O advérbio não desempenha, na frase apresentada em (1), a função de modificador do grupo verbal:
(1) «Eunão o tenho visto ultimamente.»
Com a entrada em vigor da Terminologia Linguística para o Ensino Básico e Secundário (TLEBS) e mais tarde do Dicionário Terminológico (DT), a função sintática de complemento circunstancial deixou de constar dos programas do ensino não superior em Portugal. Contudo, não podemos considerar que houve apenas lugar a uma mudança de nome da função sintática. O complemento circunstancial era preenchido por constituintes que dessem informações sobre várias circunstâncias (tempo, espaço, modo …), ou seja, este era identificado sobretudo por critérios semânticos.
No novo quadro orientador dos estudos gramaticais, as funções sintáticas são consideradas não por aquilo que significam, mas pela relação que mantêm com o verbo. Assim, este assume dois tipos de relações sintáticas com os constituintes que integram o predicado verbal:
(i) os constituintes são argumentos do verbo, ou seja, são expressões que completam o sentido do verbo e sem as quais este não forma uma frase completa e correta do ponto de vista sintático. Nesta situação, estão os constituintes com função de complemento direto, complemento indireto e complemento oblíquo;
(ii) os constituintes não são argumentos do verbo, ou seja, não são pedidos por este para completar o seu sentido e, portanto, não são obrigatórios, podendo ser omitidos da frase sem prejudicar a sua gramaticalidade. Estes constituintes designam-se modificadores do grupo verbal.
O advérbio não, ao integrar o predicado verbal, pode incidir sobre o verbo, modificando o seu sentido. Não se trata de um complemento do verbo porque não é pedido por este, que não necessita do advérbio para completar o sentido, pelo que tem a função de modificador do grupo verbal.
O advérbio não também pode, em certos contextos, incidir não sobre o verbo mas sobre constituintes da frase, como acontece na frase apresentada:
(2) «João comprou à Ana ontem não flores, mas livros.»
Neste caso, não se nega o verbo comprar, mas o constituinte flores, ou seja, a ação do advérbio incide não sobre o verbo mas sobre o grupo nominal. Assim sendo, o advérbio não desempenha a função de modificador do nome (restritivo), uma vez que não é argumento do nome (pelo que não é complemento do nome).
Disponha sempre!