José Mário Costa - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
José Mário Costa
José Mário Costa
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Jornalista português, cofundador (com João Carreira Bom) e responsável editorial do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa. Autor do programa televisivo Cuidado com a Língua!, cuja primeira série se encontra recolhida em livro, em colaboração com a professora Maria Regina Rocha. Ver mais aquiaqui e aqui.

 
Textos publicados pelo autor

Pergunta:

Talvez me possam ajudar com uma dúvida grande com que me deparo diariamente na minha função de revisor de traduções:

Quando um texto inglês usa maiúsculas iniciais para realçar um sintagma (ou grupo de palavras) no meio de uma frase, como é que se deve lidar com isso na tradução? Eis um exemplo:

«Do not use Print Without Saving so as not to lose your work.»

Possíveis traduções (em português europeu):

«Não use a opção Imprimir Sem Guardar para não perder o seu trabalho.»

Não use a opção “Imprimir sem guardar” para não perder o seu trabalho.

«Não use a opção <b»

«Não use a opção <i»

«Não use a opção Imprimir sem guardar para não perder o seu trabalho.»

Na minha opinião, a última opção é incorreta porque, devido ao realce de apenas uma única palavra, toda a frase torna-se ambígua, adquirindo um segundo significado que não reflete o significado (único) da frase em inglês. O problema é que os tradutores que usam esse tipo de uso de maiúsculas e minúsculas, justificam essa opção dizendo sempre que “apenas assim é correto em português”. Cito, como exemplo, dum guia de estilo para português de um cliente meu: «Escreve com maiúsculas só a primeira letra da primeira palavra, ao contrário da formatação americana, que exagera no uso de maiúsculas.» Qual a vossa opinião relativamente a este assunto? (Caso queiram ver exemplos deste tipo de uso maiúsculas e minúsculas em sintagmas, sem qualquer outro tipo de realce, podem consultar, por exemplo, a Ajuda do Facebook).

Obrigado.

Resposta:

Embora o uso das maiúsculas e das minúsculas tenha regras devidamente estabelecidas tanto na norma de 1945 (pontos 39 a 47 das Bases Analíticas do Acordo Ortográfico de 1945) como na de 1990 (Base XIX do presente Acordo Ortográfico), trata-se de uma área de alguma liberdade de estilo e gosto, dependentes, como aqui já se observava, de critérios editoriais específicos. É o que de resto se recomenda nas observações da Base IX do AO: «As disposições sobre os usos das minúsculas e maiúsculas não obstam a que obras especializadas observem regras próprias, provindas de códigos ou normalizações específicas (terminologias antropológica, geológica, bibliológica, botânica, zoológica, etc.), promanadas de entidades científicas ou normalizadoras, reconhecidas internacionalmente.»

Dai que, na escrita jornalística, «os nomes de cargos, postos ou dignidades hierárquicas, sejam quais forem os respetivos graus, assim como os vocábulos que designam títulos, qualquer que seja a importância destes», se escrevam, sempre, com inicial minúscula – enquanto noutro tipo de registo (institucional e/ou mais formal), a regra é uso da maiúscula.

Por exemplo: «O primeiro-ministro Passos Coelho», no primeiro caso, «o Primeiro-Ministro Passos Coelho, no segundo; «a procuradora-geral da República», «a Procuradora-Geral da República»; «o papa Francisco», «o Papa Francisco»; etc., etc.

No caso em apreço, por ser claramente do âmbito de «obra especializada» (um manual de instruções informático?), não colhem os argumentos que recusam a utilização das maiúsculas iniciais num conjunto sintático com sentido (técnico) específico. Sem elas ...

Pergunta:

É sempre com grande prazer que agradeço o vosso excelente e útil trabalho, que uso frequentemente.

Consultei dois dicionários e não encontrei a palavra "marisqueio", que costumo usar com o significado de «atividade de captura ou apanha de marisco». Também não encontrei uma palavra que a pudesse substituir (por exemplo, "mariscagem"), pelo que peço a vossa ajuda para a encontrar.

Resposta:

Na verdade, que se conheça, nenhum dicionário ou vocabulário regista as palavras "marisqueio” e “mariscagem”, com o significado referido («atividade de captura ou apanha de marisco») – embora, no primeiro caso, até já exista na Ria Formosa (Algarve, Portugal) o chamado Observatório da Moluscicultura e Marisqueio1. É bem provável que a palavra surja em português por adaptação da forma marisqueo empregada quer em castelhano quer em galego como derivado de um verbo, mariscar, ou seja, o mesmo que mariscar, «apanhar ou andar à procura de marisco».

Observe-se que, em português, os substantivos terminados em -eio são geralmente derivados de verbos acabados em -ear2,  o que poderá levar a considerar que marisqueio é forma anómala, porque pressupõe a palavra não atestada *"marisquear", e não o atestado mariscar. Mesmo assim, é vocábulo que, em Portugal, a língua adaptou sem dificuldade e que entrou no uso, razões que permitem aceitá-lo como legítimo. Não obstante, uma consulta de páginas da Internet relacionadas com o Brasil revela que, neste país, se prefere o termo mariscagem, termo bem formado e, portanto, correto.

Pergunta:

Como se escreve o nome próprio Teo?

Resposta:

Exatamente como a consulente o escreve, embora também se encontre Theo.

Segundo José Pedro Machado (Dicionário Onomástico Etimológico da Língua Portuguesa), o nome Teo aparece «no Brasil, geralmente escrito Theo» e terá origem no grego Théos, «deus», «divindade».

Como dizer mal ( escrevendo bem (precariedade)" class="img-adjust">

Precariedade, pre-ca-rie-dade. Porque será que o secretário-geral da CGTPArménio Carlos, diz sempre "precaridade", se até nos cartazes das manifestações da central sindical de que ele é o principal dirigente a palavra vem sempre corretamente escrita?! (...)

Pergunta:

O resultado de um jogo de futebol, por exemplo, deve ser marcado com hífen ou com meia-risca? Exemplo: dois a um deverá ser 2–1 (meia-risca) ou 2-1 (hífen)?

Obrigada.

Resposta:

Como poderá ver nas respostas anteriores, já temos este esclarecimento: Lisboa-Porto com hífen e sem espaços.

Depois dela, o Acordo Ortográfico vem dizer, na sua Base XV, ponto 7:

«Emprega-se o hífen para ligar duas ou mais palavras que ocasionalmente se combinam, formando, não propriamente vocábulos, mas encadeamentos vocabulares (tipo: a divisa Liberdade-Igualdade-Fraternidade, a ponte Rio-Niterói, o percurso Lisboa-Coimbra-Porto, a ligação Angola-Moçambique e bem assim nas combinações históricas ou ocasionais de topónimos/topônimos (tipo: Áustria-Hungria, Alsácia-Lorena, Angola-Brasil, Tóquio-Rio de Janeiro, etc.).»

Fica claro que a marcação do resultado de um jogo de futebol cai neste âmbito.

No que toca ao tamanho do sinal, tratando-se de matéria de clara opção de estilo, ela deverá ser regulada por isso nesse âmbito específico. É por isso que os jornais e publicações afins têm, ou devem ter, os seus livros de estilo, clarificadores de uma dessas opções gráficas: ou pelo hífen – como prevalece na imprensa portuguesa – ou pela chamada meia-risca (denominada também como «traço de ligação», meio-traço ou «traço médio») –, como se prefere noutros registos, como neste aqui.

(Nada que ver, atenção, com o travessão – que não é uso empregar-se nestas situações. E tenha-se ainda em conta, também,