Carlos Rocha - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Carlos Rocha
Carlos Rocha
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Licenciado em Estudos Portugueses pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, mestre em Linguística pela mesma faculdade e doutor em Linguística, na especialidade de Linguística Histórica, pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Professor do ensino secundário, coordenador executivo do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa, destacado para o efeito pelo Ministério da Educação português.

 
Textos publicados pelo autor

Pergunta:

O uso do adjectivo impressivo é correcto em português? Significa o mesmo que impressionante? Usa-se em Portugal, no Brasil ou em ambas as versões do Português?

Obrigada!

Resposta:

É uso de correção muito discutível, pois a forma portuguesa com tradição é impressionante.

Contudo, os dicionários mais recentes registam impressionante num sentido que tende a ser mais enfático ou superlativo do que o de impressivo:

(1) uma paisagem impressionante = uma paisagem admirável, que abala e comove

(2) uma presença impressiva = uma presença que deixa marca emocional (mas pode não abalar)

Por outras palavras, impressivo, que será a adaptação de um empréstimo do inglês impressive, no sentido de «impressionante», tem um significado próprio em português, denotando um efeito psicológico que não é tão forte como o referido por impressionante.

Os mais ciosos da vernacularidade rejeitarão impressivo, na aceção de «impressionante», mas o seu uso, mesmo que pareça discutível, não deixa de ser expressivo por definir um matiz em relação a impressionante.

N. E. (09/03/2022) – Alteraran-se os dois últimos parágrafos da resposta. Assinale-se que impressivo tem registo no Dicionário da Língua Portuguesa da Infopédia e no dicionário Priberam (consultados em 08/03/2022) nas aceções de «que imprime» e «que impressiona». O significado moralmente ou psicologicamente causativo de impressivo não é recente; na verdade, segundo o Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa (2001, versão eletrónica), a primeira atestação da ...

Pergunta:

Existe alguma regra ortográfica que define quem vem primeiro? Exemplo: franco-italiano ou ítalo-francês?

Resposta:

A precedência não se deve a uma intenção ortográfica, mas, sim, referencial (pragmática), isto é, num adjetivo composto de nomes pátrios aparecerá primeiro o adjetivo a que se quer dar mais relevo por alguma razão prática relacionada com o mundo extralinguístico.

Por exemplo, quando se refere um acontecimento desportivo entre seleções nacionais e o país de uma delas é o anfitrião do jogo, este aparece anunciado primeiro. Imagine-se um caso como Portugal-Turquia, donde se infere «jogo luso-turco?, porque o jogo decorre em Portugal (ver aqui).

Na Gramática do Português (Fundaçáo Calouste Gulbenkian), confirma-se o que antes se disse:

«A escolha da ordem [neste tipo de compostos] pode ser condicionada por questões pragmáticas, por exemplo em pacto luso-francês realçar-se-á a posição de Portugal e em pacto franco-português, a de França.»

Sendo assim, supondo que se fala de um «encontro franco-italiano», é possível (não é forçoso, porém) que esse encontro tenha lugar em França ou que seja organizada por franceses ou que seja predominantemente francês. Se o composto for ítalo-francês sugere-se a situação contrária: destaca-se por algum motivo a participação italiana.

Pergunta:

Peço que me informem, se possível, da origem e sentidos das seguintes palavras: "roxina", "marigada" – esta, é certo, que na Beira Baixa significa «romã».

Obrigado.

P. S.: Envio imagem com exemplo do termo Roxina em Portugal, com x.

 

Resposta:

Sobre Roxina, que será nome próprio e faz parte do topónimo Rua da Roxina, em Benquerença (Penamacor, Castelo Branco), não foi aqui possível encontrar registo em fontes dicionarísticas ou enciclopédicas. No entanto, no distrito de Castelo Branco, na vila de Monsanto, há (ou havia) um Casal do Roxine, de configuração semelhante à do nome em apreço (ver Américo Costa, Dicionário Corográfico de Portugal Continental e Insular, 1948).

Não podendo enquadrar devidamente este nome, abre-se um leque de conjeturas, procurando pela semelhança fonética com outras palavras lançar alguma luz sobre a questão. Assim, convém mencionar rochina, forma homófona, que significa «variedade de mandioca», segundo o Dicionário Houaiss, que também lhe atribui origem obscura. Um artigo de investigação também consigna rochina, no sentido genérico de «farinha». Torna-se, porém difícil justificar a motivação do uso de rochina como nome de um lugar ou de uma rua. Encontra-se também a forma arrochinar, que significa «apertar», e cuja sonoridade sugere alguma afinidade com Roxina. Outra possibildiade ainda é a de este nome corresponder, afinal, a rechina, que, no Alentejo, se usa (ou usava) no sentido de «sopa de sangue de porco» e «calor forte» (Dicionário Houaiss), bem como «a pleno sol» («estar à rechina do sol»; cf. Revista Lusitana, vol. X, p. 240).

Quanto a marigada, há bastante informação. É uma variante de milgrada, o mesmo que romã (cf. dicionário de Cândido de Figueiredo, s. v. milg...

<i>Oligarquia</i>, <i>oligarca</i> e <i>oligárquico</i>
Etimologia e significado

Oligarca entrou no léxico corrente com o desenvolvimento da guerra entre a Rússia e a Ucrânia. Trata-se de uma palavra até recentemente pouco usada no discurso mediático, cujos significados e origem, Carlos Rocha, coordenador executivo do Ciberdúvidas, explica neste apontamento. 

Pergunta:

Em referência ao Campeonato Africano das Nações, eu pensava que o género seria masculino, tendo em conta o género da primeira palavra (campeonato), mas escuto pelas rádios portuguesas «a CAN», o que me deixa totalmente perdido.

Resposta:

Diz-se «o campeonato», porque se trata do Campeonato Africano das Nações, que tem CAN como sigla. Sendo assim, será de esperar a atribuição do género masculino à referida sigla: «o CAN».

Acontece, porém, que, em português, este campeonato tem outras duas designações: Taça Africana das Nações e Copa Africana das Nações, que inclui a palavra copa, típica do português do Brasil. Esta última denominação também se abrevia pela sigla CAN, que legitima o uso no género feminino: «a CAN».

Convém observar que, em certas páginas da comunicação social, ocorrem usos redundantes e algo incongruentes, como o seguinte:

(1) «Os Camarões carimbaram o passaporte para a final da Taça das Nações Africanas (CAN) com uma vitória por dois golos sem resposta frente ao Gana» (Euronews, 02/02/2017).

Em (1), associa-se a forma CAN a uma expressão cuja sigla deveria ser "TNA". Parece, portanto, empregar-se CAN sem noção do que esta representa, e atribui-se-lhe o género feminino, porque se subentende «a taça CAN». Se este subentendido é legítimo, menos aceitável, no entanto, é escrever «Taça das Nações Africanas (CAN)», porque se apresenta uma sigla não correspondente à expressão por extenso.