Antologia - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
 
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Textos de autores lusófonos sobre a língua portuguesa, de diferentes épocas.

Muito antes, mas mesmo muito antes de eu falar, de eu ser, de eu existir sequer no pensamento de alguém, antes de esse alguém ser alguém, no tempo infinito, no tempo dos tempos de todos os limbos outros homens pensaram, outros homens falaram. Eu sei.

A Nossa Língua Portuguesa*

«Gosto desta língua que me permitiu ler no original as deliciosas prosas de Eça de Queirós ou Jorge Amado, entender e apreciar o "vem cá!" e nunca me impediu de sentir e afirmar a minha identidade de homem cabo-verdiano».

[Texto escrito especialmente para o Ciberdúvidas, na sequência dos contributos do angolano Pepetela, do guineense Carlos Lopes, do moçambicano Mia Couto e do português José Saramago]

Obriga-se o cronista a manter invariáveis os seguintes adjectivos, quando vierem usados para os seguintes substantivos:

Prelado será sempre virtuoso; cantora será sempre mimosa; jornalista será sempre consciencioso; jovem escritor será sempre esperançoso; patriota será sempre exímio; negociante será sempre honrado; caluniador será sempre infame. As maneiras de quem dá um baile serão...

Antigamente, não vinham apenas roupas, brinquedos, ferramentas e espantos nas grandes caixas de madeira que cruzavam os mares e os ventos, entre a América e as ilhas dos Açores. Vinham também os cheiros, os prodígios da riqueza imaginada, as inscrições a negro sobre a madeira aconchegada pela firmeza das cintas metálicas. E vinham palavras novas. Embrulhados com as roupas, chegavam dizeres, bilhetes com erros de ortografia, cartas movidas por estranhas palavras que em si mesmas misturavam dua...


Mpurukuma, Língua, corpo quase,
o que sou de sobrepostas vozes,
Bayete!
E tu, pássaro da alma, Mpipi adejando
sobre o losango tumultuante de cores,
Templo onde me cerco,
não me abandones, cão inflando para o rio
uma escarninha balada que nos enforca.

Esfumou-se a Torre na praia nocturna,
a preposição que olfactava o nervo
e Ele dorme ainda e expulso.

Quando a palavra surge, inteira, das águas
e os espíritos batem a respiração do batuque,
Ele ...

O adjectivo? Que horror

quando não é incisivo
quando atira para o vago
o pobre substantivo

(...)

A dimensão africana da língua portuguesa

«Do português interessam-me muitas coisas, a começar pela relação específica que existe em qualquer língua entre grafema e fonema. Em nenhuma outra língua, nem mesmo em kriol (devido à sua jovem normalização), me sinto tão à vontade.»

[texto do sociólogo guineense Carlos Lopes especialmente para o Ciberdúvidas, na sequência do contributos do angolano Pepetela, do cabo-verdiano Germano Almeida, do moçambicano Mia Couto e do português José Saramago.]

Perguntas à língua portuguesa*
Por Mia Couto

«Venho brincar aqui no Português, a língua. Não aquela que outros embandeiram. Mas a língua nossa, essa que dá gosto a gente namorar e que nos faz a nós, moçambicanos, ficarmos mais Moçambique.»

[texto escrito especialmente para o Ciberdúvidas, na sequência dos contributos do angolano Pepetela, do cabo-verdiano Germano Almeida, do guineense Carlos Lopes e do português José Saramago.]


não és mais do que as outras, mas és nossa,
e crescemos em ti. nem se imagina
que alguma vez uma outra língua possa
pôr-te incolor, ou inodora, insossa,
ser remédio brutal, mera aspirina,
ou tirar-nos de vez de alguma fossa,
ou dar-nos vida nova e repentina.
mas é o teu país que te destroça,
o teu próprio país quer-te esquecer
e a sua condição te contamina
e no seu dia a dia te assassina.
mostras por ti o que lhe vais fazer:
(...)

 O número crescente de habitantes nas cidades, a alfabetização mais ampla e o envolvimento do território pela mídia eletrônica colocam a língua portuguesa do Brasil diante de novos dilemas. Não se trata da recente querela sobre a unificação ortográfica do Brasil e de Portugal. Na realidade, o embate entre o português d'aquém e d'além-mar rola há muito tempo no interior do nosso próprio país.

 

   Na sessão inaugural da Academia Brasileira de Letras, em 1897, Machado...