a) São vários os recursos estilísticos usados pelo sujeito poético neste texto que lhe imprimem o poder de sugerir a ideia de simultaneidade:
— a enumeração de situações («o velho adormecido», «o jornal rasgado», «o cão farejando», «a barata andando», «o bolo cheirando», «o vento soprando» e «o relógio inerte»), sem qualquer interferência de algo [conjunção, conector ou mesmo qualquer sinal gráfico] que interrompa ou corte a imagem em pequenos trechos;
— a sinestesia, através da presença de várias sensações que o sujeito poético vai captando e registando (visual: «o velho», «o jornal», «o cão»; auditiva: «cão farejando», «barata andando»; olfactiva: «o bolo cheirando»; táctil e auditiva: «vento soprando»;
— a ausência de verbos auxiliares, preferindo os adjectivos com forma de particípios («adormecido», «rasgado») — o que anula toda a ideia de acção;
— a utilização do gerúndio («farejando», «andando», «cheirando», «soprando»), evocando construções perifrásticas que, por sua vez, criam a ideia de simultaneidade.
b) Quanto à segunda questão colocada, «rasgado» é a forma nominal que apresenta o resultado final de um facto verbal, pois trata-se do particípio passado do verbo rasgar. O particípio passado, usado adjectivalmente, exprime o resultado do estado de coisas expresso pelo verbo. Por exemplo, a acção de abrir uma porta tem como resultado o facto de uma porta estar ou ficar aberta, pelo que se pode dizer também «porta aberta», expressão em que o particípio tem valor adjectival. Com rasgar o mesmo se passa: «jornal rasgado» é uma expressão que refere um jornal que está rasgado, em resultado da acção de rasgar.