Pergunta:
A resposta que D'Silvas Filho deu a uma consulta de 21.12.2007 sobre as variantes úmido e húmido sugere que a variante brasileira (úmido) inovaria relativamente à portuguesa (húmido), embora não escandalizasse (muito), mesmo nos «hábitos europeus» dos portugueses, já que dispensaria um h que não se pronunciava.
É isto verdadeiro apenas em parte, já que, embora o período pseudoetimológico da ortografia nos legasse húmido, era originariamente umidus o étimo latino. Assim, o que era falso cultismo (húmido) se tornou, com o tempo, a forma popular, a qual os formuladores da ortografia oficial brasileira acabariam por preterir em favor do cultismo, este sim, etimologicamente correto, úmido.
Não quero com isto sugerir que o étimo latino correto deva ser o parâmetro por excelência para a definição da aceitabilidade de determinada grafia, até porque, para mim, o parâmetro por excelência é o uso culto efetivo, real, nos nossos dias, pelo que úmido é errado em Portugal, e certo no Brasil, e húmido é errado no Brasil e certo em Portugal.
A minha única intenção foi esclarecer que, diferentemente do que sugeriu D'Silvas Filho, não houve liberalidade brasileira, mas, pelo contrário, rigorismo.
Resposta:
Agradece-se o comentário ao consulente.
A resposta já tem alguns anos – praticamente 15 – e foi dada na perspetiva de considerar a forma úmido como resultado da supressão do h inicial, no contexto de uma ortografia inovadora. Contudo, do ponto de vista histórico, sabe-se que não é bem assim, pois a forma úmido tem grande tradição.
Com efeito, úmido remonta a forma latina mais antiga. Contudo, é ainda no período romano que surge também a forma com h-, como se observa no Dicionário Crítico Etimológico Castellano e Hispánico de Joan Coromines e J. A. Pascual: «En latín la grafía umidus es la correcta, aunque pronto se empezó a escribir con h- por una relación seudoetimológica con humus ‘tierra’» [tradução: «Em latim a grafia umidus é a correta, embora cedo se começasse a escrever com h- por causa de uma relação pseudotimológica com humus 'terra'].
Sendo assim, a língua portuguesa conserva duas variantes que vêm diretamente dos tempos romanos – e ao que parece com igual rigorismo, mesmo na conservação da forma pseudoetimológica.