Pergunta:
Mais uma vez os parabenizo pela riqueza que é esse site.
Segundo a gramática normativa, verbos dicendi são aqueles que aparecem nos discursos diretos e têm a função declarativa (ou «sensitiva», segundo alguns linguistas). Os dicendi tradicionais são transitivos diretos como dizer, afirmar, exclamar, perguntar, responder, redarguir.
Porém, encontramos na literatura brasileira verbos intransitivos e transitivos indiretos atuando como dicendi. Exemplos retirados de Dom Casmurro, de Machado de Assis:
«– Tem razão, Capitu – concordou o agregado» (página 160).
«– Mas eu tinha pedido primeiro – aventurou Pádua» (página 44).
«– Coitado de Manduca! – soluçava a mãe» (página 122).
E, por último, a que mais me impressionou:
«Depois de lhe responder que sim, emendei-me: – Deus fará o que o senhor quiser» (página 41).
Gozam os autores do direito de «licença poética», sabemos bem. Mas existe algum padrão do que é certo ou errado nesses casos?
Resposta:
Podem usar outros verbos no discurso direto, com a finalidade de descrever ou avaliar a intervenção feita em discurso. Não vejo, portanto, que aqui se possa definir um padrão do certo ou errado, dependendo da criatividade do escritor o partido que se pode tirar de determinados verbos. Assim, se um verbo é adequado para referir o valor pragmático da intervenção, existe como virtualidade para dele se fazer um aproveitamento estilístico. Por exemplo, numa passagem como a seguinte:
– Agradecia que me desses a chave.
– Nunca! — explodiu ela.
O verbo intransitivo explodir é aqui usado em extensão metafórica, na aceção de «manifestar-se de maneira súbita e ruidosa» (cf. Dicionário Houaiss).
Note-se que, pelos exemplos recolhidos pelo consulente, se pode concluir que os verbos que aí ocorrem mantêm uma relação semântica com os verbos declarativos, porque se relacionam com o comportamento sonoro e linguístico dos falantes.
Em suma, uma vez que não encontrei estudos sobre o funcionamento dos verbos em questão no contexto do discurso direto, considero que se trata de um tema interessante que aguarda uma investigação mais demorada.