Pergunta:
Após a promulgação do Acordo Ortográfico (2008), no Brasil e nos países lusófonos, observei, quanto à palavra pé de moleque, agora, grafada sem hífen, o seguinte:
(1) A palavra pé de moleque, sem hífen, portanto, seguindo as prescrições da base XVI do Acordo Ortográfico (1990), lematizada como entrada (lema) na página 964 do Dicionário Escolar da Língua Portuguesa [Como a nova ortografia da língua portuguesa] (2.ª ed. São Paulo: Companhia Editora Nacional 2008).
(2) A palavra pé de moleque, sem hífen, portanto, seguindo as bases do Acordo Ortográfico, lematizada como subentrada na página 1453 do Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa [Com a nova ortografia da língua portuguesa] (Rio de Janeiro: Instituto Houaiss de Lexicografia/Objetiva, 2009). Vale lembrar que como subentrada é classificada como locução e não substantivo masculino ou palavra composta.
(3) Na página 631 do Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa (VOLP) [da Academia Brasileira de Letras, ABL], pé de moleque aparece sem hífen, com status de entrada, seguindo, também, as bases do Acordo Ortográfico e classificada como substantivo masculino.
As duas ocorrências, no meu entendimento, tais implicações importantes para a lexicografia e análise linguística da unidade léxica pé de moleque: a) como entrada, deve ser, morfologicamente, classificada como substantivo composto e b) como sube...
Resposta:
Começo por fazer um reparo: a discussão sobre o uso do hífen em compostos e locuções, como é o caso de pé-de-moleque/«pé de moleque», relaciona-se não com a Base XVI mas, sim, com a Base XV do Acordo Ortográfico de 1990 (AO90). Mas a questão do consulente é extremamente pertinente, porque, apesar de os dicionários referidos estarem de acordo quanto à perda do hífen em pé de moleque e de outras palavras que incluem elementos de ligação, o tratamento lexicográfico destas formas, como se vê, varia. Esta divergência tem três vertentes que passo a comentar:1
1. Ao perder o hífen, pé de moleque deixa de ser palavra composta para se tornarem uma sequência de palavras gráficas. Acontece que um dos critérios de identidade mais consensuais na tradição lexicográfica portuguesa e brasileira é o de a forma de citação dever corresponder a uma palavra gráfica (sequência de caracteres delimitada por espaços em branco ou sinais de pontuação). No entanto, a Base XV, 6.º, do AO90 parece estipular que uma série de formas de citação perdem o hífen, passando de palavras gráficas a sequências de palavras gráficas. Assim, em duas das obras mencionadas pelo consulente, como aliás noutras — o Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa (VOLP) da Porto Editora e o Vocabulário Ortográfico do Português (VOP) —, não se retirararam da nomenclatura as palavras que caem sob acção...