Carlos Rocha - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Carlos Rocha
Carlos Rocha
405K

Licenciado em Estudos Portugueses pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, mestre em Linguística pela mesma faculdade e doutor em Linguística, na especialidade de Linguística Histórica, pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Professor do ensino secundário, coordenador executivo do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa, destacado para o efeito pelo Ministério da Educação português.

 
Textos publicados pelo autor

Pergunta:

A frase «Quando vou _________casa dos meus tios, como sempre um óptimo bacalhau à Brás!» preenche-se com «à», ou «a»? E porquê? E em que casos se usa casa com artigo? 

Obrigada!

Resposta:

Nesse contexto, pode usar as duas formas: a diferença semântica é mínima, mas é perceptível. A forma «(vou) à casa de...» dá relevo à noção de casa como espaço físico concreto, enquanto «(vou) a casa de...» (sem artigo, como «em casa») evoca antes o ambiente doméstico, por oposição ao espaço público exterior. Note-se o contraste entre «ela está em casa» (= «não está na rua») e «está na casa» (= «está dentro de uma certa casa»).

Pergunta:

Existe o nome coletivo que designa um conjunto de prédios? Se sim, como se designa?

Obrigada.

Resposta:

A um conjunto de prédios chama-se quarteirão ou quadra, segundo o Dicionário Houaiss. Note-se que o uso de quadra, na aceção de «quarteirão ou área fechada por quatro ruas» (Dicionário Unesp do Português Contemporâneo), não se regista em dicionários elaborados em Portugal (dicionário da Academia das Ciências de Lisboa, Grande Dicionário da Língua Portuguesa, de José Pedro Machado, Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora e Dicionário Priberam da Língua Portuguesa). Este facto sugere que, em relação a um conjunto de edifícios, mesmo de um certo tipo, quadra se emprega pouco ou nada em português europeu.

Pergunta:

Com a chegada do novo Acordo Ortográfico, chegaram algumas dúvidas que não são sanadas por completo nos artigos e necessitam de interpretação.

SITUAÇÃO 1. O termo «ser humano», de acordo com o Artigo 1.º, da Base XV, é composto por justaposição, certo?

– «O ser-humano vive em sociedade.» 

SITUAÇÃO 2 Caso as palavras não sejam ligadas por hífen, caracteriza-se, então, uma enumeração de adjetivos que qualificam um ser. Exemplo:

– «O ser, humano, pensante, vive em sociedade.»

Preciso de ajuda, por favor. Obrigado.

Resposta:

Não se tem considerado «ser humano» como composto, nem mesmo antes da aplicação do Acordo Ortográfico de 1990, logo, não se usa hífen nesta expressão. No entanto, é verdade, que ela se comporta como um todo, sobretudo quando verificamos que, quando usamos ser como substantivo, muitas vezes a este ocorre associado o adjetivo humano.

Quanto ao segundo caso que apresenta, trata-se de uma expressão nominal constituída por um substantivo (ser – no contexto, não é verbo) e dois adjetivos que o modificam, podendo estes estar coordenados («ser humano, pensante» ou «ser humano e pensante» – e nunca com a vírgula entre ser e humano) ou estando o segundo a modificar a expressão «ser humano» globalmente, deixando implícito que há seres humanos não pensantes.

Pergunta:

Gostaria de saber se, na frase «Ele escreveu uma história fantástica» (entenda-se, por «fantástica», uma história com fadas, bruxas, feitiços, etc.), o adjetivo fantástica pode ser considerado adjetivo relacional e se na mesma frase, dependendo da interpretação que é dada ao adjetivo, este poderá ser considerado adjetivo qualificativo. 

Muito obrigada.

Resposta:

De facto, podem ser feitas a duas leituras: 

a) «história fantástica» = história do género fantástico (adjetivo relacional); 

b) «história fantástica» = história formidável, muito boa (adjetivo qualificativo).

Pergunta:

Gostaria que me esclarecessem sobre a forma adequada de usar esta expressão. Eu só uso a expressão «acho o máximo», «estás o máximo», etc.; mas tenho visto muita gente a usar a expressão de outra forma, que não me soa bem: «acho um máximo», «estás um máximo». Qual delas está, afinal, correcta? (Peço perdão, mas não sou adepta do Novo Acordo.)

Obrigada.

Resposta:

É um tanto difícil afirmar o que está correto, quando se trata de expressões coloquiais, como é o caso.

Em princípio, a expressão tem valor enfático e funciona como uma abreviação, ou melhor, uma elipse de, por exemplo, «estás o máximo de elegante». Mas esta elipse pode ser reinterpretada como o mesmo que «estás um espetáculo!», no sentido de «estás linda!» ou «estás com ótimo aspeto». Nesse caso, fica legitimada, pelo menos, no plano da oralidade, a expressão «estás um máximo».