Antologia - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
 
Início Outros Antologia
Textos de autores lusófonos sobre a língua portuguesa, de diferentes épocas.

E cá mesmo no extremo Ocidental
Duma Europa em farrapos, eu
Quero ser europeu. Quero ser europeu
Num canto qualquer de Portugal.

Como as ondas do mar sabem ao sal,
A ave amacia o ninho que teceu;
Mas não será do mar, e nem do céu,
Porque me quero assim tão natural.

E se a esperança ainda me consente
No sonho do futuro, ao mal presente
Se digo adeus, — é adeus até um dia…

Um presídio será, mas é meu berço!
Nem noutra língua escreveria um verso
Que me soubesse ao sal desta harmonia.


Teu nome, Andrade1, de qu'é bem qu'esperem
O de que se já sempres espantaram
Quantos te vem, quantos depois vierem:
Teu raro esprito, de que se honraram
As Musas, que de si tanto te deram 2,
E que tarde outro como a ti darão:
Os bons escritos teus, que mereceram
Ou ouro, ou cedro, pois já nessa idade
Nos mostras neles , quanto em ti quiseram
As Musas renovar a antiguidade,
Em teu amor aceso me levaram (...)
Ninguém escreveu em português
No brasileiro de sua língua:
Esse à vontade que é o da rede,
Dos alpendres, da alma mestiça,
Medindo sua prosa de sesta,
Ou prosa de quem se espreguiça.


1 Este poema é dedicado ao escritor brasileiro Gilberto Freyre, autor do livro Casa-Grande & Senzala, publicado em 1933.

Em detrimento do latim

 Extrato do livro O diálogo em louvor da nossa linguagem de João de Barros (2.ª edição, feita em 1785 pelos monges da Cartucha de Évora), no qual , no diálgo entre pai e filho, subjaz a defesa do português como língua materna, e não o até então dominante latim nas elites políticas e religiosas.

Coimbra, 23 de Julho de 1983

Ensinam português em França. E recebi-os e honrei-os como se fossem missionários da pátria a pregar civilizadoramente a um povo civilizado a boa nova de uma língua e de uma cultura que ele desconhece. Língua e cultura que deram a volta ao mundo, e continuam clamorosamente à espera da sua hora europeia.

Coimbra, 9 de Outubro de 1983

Já me fizeram cargo os meus censores
de ter muito latim portuguesado.
Mais honra me fizeram que eu mereço.
em dar sobejo preço os tais senhores,
dar sobeja importância a quatro trovas
que nuns borrões lancei por desenfado.
e à luz dei só por míngua de dinheiro.
Mas, pois tão alto vai esse arruído,
permitam-me acudir por meu cliente.
Se cunho português dei a latinas
vozes, e é crime pôr-lhe cunho alheio.
réus desse crime...

Bem sei, Ilustríssimo Senhor, que me acusarão de gastar assim o tempo nestas particularidades que pertencem à meninice, de um modo tão rasteiro e fora do discurso quer ninguém, que pretende a algum grau de literatura, gastar o seu tempo em ler o que escrevo. Mas não o julgou assim Plutarco, Quintiliano nem aqueles restauradores das letras humanas  Erasmo nem Luís Vives, em muitas das suas obras, ainda que decorado com o horroroso cargo de mestre de Filipe II. Estes referidos autores pus...

Não direi:
Que o silêncio me sufoca e me amordaça.
Calado estou, calado estarei,

Pois que a língua que falo é doutra raça.
Palavras consumidas se acumulam,
Se represam, cisterna de águas mortas,
Ácidas mágoas em limos transformadas,

Vasa de fundo em que há raízes tortas.
Não direi:
Que nem sequer o esforço de as dizer merecem,
Palavras que não digam quanto sei
Neste retiro em que me não conhecem.

Nem...
Musa língua é o que é
Cavalo marinho arborescente
Algibeira virando bolso
Língua de palmo, amiga da onça
Nuínha, sem agás
Pé de meia, língua de vaca
Sodades só do trema, nada
Não, atacador sem laço, ó cedilha
Há-de haver a tua vez.

A musa é eu?

Paris, 6 de Junho de 1790



Lembras-me, amigo Brito, quando a pluma
Para escrever, magnânimo, meneio.
Ama o meu Brito a lusitana língua,
Pura como ele, enérgica, abastada,
Estreme de bastardo francesismo
E que a joio não trave 2 de enxacoco 3;
E quando lê, rejeita a frase espúria
...