DÚVIDAS

Particípios latinos e sufixo -nt(e)

A língua portuguesa começou por ser a latina, ou mais especificamente a romana, que os soldados romanos é que conquistaram a Galécia, os outros povos latinos permaneceram grandemente na terra natal, falada pelo povo galaico, cuja língua era uma outra e que teve então que aprender a dos conquistadores. Não a aprenderam impecavelmente porém, inevitavelmente, e tal como alguns termos nativos perduraram, alguns latinos não passaram, ou passaram mas não perduraram.

Desconheço porém como posso determinar a empregabilidade dos étimos latinos na produção portuguesa, atendendo ainda por cima aos latinismos posteriores. Posso obviamente guiar-me pelos dicionários, mas, embora a presença do termo confirme a empregabilidade, a ausência não a descarta pelas limitações necessárias das obras lexicográficas.

Os falantes nativos podem enganar-se logo os achados eventuais dalgum emprego do termo pretendido não garantem a empregabilidade correta. Posso dirigir-me às autoridades linguísticas, no meu caso a Academia de Ciências de Lisboa, mas parece-me uma abordagem pouco prática. Há então alguma maneira mais prática? Exemplifico.

Há vários substantivos ou adjetivos verbais latinos, mas a gramática portuguesa inclui destes só o particípio (passivo) passado e o gerúndio. Logo, nenhuma garantia geral da existência dos outros substantivos ou adjetivos há, mas alguns deles existem, sem o verbo correspondente até. Alguns particípios passados latinos foram transformados além disso nos adjetivos ou substantivos portugueses correspondentes, diferentes dos particípios passados dos verbos portugueses correspondentes. O verbo latino exhaurire, a que me refiro pelo infinitivo, consistentemente com a convenção portuguesa, foi transformado no verbo português exaurir, cujo particípio passado é reconhecido como sendo exaurido, mas o particípio passado latino exhaustum, a que me refiro pelo caso acusativo, de que o termo português descende, foi transformado no adjectivo português «exausto». Que outros casos análogos há?

Posso dizer incluso ou excluso? Quanto aos particípios (ativos) presentes, cujo emprego pretendo tantas vezes mas não faço pelo meu desconhecimento da possibilidade, quais existem? Posso dizer "permitente" ou "definiente"?

Menciono só algumas possibilidades que me ocorreram recentemente mas a dúvida generaliza-se aos casos todos em que o étimo latino existe, ou existiu, e a palavra portuguesa correspondente pode ser «reconstruída progressivamente», se é que me faço entender (a reconstrução linguística é percebida como regressiva geralmente).

Obrigado.

Resposta

As questões levantadas, sobre o uso de particípios passados provenientes diretamente da flexão latina, encontram resposta no uso e na história e, portanto, não têm uma regra que torne o seu uso previsível. Ou seja, casos como "permitente" e "definiente" não são geralmente aceitáveis, porque não têm tradição de uso.

No entanto, não é impossível que em certos tipos de discurso – por exemplo, no de áreas especializadas – emerjam essas formas, com um sentido especial, já que a terminação -nte se tornou um sufixo derivacional com alguma produtividade (cf. Textos Relacionados nesta página). De qualquer modo, não se trata de particípios presentes, categoria que não é considerada nas gramáticas do português.

Quanto aos particípios irregulares dos verbos do português, a sua fixação é também histórica e não está sujeita a uma regra concreta (cf. Textos Relacionados nesta página). Há, como também refere na sua pergunta, formas com origem em particípios passados latinos que, mais ou menos modificados por fenómenos de evolução fonética ao longo da história, só têm uso como adjetivos. É o caso não só de excluso e incluso, mas também de exausto, oculto, seco, correto, sujo ou inquieto (cf. Gramática do PortuguêsFundação Calouste Gulbenkian, 2013, p. 1492).

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