Carlos Rocha - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Carlos Rocha
Carlos Rocha
434K

Licenciado em Estudos Portugueses pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, mestre em Linguística pela mesma faculdade e doutor em Linguística, na especialidade de Linguística Histórica, pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Professor do ensino secundário, coordenador executivo do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa, destacado para o efeito pelo Ministério da Educação português.

 
Textos publicados pelo autor

Pergunta:

Uma vez mais recorro ao Ciberdúvidas, desde já agradecendo a vossa ajuda.

Respondendo à pergunta 22 472, é dada a seguinte definição de atrelado (semelhante à de alguns dicionários que consultei): «veículo sem motor rebocado por outro».

Gostava de saber se não pode também utilizar-se atrelado para um veículo sem motor rebocado por um animal. Não podendo, pedia-vos que me indicassem uma palavra para esse tipo de veículos (isto é, que abranja carroças, coches, etc.).

Resposta:

Nos dicionários gerais que consultei, o substantivo masculino atrelado é um veículo sem motor puxado por outro, motorizado:

Dicionário Priberam: «Plataforma para carga que se atrela ao camião ou ao tractor»; «Caravana que se atrela ao automóvel.»

Dicionário da Língua Portuguesa, da Porto Editora (versão em linha): «veículo sem motor rebocado por outro.»

O Dicionário Houaiss (edição brasileira de 2001) assinala este uso de atrelado como um lusismo: «Regionalismo: Portugal. que ou o que não tem tração própria e é acionado por outro (diz-se de veículo); reboque, trailer

Para o termo hiperónimo de palavras coche ou caleche, poderá usar-se carruagem, definida no Houaiss como «veículo de quatro rodas sobre molas, de tração animal, para transporte de passageiros». Trata-se de vocábulo também registado no dicionário da Academia das Ciências de Lisboa e no Grande Dicionário da Língua Portuguesa, de José Pedro Machado.

Note-se, contudo, que, tendo em conta os dicionários consultados, não há termo de uso corrente que abranja os veículos não motorizados sem molas, como uma simples carroça. Quanto ao uso de veículo e carro, o seu valor é demasiado genérico, porque os respectivos referentes podem compreender todos os tipos de veículos, motorizados ou não. A menos que, para colmatar tal falta neste subsistema lexical, se pudesse considerar, a título de sugestão que não verifico estabelecida na língua qu...

Pergunta:

Quanto à consulta Sobre a classe de palavras de o antes de pronome possessivo, no trecho em que segue parte da resposta:

Quanto às hipóteses formuladas, mesmo considerando válidas as hipóteses 1a) e 1b), trata-se de análises que não encontro exploradas na literatura. Permita-se-me acrescentar que não vejo como em 1a) a forma o é apenas artigo definido e adjunto adnominal de um substantivo subentendido e em 1b) não é: na verdade, poderíamos sempre supor que a forma o é um demonstrativo, porque pressupõe uma construção como «o que é meu livro» equivalente a «aquilo que é meu livro», por sua vez, adaptável como «aquilo que é meu», com substantivo subentendido.

As frases eram: «Esse livro é igual ao meu»/«O seu livro é igual ao meu».

A dúvida era: «O pronome meu nas duas frases seria um pronome adjetivo, ou substantivo?»

As hipóteses eram:

1) No caso de se considerar o «meu» nas frases anteriormente citadas como um pronome possessivo adjetivo, haveria duas possibilidades para tal. a) O «meu» estaria adjetivando um substantivo subentendido no contexto, e o «o» seria um artigo definido, e tanto o artigo «o» como o pronome adjetivo «meu» desempenhariam a função de adjuntos adnominais do substantivo subentendido. b) O «meu» serviria como um pronome adjetivo posposto ao pronome substantivo demonstrativo «o», e assim estaria o adjetivando.

2) No caso de se considerar o «meu» nas frases anteriormente citadas como um pronome possessivo substantivo, haveria somente a possibilidade de se entender o «o» como artigo definido que substantiva o pronome, uma vez que se o «o» for entendido, nesse contexto de consideração, como um pronome demonstr...

Resposta:

1. A resposta em causa foi entretanto reformulada, porque, segundo M.ª Helena Mira Mateus et al., Gramática da Língua Portuguesa, 2003, as estuturas «o meu» ou «aquela outra» correspondem a elipses.

2. O que as descrições disponíveis apresentam é que o demonstrativo é um determinante tal como o artigo, não recebendo adjectivação. Mesmo no casos em que acompanha o possessivo (seja este pronome adjectivo ou pronome substantivo), considera-se sempre se trata de um determinante: «aquele meu carro» e «aquele meu».

3. O caso com a associação do determinante indefinido outro com o demonstrativo é semelhante: considera-se que se trata de um reforço do indefinido, e não de uma maneira de determinar o demonstrativo.

Pergunta:

Na palavra contra-revolucionário, contra é, ou não, um prefixo? Eu não o vejo como tal, visto existir, no nosso léxico, a palavra contra, tendo ela uma autonomia de que não gozam os prefixos (Ex.: «Ele manifestou-se contra a posição oficial da Igreja»). Nesta minha perspetiva, a palavra contra-revolucionário seria formada por composição. Ora, à luz do novo Acordo Ortográfico, as palavras compostas onde «não se perdeu a noção de composição» mantêm o hífen, pelo que me parece que se deva grafar contra-revolucionário (contrassenso já não teria hífen, porque se perdeu a noção de composição da palavra).

Agradeço, desde já, a atenção dispensada.

Resposta:

No que toca à formação de palavras, a classificação de contra não tem sido uniforme. Por exemplo, antes da aplicação do Acordo Ortográfico de 1990, a edição de 2001 do Dicionário Houaiss regista contra- como elemento de composição, mas a edição de 2009 do mesmo dicionário, na qual já se aplicam as novas regras, indica que o mesmo elemento é um prefixo. Penso que esta mudança se deve ao facto de contra se contar numa lista de prefixos na Base XVI, 1.º.: «Nas formações com prefixos (como, por exemplo: ante-, anti-, circum-, co-, contra-, entre-, extra-, hiper-, infra-, intra-, pós-, pré-, pró-, sobre-, sub-, super-, supra-, ultra-, etc.)...»

No entanto, observe-se que duas gramáticas tradicionais, a Moderna Gramática Portuguesa (pág. 366), de Evanildo Bechara, e a Nova Gramática do Português Contemporâneo (pág. 87), de Celso Cunha e Lindley Cintra, já classificavam contra- como prefixo. Além disso, note-se que contra- tem duas acepções, conforme se pode consultar no dicionário da Academia das Ciências de Lisboa: «oposição, em frente de», como em contratorpedeiro, contraveneno; e «grau inferior a outro», como em contra-almirante e contramestre. Dado que estas duas acepções são atribuídas a uma mesma forma, contra-, sem pressuporem o contraste entre duas unidade linguísticas homónimas (contra, preposição, «em frente de» vs. contra- «grau inferior a outro»), conclui-se que co...

Pergunta:

De onde vem o nome oxi usado para descrever uma droga que vem sendo usada nos centros urbanos? Esta palavra é um radical? Deve ser acentuada?

Resposta:

Tal como se encontra escrita, a palavra deverá ser pronunciada como oxítona (ou aguda), isto é, com acento tónico na última sílaba (transcrição fonética [ɔˈksi]). Mas se a intenção é pronunciá-la como o elemento de composição oxi- em oxiemoglobina, com maior proeminência da sílaba o- em relação a -xi, então recomenda-se a forma óxi.

Uma página da Internet permite saber a que se refere a palavra:

«Mais barata e mais agressiva que o crack, o oxi é uma nova droga, feita a partir de cocaína e que começa a se espalhar na cidade.»

Pergunta:

Uma reacção pode ser adaptativa [adj., próprio para se adaptar] (ou seja, promover uma boa adaptação) ou não o ser. Considerando que existem os termos adaptado e inadaptado, adaptação e inadaptação, podemos dizer que uma reacção que promove uma má adaptação é "inadaptativa"?

Obrigada!

Resposta:

A palavra inadaptativo está bem formada, apesar de não se encontrar dicionarizada. Tendo em conta, no entanto, que os dicionários registam adaptativo, «que propicia ou facilita a adaptação» (Aulete Digital; cf. tamabém Dicionário Priberam da Língua Portuguesa), além de consignarem inadaptável como derivado de adaptável, nada obsta à formação de inadaptativo, no sentido de «que não propicia ou não facilita a adaptação».