DÚVIDAS

Provérbios alusivos ao mundo rural

Gostaria de saber o significado dos seguintes provérbios:

«Ano de ameixas, ano de queixas.»

«A campo fraco, lavrador forte.»

«Mais vale lavrar o nosso ao longe que o alheio perto.»

«A boa fazenda nunca fica por vender.»

«Cada um colhe segundo semeia.»

Resposta

Embora estes provérbios se encontrem nas listas de alguma da bibliografia consultada1, não encontrámos nenhum registo sobre a origem e/ou o significado de cada um deles. Por isso, importa alertar para o facto de que a interpretação que aqui fazemos é fruto da análise de cada uma das frases, tendo como referência a realidade subjacente à construção dos provérbios.

Nos seis provérbios transparece a experiência vivida pelas pessoas cuja vida gira(va) à roda do universo agrícola, vivência que lhes conferiu saberes que foram transmitidos através das gerações. Reflexo da filosofia e da sabedoria popular que concentra em poucas palavras, em frases curtas e assertivas, os conselhos e as lições sobre a relação entre tempo/condições atmosféricas — plantações e colheitas, a natureza do campo — atitude do lavrador, o produto/fruto — o lavrador, realidades rurais em que a economia e a prudência sobressaem como valores imprescindíveis.

Relativamente a cada um dos provérbios:

Da leitura de vários provérbios, apercebemo-nos de que, na grande maioria deles, as condições atmosféricas (chuva, vento, neve, nevoeiro, sol, calor) e os produtos (frutos, legumes, cereais) definem um bom ou mau ano.

Em «ano de ameixas, ano de queixas», sobressai a mensagem de que um ano de abundância de ameixas corresponde a um ano de dificuldades, de preocupações, de falta de outros bens/produtos. Portanto, esse desequilíbrio deve estar relacionado com um ano de seca ou de excesso de chuva, condições atmosféricas prejudiciais/adversas a um bom ano agrícola2.

Por sua vez, os restantes provérbios assentam na importância da relação de interdependência entre o lavrador e o campo, pois um determina o outro. Assim:

«A campo fraco, lavrador forte»: só a determinação e a força (interior e física) do lavrador são capazes de vencer as adversidades de um campo fraco, levando-o a produzir o mesmo que um campo fértil.

«Cada um colhe segundo semeia»: os produtos/frutos que se recebem correspondem ao que se deu, como forma de recompensa (ou de punição) pelo que se fez. É sinónimo de «recebes aquilo que dás», valorizando a entrega a um projeto como determinante para o sucesso.

«Mais vale lavrar o nosso ao longe que o alheio perto»: elogio da precaução e do bom senso que aconselha o cuidar das suas próprias coisas em primeiro lugar (pois está a trabalhar em benefício próprio), deixando o que é dos outros para tratar no tempo que sobra.

«A boa fazenda nunca fica por vender»: alerta para a importância da terra/do campo, como um bem inestimável que nunca perde o valor.

1 Obras consultadas: José Pedro Machado, O Grande Livro dos Provérbios, Lisboa, Ed. Notícias; José Ruivinho Brasão, Os Provérbios Estão Vivos em Portugal, Lisboa, Ed. Notícias; José Ricardo Marques da Costa, O Livro dos Provérbios Portugueses, Lisboa, Ed. Presença, s. d.; Dicionário de Provérbios – Adágios, ditados, máximas, aforismos e frases feitas, da Porto Editora, 2000; Alexandre Parafita e Isaura N. Fernandes, Os Provérbios e a Cultura Popular, Ed. Gailivro, 2007; Gabriela Funk e Mattias Funk, Dicionário Prático de Provérbios Portugueses, Cosmos, 2008.

2 Na mesma linha de sentido, alertando para as características de um ano mau, veja-se os seguintes provérbios: «Ano de bêberas nem de peras nunca o vejas»; «Ano de muita chuva, muita casca, pouco pão»; «Ano seco, ano de fome».

Em contrapartida, muitos outros provérbios refletem as realidades de um bom ano: «Ano de cheia, arca cheia», «Ano de figo torrão é ano de pão», «Ano de nevão, ano de pão», «Ano de neves, ano de bens», «Ano de neve(s) paga o que deve(s)», «Ano de neve, ano de Deus», «Ano ventoso, ano formoso».

ISCTE-Instituto Universitário de Lisboa ISCTE-Instituto Universitário de LisboaISCTE-Instituto Universitário de Lisboa ISCTE-Instituto Universitário de Lisboa