 1990, Base XVIII, com a mesma redação.

Pergunta:

«A jornada foi longa e muitos dos que tinham rompido marcha comigo ficaram no percurso, alma "empena" e clamorosa» – lê-se no livro Quando os Lobos Uivam de Aquilino Ribeiro.

Não entendo a que se refere a última oração «alma empena e clamorosa» nem o seu sentido, porquanto o substantivo alma tem muitas conotações.

Resposta:

Há um erro na grafia da expressão em causa, porque deve escrever-se «em pena» («em sofrimento»), e não "empena".

Trata-se de uma expressão adverbial, equivalente a «em sofrimento». A sequência final da frase deve, portanto, entender-se como o mesmo que «ficaram no percurso, sofredores e muito queixosos».