Carlos Rocha - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Carlos Rocha
Carlos Rocha
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Licenciado em Estudos Portugueses pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, mestre em Linguística pela mesma faculdade e doutor em Linguística, na especialidade de Linguística Histórica, pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Professor do ensino secundário, coordenador executivo do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa, destacado para o efeito pelo Ministério da Educação português.

 
Textos publicados pelo autor

Pergunta:

Peço-vos uma definição única para as palavras Nação, Pátria, País e Estado. Também agradeço a sua contextualização.

Obrigado pelo inestimável serviço que nos prestam.

Resposta:

Se por definição única se entende definição comum a vários vocábulos, verifica-se que as palavras acabam muitas vezes por ser usadas como sinónimos, sobretudo Nação, Pátria e País, que remetem muitas vezes para uma comunidade identificada por uma cultura e um território próprios.  Contudo, depressa se verifica que tais palavras não se definem da mesma maneira, sobretudo em contextos mais especializados. Com base no Dicionário Houaiss é possível dizer que:1

Nação é próximo de País, mas sublinha os valores culturais comuns a uma população — «comunidade de indivíduos que, dispersos em áreas geográficas e políticas diversas, estão unidos por identidade de origem, costumes, religião Ex.: a n. católica, a n. maometana, a n. judaica».

Pátria salienta um país ou território enquanto realidade afectiva a que grupos e indivíduos estão ligados — «país em que se nasce e ao qual se pertence como cidadão; terra, torrão natal; terra natal»; ex.: «a minha pátria é Portugal».

País refere-se normalmente a um território com organização política própria — «território geograficamente delimitado e habitado por uma coletividade com história própria; ex.: os p. do Mercosul aceitaram o Chile e a Bolívia como membros associados».

Estado é a entidade responsável pela organização de um território e da vida da população ou do conjunto de populações que aí habitam — «país soberano, com estrutura própria e politicamente organizado» e «o conjunto das i...

Pergunta:

Surgiu-me, num exercício sobre adjectivos, uma dúvida acerca dos adjectivos relativos a «estátua de alguém deitado», «estátua de alguém a cavalo» e «rapaz que ainda não tem barba». Seria possível indicar-me quais os adjectivos correspondentes às expressões? Além disso, podia confirmar-me qual o adjectivo correspondente ao nome monge?

Obrigado.

Resposta:

Os adjectivos são os seguintes:

«que está deitado»: jacente («estátua jacente»);

«a cavalo»: equestre («estátua equestre»);

«sem barba»: imberbe («rapaz imberbe»);

«relativo a monge»: monacal («vida monacal») ou monástico.

Pergunta:

Quando falamos de processos de formação de palavras, confunde-se muito derivação por prefixação e sufixação e parassíntese. Trata-se de um mesmo processo, ou são dois processos distintos? Há quem afirme que parassíntese é um processo que só ocorre na formação de verbos, no entanto no DT classifica-se parassíntese como o processo em que se junta um prefixo e um sufixo em simultâneo a uma forma de base. Em que ficamos?...

Resposta:

1. São processos diferentes, porque a parassíntese se opera da forma que descreve (cf. Dicionário Terminológico – DT).

2. Que a parassíntese ocorra sobretudo em verbos não é observação que se oponha à descrição da parassíntese como «processo em que se junta um prefixo e um sufixo em simultâneo a uma forma de base». Segundo Alina Villalva (in M.ª Helena Mira Mateus et al., Gramática da Língua Portuguesa, Lisboa, Editorial Caminho, 2003, pág. 952):

«a derivação parassintética, que pode ser exemplificada por formas como enfraquecer ou esbracejar, é particularmente frequente na formação de verbos deadjectivais e denominais, embora também se  verifiquem alguns casos de adjectivalização: [...] en [son] RN ado/a »1

1 RN = radical nominal.

Pergunta:

Por que motivo não temos por hábito dizer «calçar umas calças»? Ou será que é correcto dizê-lo?

Obrigada.

Resposta:

Sobretudo porque a tradição não fixou esse uso. Calçam-se sapatos, meias e mesmo luvas, mas no caso de calças usam-se mesmo só os verbos despir e vestir, pelo menos, em português europeu.

Pergunta:

Qual o gentílico de Sumatra, ou Samatra, uma das principais ilhas da Indonésia?

Gratíssimo.

Resposta:

Não encontro atestado o gentílico de Samatra (melhor que Sumatra), pelo que suponho que a forma que ele deve tomar ainda não estabilizou. Tendo em conta que javanês é o gentílico da vizinha ilha de Java1, "samatrês" afigura-se-me como opção plausível, mas, repito, tudo depende de usos e registos dicionarísticos que não acho.

1 O caso de javanês mostra como muitas vezes a fixação de um gentílico é um processo sinuoso, uma vez que o termo foi transmitido, por via do francês javanais, do inglês javanese, este aparentemente formado por analogia com japanese (cf. Dicionário Houaiss). Em português existe também jau, menos usado, mas mais antigo, porque colhido directamente do malaio jāu, nome da ilha de Java, provavelmente no período da expansão portuguesa no Sueste asiático (idem).