Pergunta:
Antes de mais, o meu obrigado pelo excelente serviço prestado.
A minha dúvida prende-se com um uso específico da vírgula. Entendo que, numa frase como «sabendo o que tinha de fazer, decidiu agir», deve utilizar-se a vírgula para separar o complemento circunstancial no início da frase. Pergunto-me, no entanto, se o mesmo se passa numa frase como «e sabendo o que tinha de fazer, decidiu agir». Teria de haver obrigatoriamente uma vírgula a preceder a palavra sabendo, ou o «e» inicial, em certos contextos como este, poderá considerar-se parte do complemento circunstancial, não carecendo de uma segunda vírgula («e[,] sabendo o que tinha de fazer, decidiu agir»)? O mesmo seria válido para frases como: «e[,] assim, decidiu agir»/«e[,] então, decidiu agir»/«e[,] por isso, decidiu agir»? Não encontro nada referente a este caso específico, por isso gostaria que me auxiliassem, se possível com a referência a alguma gramática que se tenha debruçado sobre esta particularidade da escrita.
Muito obrigado.
Resposta:
De facto, não parece existir doutrina normativa sobre o tópico, pelo que é de supor que aos exemplos apresentados se apliquem os critérios de sempre. Contudo, estes casos têm certas características estruturais e discursivas que, sem retirar relevância à vírgula, permitem considerar a possibilidade da sua omissão, sem aí haver erro inequívoco.
Assim, em todos os contextos apresentados, a conjunção e ocorre como um conetor textual, mas esta função é, do ponto de vista sintático, praticamente igual à da mesma conjunção na coordenação oracional («desceu do comboio e, sabendo o que tinha de fazer, decidiu agir»). Esta função textual não obsta, portanto, a que expressões adverbiais – palavras simples, locuções e até orações gerundivas, participais ou de infinitivo – apareçam entre vírgulas. O mesmo acontece com e e «no entanto», quando ambos aparecem como articuladores do discurso.
Contudo, esse e com função discursiva e textual é usado muitas vezes para dar realce frases e expressões. Por exemplo, Celso Cunha e Lindley Cintra, na Nova Gramática do Português Contemporâneo (Lisboa, Edições João Sá da costa, 1984, p. 579), falam no e que inicia «frases de alta intensidade afectiva» («El-rei preso! E não se levanta este Minho a livrá-lo!»). Não me parece que, nos exemplos em discussão, se trate dessa intensidade, mas não será ilegítimo encarar o e parte da expressão adverbial, tal como aconteceria se esta fosse interrogada, constituindo um enunciado:
1 – E sabendo o que tinha de fazer? – E sabendo o que tinha de fazer[, decidiu agir].
2 – «E assim? – E assim[, decidiu agir].
O...