Carlos Rocha - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Carlos Rocha
Carlos Rocha
405K

Licenciado em Estudos Portugueses pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, mestre em Linguística pela mesma faculdade e doutor em Linguística, na especialidade de Linguística Histórica, pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Professor do ensino secundário, coordenador executivo do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa, destacado para o efeito pelo Ministério da Educação português.

 
Textos publicados pelo autor

Pergunta:

Quando dentro, perto, longe estiverem seguidos da preposição de, formando «dentro de», «longe de», «perto de», são locuções prepositivas, ou são advérbios/adjetivos que exigem pela regência a preposição de? Por exemplo, em «Estou longe da estrada», «da estrada» é complemento nominal de «longe», ou «longe da estrada» é um adjunto adverbial iniciado pela locução prepositiva «longe de»?

Mui agradecido.

Resposta:

Trata-se de locuções prepositivas, conforme Evanildo Bechara descreve na sua Moderna Gramática Portuguesa (Rio de Janeiro, Editora Lucerna, 2002, pág. 301):

«Em geral a locução prepositiva é constituída de advérbio ou locução adverbial seguida de preposição de, a, com:

«O garoto escondeu-se atrás do móvel [...]»

Como «atrás de», também as locuções em apreço apresentam um advérbio (dentro, longe, perto) associado a uma preposição (de). Sendo assim, em «estou longe da estrada», «longe da estrada» é um adjunto adverbial iniciado pela locução prepositiva.

Pergunta:

Colaboro com um jornal local e, por vezes, tenho de citar o nome de várias entidades públicas como a câmara municipal ou um qualquer pelouro.

Li algures que os nomes de entidades ou instituições se passariam a escrever, com o novo acordo, com minúsculas iniciais, ou seja, «câmara municipal de Barcelos» ou «tribunal arbitral de Lisboa».

Como tal, gostaria que me respondessem a esta questão: os nomes de identidades passarão a escrever-se com minúscula inicial, com maiúscula inicial, ou isto é algo opcional?

Agradeço a atenção.

Resposta:

Vai continuar a escrever com maiúsculas iniciais as expressões em apreço, que designam instituições, conforme a Base XIX, 2, d) do Acordo Ortográfico de 1990:

«2 A letra maiúscula inicial é usada:

d) Nos nomes que designam instituições: Instituto de Pensões e Aposentadorias da Previdência Social

 

Pergunta:

«Sendo assim» é uma conjunção? Como poderia classificar?

Resposta:

Na perspetiva da terminologia da gramática tradicional, o dicionário da Academia das Ciências de Lisboa (ACL) regista a expressão «sendo assim» como locução conjuncional e equivalente a «assim sendo», também classificada como uma locução conjuncional. No entanto, em Portugal, com a adoção do Dicionário Terminológico (DT) no ensino básico e secundário, pode-se também classificar a expressão «sendo assim» (como «assim sendo») como um conetor discursivo, semanticamente afim de portanto, que é igualmente um conetor discursivo com valor conclusivo ou explicativo (cf. dicionário da ACL e DT, C.1.1. Comunicação e interação discursivas).

Pergunta:

A vossa resposta 12466 sobre o uso de maiúsculas em palavras compostas parece-me bastante elucidativa. No entanto, gostaria que me esclarecessem sobre um caso em particular: que acontece quando o emprego da maiúscula se deve não à palavra composta em si mesma, mas à sua colocação na frase? Exemplificando, julgo que deve escrever-se: «Conheço um contra-almirante. Contra-almirante esse que enjoa no mar.» Ou será que o correcto é (a seguir ao ponto final) «Contra-Almirante», em vez de «Contra-almirante»?

Obrigado.

Resposta:

A resposta é simples: só há maiúscula na primeira letra do primeiro elemento da palavra composta. Escreva-se, portanto, depois de ponto, «Contra-almirante», como o próprio consulente apresenta ou como ocorre no seguinte exemplo, com a palavra contra-almirante (nos exemplos facultados, no plural):

«Conheço vários contra-almirantes. Contra-almirantes não faltam.» 

N.E. [24/04/2014] – São estas as regras do uso das minúsculas e das maiúsculas, estipuladas no Acordo Ortográfico de 1990 (Base XIX):  

 

DAS MINÚSCULAS E MAIÚSCULAS

1 A letra minúscula inicial é usada:

a) Ordinariamente, em todos os vocábulos da língua nos usos correntes.

b) Nos nomes dos dias, meses, estações do ano: segunda-feira; outubro; primavera.

c) Nos bibliónimos/bibliônimos (após o primeiro elemento, que é com maiúscula, os demais vocábulos podem ser escritos com minúscula, salvo nos nomes próprios nele contidos, tudo em grifo): O Senhor do Paço de Ninães, O Senhor do paço de Ninães, Menino de Engenho, Menino de engenho, Árvore e Tambor ou Árvore e tambor.

d) Nos usos de fulano, sicrano, beltrano.

e) Nos pontos cardeais (mas não nas su...

Pergunta:

Que testes nos permitem ter a certeza se estamos perante um complemento do nome ou um modificador restritivo do nome?

Resposta:

Infelizmente não existem testes 100% seguros para fazer a distinção em apreço. Começo por dizer que tanto complementos como adjuntos são opcionais (cf. Adeilson Pinheiro Sedrins, "A estrutura do sintagma nominal e as propriedades sintáticas de distinção das funções de adjunto e complemento do nome", in Clemilton Lopes Pinheiro, Ensaios sobre Língua e Literatura, Maceió, Edufal, 2006, págs. 11-62), o que torna a tarefa de os distinguir mais difícil do que acontece com a identificação de complementos verbais. Por exemplo, recorre-se muitas vezes ao teste da omissão de constituinte para mostrar que um complemento verbal não pode ser suprimido sem afetar o sentido global da frase: assim, em «ele fez um filme», o constituinte «um filme» é complemento verbal, pois a sua omissão produz uma frase agramatical (*«ele fez»). Não é isto que se verifica com o complemento do nome: perante a frase «a construção do edifício foi embargada», é possível omitir o complemento «do edifício» e obter uma frase gramatical (OK «a construção foi embargada»).

Dito isto, convém dizer que podemos identificar o complemento do nome com base nas suas propriedades e, para isso, recomendo a leitura da resposta "O complemento e o modificador restritivo do nome", de Edite Prada. Quanto a testes de identificação, nalguns estudos de sintaxe também se aceitam critérios mínimos que podem, no entanto, deparar-se com exceções (Sedrins, op.cit, pág. 43):

1. Ordem:

Um jogador de futebol do Benfica

*Um jogador de Benfica de futebol

um estudante de linguística da Universidade de Lisboa

*um estudante da Universidade de Lisboa de linguística

2. Os complementos não con...