Carlos Rocha - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Carlos Rocha
Carlos Rocha
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Licenciado em Estudos Portugueses pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, mestre em Linguística pela mesma faculdade e doutor em Linguística, na especialidade de Linguística Histórica, pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Professor do ensino secundário, coordenador executivo do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa, destacado para o efeito pelo Ministério da Educação português.

 
Textos publicados pelo autor

Pergunta:

Gostaria de saber a etimologia e o significado dos radicais super, hiper e mega. Há uns dias disseram-me que hiper e super são sinónimos. Será verdade?

Resposta:

Super-, «posição em cima, excesso», e hiper-, «posição superior, excesso», não são radicais, são prefixos, isto é, afixos «que se associa[m] à esquerda de uma forma de base» (Dicionário Terminológico). Trata-se de prefixos que correspondem a palavras de línguas aparentadas, respectivamente, o latim super e o grego hupér, de significado equivalente e com a mesma etimologia — o indo-europeu *uper-, «sobre». Em português, porém, hiper- é usado como intensificação de super, conforme se lê no Dicionário Houaiss: «[em relação a super] representa, modernamente, um nível quantificador acima, inclusive nos usos ad hoc, reverentes ou pilhéricos (supermulher:hipermulher; supersensível:hipersensível; superexcitável:hiperexcitável). Assim se explica a diferença entre hipermercado e supermercado.

Quanto a mega-, «grande» (Dicionário Houaiss), embora não tenha origem preposicional, aparece também descrito como prefixo por Alina Villalva num dos capítulos que esta linguista dedica à morfologia do português na Gramática da Língua Portuguesa<...

Pergunta:

Sabemos pelos muitos gramáticos que o advérbio não modifica pronomes senão verbos, adjetivos, outros advérbios ou uma oração inteira, mas na frase «Ele tem muito pouco estudo», o muito está modificando o pronome indefinido pouco. Afinal, o advérbio pode, ou não, modificar pronome?

Grato!

Resposta:

Trata-de uma armadilha da terminologia gramatical usada no Brasil (cf. Nomenclatura Gramatical Brasileira). Os advérbios podem modificar pronomes adjectivos, que, por sua vez, são aqueles que, à semelhança dos adjectivos, acompanham substantivos — como é o caso de pouco, que modifica estudo em «pouco estudo».

Pergunta:

A palavra pulsar é grave, ou aguda?

Resposta:

A forma pulsar é uma palavra aguda, que corresponde a duas palavras homónimas: pulsar (verbo), «latejar», e pulsar (substantivo), «radioestrela que emite ondas de rádio com a duração média de 35 milionésimos de segundos, que se repetem a intervalos extremamente regulares, de aprox. 1,4 segundos».

Pergunta:

Já há uma resposta semelhante àquela que desejo, mas está incompleta e é muito pouco elucidativa. Bem, gostaria de saber como se pronuncia kiwi. Este w é pronunciado como v? Porque esta pronúncia me causa muita estranheza, assim como o aportuguesamento quivi, que a confirmaria. Ademais, para fins de esclarecimento, a sílaba tônica da palavra é a última, estou certo? Amiúde ouço "quí-ui", em vez de "quiu-í".

Agradeço previamente.

Resposta:

No Brasil, aceitam-se dois aportuguesamentos que reflectem duas maneiras de pronunciar a palavra: quivi e quiuí. Estas formas encontram-se registadas no Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa (VOLP) da Academia Brasileira de Letras. O Dicionário Houaiss, na sua edição de 2001, ao dar conta da etimologia da palavra, indica que a forma quiuí é mais usada:

ing. kiwi-kiwi, emprt. do maori; o fruto, batizado kiwifruit na Nova Zelândia por seu exterior peludo, integrou-se 1970 no francês com o nome de kiwi, tal como o pássaro que é tb. símbolo da Nova Zelândia, passando a ser assim conhecido no resto do mundo; no Brasil, houve flutuação inicial entre a pronúncia quivi e quiuí; esta última parece haver suplantado a primeira na década de 1990.

Em Portugal, o Vocabulário Ortográfico do Português (ILTEC) só acolhe a forma quivi, o mesmo acontecendo noutro vocabulário ortográfico, o VOLP da Porto Editora, e no dicionário da Academia das Ciências de Lisboa. No entanto, o Dicionário Priberam diverge destas obras de referência, apresentando duas formas, quivi e quiuí. A verdade é que estas grafias representam duas pronúncias frequentes na variedade europeia, podendo até o mesmo falante usar as duas. Sendo assim, embora no Ciberdúvidas já se tenha

Pergunta:

Gostaria de saber qual é a forma correcta. Na frase «Aferição a Português foi muito exigente», deve dizer-se «aferição a» ou «aferição em»? Sendo que se diz normalmente «Prova de aferição de Português».

Já agora, há algum livro ou link que aborde este género de questões?

Obrigada.

Resposta:

Na frase em causa, a expressão «a Português» não é complemento de aferição, isto é, não faz parte da regência da palavra, porque não é seu complemento, antes marca uma informação acessória referente ao contexto onde se faz a aferição. Para se falar de regência a propósito de aferição, teria de existir um complemento introduzido por preposição de, relativo ou ao objecto da aferição ou a quem a faz: «a aferição das notas (pelo ministério)», «a aferição do ministério» (entenda-se: «feita pelo ministério»).

Sendo assim, a expressão «a Português» não faz parte da regência de aferição. Então de que se trata? É um constituinte modificador de aferição. A pergunta é, portanto, sobre a forma desse constituinte.

Ora bem, no português europeu, quando se pretende referir dada situação (normalmente ligada à avaliação) relativa a uma dada disciplina do currículo, diz-se, por exemplo, com a preposição em, «na disciplina de Português» ou «em Português», podendo, informalmente, usar-se também a preposição a — «à disciplina de Português» ou «a Português» («teve negativa em/a Português»).

Como disse, a questão não tem que ver com regências, mas sobre o assunto poderá ler a resposta Sobre dicionários de verbos.