Sara Mourato - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Sara Mourato
Sara Mourato
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Licenciada em Estudos Portugueses e Lusófonos pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa e mestre em Língua e Cultura Portuguesa – PLE/PL2. Com pós-graduação em Edição de Texto, trabalha na área da revisão de texto. Exerce funções como leitora no ISCTE.

 
Textos publicados pela autora

Pergunta:

Desde já agradeço o vosso trabalho tão útil para quem aprende português no estrangeiro.

Sempre pensei que em português se usasse apenas o verbo procurar para a função que o verbo buscar tem em espanhol. Porém, estou a fazer um exercício de gramática portuguesa que põe como opções precisamente o verbo procurar buscar para preencher um texto. Então, qual é a diferença entre eles? Posso usá-los como sinónimos?

Grato pela vossa atenção e resposta à minhas dúvidas.

Resposta:

Apesar de serem sinónimos em muitos contextos, verifica-se que em português o verbo procurar e buscar se diferenciam em algumas situações. Onde, por exemplo, em espanhol se emprega buscar (que é cognato do português buscar) mesmo quando se trata de encontrar algo que se perdeu ou que pretende alcançar, o português prefere o verbo procurar. Repare-se:

(1) «busco una casa grande» (espanhol);

(2) procuro uma casa grande (e não «busco uma casa grande»)1

Salientemos ainda as aceções onde estes verbos são utilizados. Assim, e de acordo com o Dicionário Houaiss, os verbos buscarprocurar definem-se como:

1. buscar: a) esforçar-se por achar ou descobrir (alguém ou algo);  b) examinar minuciosamente, investigar; pesquisar, esquadrinhar; c) tratar de obter, procurar adquirir; d) fazer que se lhe depare; e) fazer tentativa para; esforçar-se por; empenhar-se, pretender; f) ir ao encontro de (alguém ou algo); g) formar (imagem mental) de; imaginar, idear; h) pôr as mãos em (alguém ou algo); apanhar, pegar; i) recorrer a si próprio; j) andar em busca um do outro; l2) imaginar.

2. procurar: a) executar as ações necessárias para tentar encontrar (algo); b) tentar conseguir, ir atrás de; c) esforçar-se para alcançar (algo); f) fazer pesquisa para descobrir (algo); investigar, pesquisar, buscar; g) ir em direção a ou ser atraído por; h) desejar falar a; ir ao encontro de; i) identificar (os melhores, mais adequados etc.); j) escolher, selecionar; l) tentar atrair ou adquirir; granjear, buscar; m) ir até onde está alguém para vê-lo, em visita ou a negócio; perguntar, indagar.

Atendendo às suas definições, verif...

Pergunta:

Gostaria de saber se existe o termo mandarina como feminino de mandarim.

Obrigado.

Resposta:

Mandarim1, registado com o significado de «(I) nos antigos impérios da China, do Aname e da Coréia, funcionário pertencente à classe dos letrados e recrutado por concurso; (II) (sentido figurado e com uso pejorativo) pessoa que, em virtude de seus títulos, diplomas, funções etc., se mostra cheia de importância e presunção, mandão, pessoa influente e importante, manda-chuva, chefão; (III) diz-se de ou o principal dos dialetos da língua chinesa, falado em todo o Norte da China e nas províncias do Centro, do Oeste e do Sudoeste, tomado como língua oficial (em chinês, putonghua) e que se baseia no dialeto pequinês, com pronúncia de Beijing» (Dicionário Houaiss), tem como feminino, efetivamente, mandarina2.

Os dicionários atestam este substantivo como sendo «esposa de mandarim (funcionário)» (sentido I da atestação de mandarim), e ainda como regionalismo no Brasil, onde surge como sinónimo de tangerina. Contudo, é possível aceitar – ainda que as fontes sejam omissas a este respeito – que mandarina ocorra também como o mesmo que «pessoa que, em virtude de seus títulos, diplomas, funções etc., se mostra cheia de importância e presunção, mandão, pessoa influente e importante, manda-chuva, chefão», ou seja, na acessão II dada ao termo mandarim.

 

1 Do malaio măntări, que é corruptela do sânscrito mantrī ', «conselheiro, ministro ou chefe de estado', provavelmente com mudança t > d por influência de mandar; vocábulo difundido através do português para as demais línguas europeias...

Pergunta:

Gostaria de saber se donzela pode ser usado como sinônimo de senhorita, que é uma mulher jovem solteira.

Sempre tomei donzela como «mulher frágil», mas recentemente li em José Lins do Rêgo o seguinte: «Depois do ensaio ficavam conversando na rua. O presidente ia levar as donzelas em casa.»

E pergunto do masculino donzel: pode ser usado como sinônimo de senhorito?

Sei que, para designar um homem solteiro, não existe este vocábulo, mas a questão fica em pé.

Resposta:

Embora sinónimos quanto à sua significação básica – denotam uma mulher jovem, solteira –, os usos das palavras donzela e senhorita são muito diferentes. O mesmo se diga acerca de donzel e senhorito.

De acordo com as definições encontradas nos dicionários, os termos donzela (origem no latim dom(i)nicēlla, diminutivo de domīna «senhora», provavelmente pelo provençal antigo donsela) e senhorita/senhorinha são parcialmente sinónimos:

– por donzela entende-se «[jovem solteira] que ainda é virgem; que é ingénua, pura, simples; que é dócil, branda»;

– e senhorita/senhorinha (termos sinónimos), além de diminutivo de senhora, possui sentido próprio que não o leva a confundir-se com o diminutivo, ou seja, designa «mulher de pequena estatura; (domínio popular) mulher plebeia que se aperalta para dar ares de senhora; (Brasil) rapariga ou moça solteira; (maiúscula/Brasil) forma respeitosa de tratamento concedido a uma jovem solteira» (Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea, Academia de Letras de Lisboa).

É de notar que, segundo o dicionário citado, os termos senhoritasenhorinha seriam ambos de uso corrente no Brasil em referência a pessoa solteira ou como forma de tratamento. Note-se, porém, que os dicionários brasileiros mais recentes apenas consignam senhorita enquanto forma de tratamento1. Já na variante europeia da língua, as ...

O tufão Goni e a tempestade Atsani
Que tratamento devem ter?

A propósito do tufão Goni, reflete-se, neste apontamento, acerca do tratamento dado aos nomes atribuídos a furacões, ciclones, tufões ou tempestades, que, raras vezes e erradamente, surgem entre aspas ou plicas ou em itálico.

Pergunta:

A grafia "intercorporalidade", no quadro do atual acordo ortográfico, é correta ou deverá incluir hífen (velha questão)?

Devemos fazer alguma distinção com "intercoporeidade" (português do Brasil) onde também é usado o termo "intercorporalidade"?

Os dois termos são equivalentes e aceitáveis?

Obrigado pelo apoio.

Resposta:

De acordo com a Base XVI do Acordo Ortográfico em vigor, não se emprega hífen na palavra apresentada – intercorporalidade , uma vez que o pseudoprefixo inter- se agrega a uma palavra que não se enquadra nas exceções propostas pelo acordo (não se inicia com h nem com r). 

Em relação aos nomes intercoporeidadeintercorporalidade, convém, antes de mais, analisá-los:

 Intercoporeidade: é um substantivo feminino formado por sufixação e prefixação: ao substantivo corpóreo agrega-se o sufixo -idade, formando-se assim o substantivo corporeidade  «qualidade, propriedade do que é corpóreo; corporalidade» (Dicionário Eletrónico Houaiss). Já a este substantivo, agrega-se, então, o prefixo inter-, que irá formar o substantivo feminino intercorporeidade – «ligação ou comunicação entre dois corpos; interação de uma pessoa com outra(s); condição do que se estabelece entre os corpos, entre as pessoas; qualidade de intercorpóreo» (Dicionário Caldas Aulete). 

 Intercorporalidade: ...