O português arcaico - Antologia - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
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O português arcaico

Quanto ao Português, chamo desde já a sua atenção para isto: – que os legítimos textos arcaicos não são uma floresta oscura, selvaggia ed aspra e forte, uma série de vocábulos raros e complicados, entrelaçados em construções bárbaras, como aquelas Relíquias apócrifas e artificiosíssimas que durante séculos passaram por obras dignas de fé, de um Egas Moniz Coelho e Gonçalo Hermiguez.

Numa balada de Sancho I, composta antes de 1200, uma das mais antigas poesias trovadorescas de Portugal, de deliciosa cadência rítmica, há apenas umas vinte e tantas palavras diversas, todas elas singelas quanto à forma e quanto à essência e – todas – já eram então o que são hoje. É um fenómeno notabilíssimo, talvez único, não só quanto ao português, mas também em todos os idiomas neo-latinos.

Reparem bem! – Ela diz:

Ay eu coitada! – Como vivo,
en gran cuidado por meu amigo
que ei alongado. Muito me tarda
o meu amigo na Guarda!

Ay eu coitada! Como vivo
En gran desejo por meu amigo
que tarda, e non vejo! – Muito me tarda
o meu amigo na Guarda!
 
Fonte

in "Introdução a Lições de Filologia Portuguesa", Revista Lusitana, vol. 21º, Lisboa, 1918

Sobre a autora

Carolina Wilhelma Michaëlis de Vasconcelos (Berlim, 1851 — Porto, 1925) é reconhecida como a mais importante das filólogas da língua portuguesa. Foi crítica literária, escritora, lexicógrafa (participando como tal na comissão que estudou e estabeleceu as bases em que assentou a primeira reforma ortográfica do português, entrada em vigor a 1 de setembro de 1911). Foi a a primeira mulher a lecionar numa universidade portuguesa, a Universidade de Coimbra. Mais informação aqui.