Num acidente, como o que aconteceu na ilha da Madeira com um autocarro com turistas alemães, entre mortos e feridos, todos são vítimas. Um uso, porém, nem sempre acertadamente seguido nos registos informativos, noutras circunstâncias.
Licenciada em Estudos Portugueses e Lusófonos pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa e mestre em Língua e Cultura Portuguesa – PLE/PL2. Com pós-graduação em Edição de Texto, trabalha na área da revisão de texto. Exerce funções como leitora no ISCTE.
Num acidente, como o que aconteceu na ilha da Madeira com um autocarro com turistas alemães, entre mortos e feridos, todos são vítimas. Um uso, porém, nem sempre acertadamente seguido nos registos informativos, noutras circunstâncias.
Afinal qual é a forma correta de nos referirmos e de grafarmos o nome da organização fundada pelo australiano Julien Assange, muito citada ultimamente, depois da sua detenção na Embaixada do Equador, em Londres (onde se encontrava asilado há sete anos)? Por vezes, termos novos que nada têm em comum com a língua portuguesa levam a que indiscriminadamente os tornemos femininos ou masculinos e não nos preocupemos com a devida concordância.
Está certo dizer «trar-mo-se-á» (i.é. «haver-se-á de trazê-lo até mim»)?
Ou seria «trar-se-mo-á»?
A forma "trar-mo-se-á" não está correta. Quanto a trar-se-mo-á, trata-se de uma forma possível, mas com baixa ou nula probabilidade de ocorrência.
Antes de mais, é preciso refletir acerca da posição dos pronomes no fenómeno de mesóclise (ou seja, o caso em que os pronomes surgem no meio do verbo quando este se encontra no futuro do indicativo ou no condicional1). Na pergunta, o consulente propõe a forma "trar-mo-se-á", que apresenta os pronomes na ordem errada. Temos, assim, o verbo trazer, no futuro do indicativo (trará); um complemento indireto (me); um complemento direto (o); e um pronome reflexivo (se), que pode marcar o sujeito indeterminado ou ser uma partícula apassivante. Ora, a ordem correta deveria ser o verbo trazer seguido do pronome reflexivo se, por sua vez, associado ao complemento indireto contraído com o complemento direto2: trar-se-mo-á.
A sequência pronominal -se-mo- está, pois, correta e encontra exemplos semelhantes atestados (Gramática do Português, Fundação Calouste Gulbenkian, vol. II, pág. 2235). No entanto, é uma construção pouco frequente; e, quando ocorre em verbos que se encontram no futuro do indicativo ou no condicional/futuro do pretérito, pode causar estranheza.
Refira-se, ainda, outra questão, que se prende com a contração do pronome reflexo se e o
A palavra leite é uma palavra variável ou invariável? Apesar de pertencer à classe dos nomes, existe "leites"??
O vocábulo leite é um substantivo que varia em número, ou seja, no singular temos leite, e no plural, leites. No entanto, esta palavra insere-se na classe dos substantivos não contáveis. Isto é, segundo o Dicionário Terminológico, estamos perante um nome «em que não é possível distinguir partes singulares de partes plurais» e, por essa razão «estes nomes não ocorrem, tipicamente, em construções de enumeração, nem coocorrem com alguns quantificadores e determinantes». As construções no plural, em princípio «designam uma oposição qualitativa, excepto quando se faz contagem relativa a contadores não explícitos». Vejam-se os exemplos:
1. «Tenho vários leites na despensa.»
2. «Comprei dois leites.»
Em (1), referindo-nos a leite no plural, afirmamos que há leite na despensa, mas de qualidades diferentes (posso estar-me a referir às marcas, ao teor de gordura, etc.) – o que temos são «vários tipos de leite». Por outro lado, em (2), ao afirmar-se «comprei dois leites», compreendemos que por «dois leites» está, por exemplo, subentendido o substantivo pacotes; e, mesmo que a qualidade seja diferente, a verdade é que o leite pode vender-se em pacotes, pelo que a frase foca não a qualidade, mas, sim, a quantidade de pacotes.
A minha dúvida prende-se com a escrita da palavra "catacuses", plantas usadas na culinária alentejana.
Nas receitas tradicionais alentejanas é costume encontrarmos a palavra escrita com z, mas ao que parece no singular escreve-se catacus. É um regionalismo equivalente a labaça.
Catacus, denominação de uma planta usada essencialmente na culinária alentejana, tem uma única grafia tanto para o singular como para o plural – catacus – como se verifica no Vocabulário Ortográfico do Português ou no Grande Dicionário da Língua Portuguesa, de José Pedro Machado.
Note-se que o substantivo se forma a partir de cata, do verbo catar, com a junção de cus, em alusão ao facto de as folhas mais tenras e adequadas para a cozinha se encontrarem muito junto do pé, isto é, do "cu" da planta, na visão popular (Manuel Joaquim Delgado, A Linguagem Popular do Baixo Alentejo, 1951, pág. 83).
Sendo cus o plural de cu, a grafia com -z está, portanto, incorreta. No entanto, note-se que se encontram, tanto no singular como no plural, registos do substantivo grafado com -z – "catacuz", no singular, e "catacuzes", no plural (idem). Mesmo reconhecendo que a grafia com -z
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