Edite Prada - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Edite Prada
Edite Prada
40K

Edite Prada é consultora do Ciberdúvidas. Licenciada em Línguas e Literaturas Modernas, variante de Português/Francês, pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa; mestrado interdisciplinar em Estudos Portugueses, defendido na Universidade Aberta de Lisboa. Autora de A Produção do Contraste no Português Europeu.

 
Textos publicados pela autora

Pergunta:

Gostaria de saber se essas palavras podem ser consideradas derivadas.

verdadeverdadeiro

flutuaflutuante

gigantegigantescos

mimomimada

gostogostoso

genegenética

Resposta:

A primeira coisa a ter em conta no caso da derivação é saber se ela ocorreu ou não no âmbito da língua portuguesa. As palavras podem ser derivadas, mas tratar-se de um processo ocorrido na língua de origem, como acontece em flutuante, cuja derivação ocorreu ainda no latim fluctuante-, particípio presente de fluctuare, ou em genética, que provém do francês genétique.

Nas restantes palavras, a derivação ocorreu na língua portuguesa. No entanto, a palavra mimada, que interpreto como sendo particípio passado de mimar com valor adjectival, embora possa associar-se a mimo, ligá-la-ia directamente ao verbo, que, por sua vez, deriva de mimo.

Em síntese, poderemos dizer que todas as palavras em apreço são derivadas, ainda que nem todas o sejam enquanto fenómeno ocorrido em português.

Pergunta:

Como reescrevo este trecho de modo a eliminar a ambiguidade?

«Perante o tribunal, o menino identificou como seu agressor o colega do primo que frequenta a mesma escola que ele.»

Reescrever utilizando o pronome demonstrativo para indicar que o colega frequenta a mesma escola que o primo.

Reescreva usando um sinônimo de colega para indicar que o primo frequenta a mesma escola que o colega.

Resposta:

As duas questões que coloca poderão ter como resposta a que se propõe:

a) Reescrever utilizando o pronome demonstrativo para indicar que o colega frequenta a mesma escola que o primo: «Perante o tribunal, o menino identificou como seu agressor o colega do primo que frequenta a mesma escola que este

b) Reescreva usando um sinônimo de colega para indicar que o primo frequenta a mesma escola que o colega: «Perante o tribunal, o menino identificou como seu agressor o condiscípulo do primo.»

Podemos ainda pensar que o menino e o primo frequentam a mesma escola:

c) «O menino frequenta a mesma escola que o seu primo, cujo colega identificou como seu agressor perante o tribunal.»

Ou que o menino e o colega do primo andam na mesma escola:

d) «Perante o tribunal, o menino identificou como seu agressor um condiscípulo que é colega do seu primo.»

Pergunta:

As pessoas costumam empregar as duas frases: «Carla Bruni pode estar grávida do presidente» (Diário de Notícias – 11/01/08) e «Fernanda Serrano grávida do terceiro filho» (Caras – 15/01/09). Como posso evitar mal-entendidos, deixando claro que, se a Carla Bruni estiver grávida, o pai do bebé é o presidente, e que nascerá o terceiro filho da Fernanda Serrano?

Resposta:

A sua pergunta é bastante interessante. Numa pesquisa pelo Google, encontrei outras expressões que poderíamos acrescentar às duas que refere:

(1) «Grávida de gémeos»

(2) «Grávida de 7 meses»

(3) «Grávida do terceiro filho»

(4) «Grávida do marido»

(5) «Grávida de um rapaz»

(6) «Grávida do João»

(7) «Grávida de esperança»

(8) «Grávida de novo»

Se, em vez do nome grávida, utilizarmos o verbo, obtemos resultados semelhantes (exce{#p|}to para o exemplo (2) — o asterisco indica que a expressão é agramatical):

(9) «Engravidou de gémeos»

(10) *«Engravidou de sete meses»

(11) «Engravidou do terceiro filho»

(12) «Engravidou do marido»

(13) «Engravidou de um rapaz»

(14) «Engravidou do João»

(15) «Engravidou de esperança»

(16) «Engravidou de novo»

A partir da análise das diversas expressões, poderemos dizer que os vários complementos, quer do nome, quer do verbo, adquirem sentido com base no valor semântico do complemento.

Quando esse complemento indica a origem do processo, digamos assim, então o nome que segue a preposição designa o pai. Esta situação só se torna ambígua nas situações ilustradas com os exemplos (13) e (14), em que o nome que segue a preposição poderá designar uma entidade que reúne as condições para ser pai (rapaz e João). Nesses casos, a...

Pergunta:

Qual é o plural da palavra copo-medida?

Obrigada.

Resposta:

O composto copo-medida parece não estar ainda totalmente fixado na língua portuguesa. Com efeito, numa pesquisa Google, para além de copo-medida, ocorrem copo medida (sem hífen), copo de medida e copo medidor.

De qualquer forma, assumindo que o vocábulo se fixa na língua portuguesa, e tendo em conta que o segundo termo do composto (medida) especifica de que tipo de copo se trata, o plural mais gramatical é copos-medida. No entanto, também aqui o vocábulo revela instabilidade, pois o número de ocorrências em que o primeiro termo é o único a ter plural é pouco superior ao número de situações em que os dois termos se encontram no plural.

Pergunta:

«Este livro reúne alguns dos textos que mensalmente e ao longo dos últimos anos fui publicando […]. A estranheza do título justifica uma explicação, para que ele não passe como um mero exercício de estilo.

Quando era pequeno – muito pequeno, talvez oito ou nove anos – lembro-me de estar deitado na banheira, em casa dos meus pais, a ler um livro de quadradinhos. Era uma aventura de David Crockett, o desbravador do Kentucky e do Tenessee, que haveria de morrer na mítica batalha do Forte Álamo. Nessa história, o David Crockett era emboscado por um grupo de índios, levava com um machado na cabeça, ficava inconsciente e era levado prisioneiro para o acampamento índio. Aí, dentro de uma tenda, havia uma índia muito bonita – uma “squaw”, na literatura do Far-West – que cuidava dele, dia e noite, molhando-lhe a testa com água, tratando das suas feridas e vigiando o seu coma. E, a certa altura, ela murmurava para o seu prostrado e inconsciente guerreiro: “Não te deixarei morrer, David Crockett!”

Não sei porquê, esta frase e esta cena viajaram comigo para sempre, quase obsessivamente. Durante muito tempo, preservei-as à luz do seu significado mais óbvio: eu era o David Crockett, que queria correr mundo e riscos, viver aventuras e desvendar Tenesses. Iria, fatalmente, sofrer, levar pancada e ficar, por vezes, inconsciente. Mas ao meu lado haveria sempre uma índia, que vigiaria o meu sono e cuidaria das minhas feridas, que me passaria a mão pela testa quando eu estivesse adormecido e me diria: “Não te deixarei morrer, David Crockett.” E, só por isso, eu sobreviveria a todos os combates. Banal, elementar.

Porém, mais tarde, comecei a compreender mais coisas sobre as emboscadas, os combates e o comportamento das índias perante os guerreiros inconscientes. Foi aí que percebi que toda a minha interpretação daquela cena estava errada: o David...

Resposta:

— Do ponto de vista da gramática tradicional, o advérbio é um complemento circunstancial de lugar quando ocorre numa frase. Se tivermos em conta o Dicionário Terminológico, estamos perante um advérbio de predicado, com função de modificador e valor locativo.

B — Mesmo tendo em conta o contexto, tenho dificuldade em aceitar como hipónimos de literatura vocábulos como infância ou ingenuidade, ou seja, não vislumbro uma relação de hiperonímia entre literatura e aqueles vocábulos, como a que existe face a livro e história. No caso de combates, se assumirmos literatura, na expressão «literatura do Far-West», no sentido de histórias ou enredos característicos de um género literário, poderemos considerar que há uma relação de hiperonímia.